Capítulo vinte e nove

2.1K 277 18
                                    


Fico olhando a xícara cheia de café. A fumaça vai subindo ao passo que o café vai esfriando. Estou completamente sem fome. Sentei-me a mesa para esperar por Carla, mas ela simplesmente saiu mais cedo do que o normal. Dei uma olhada no seu quarto e suas coisas ainda estão lá. Faço uma prece silenciosa para que ela desista de ir embora e pense melhor, mesmo sabendo de que fui eu o culpado pelo ocorrido.

– Está tudo bem, senhor? – Lucinha aparece atrás de mim e coloca uma mão no meu ombro.

– Está... – suspiro. – Está sim, Lucinha.

Ela se senta na cadeira ao meu lado, seca suas mãos no pano de prato verde que está segurando e o coloca sobre a mesa. Então ela se vira para mim.

– Me conta. O que está acontecendo? Nunca te vi tão abatido. – Sua voz é cheia de compaixão.

Olho para seus olhos tristes me observando e resolvo me abrir com ela, afinal de contas ela é uma pessoa especial e cheia de carinho por mim.

– Carla vai embora. – Digo por fim.

– Ora, mas por quê? – Ela recosta na cadeira.

– Ah, Lucinha. É complicado. – Deixo os ombros caírem.

– Pois me conte! Eu sei que não sou estudada, mas das coisas da vida eu entendo.

– É que... – penso em como dizer – antes de vir para cá aconteceu uma coisa e eu deveria ter contado para ela, mas eu não contei porque eu achava que aquela coisa nunca iria se repetir.

– Aquela coisa... sei... você não namorava ela não né?

– Não, nada disso! – Acerto minha postura. – Nada de namoro não.

– Entendi. Aí ela descobriu e ficou chateada com você. – Ela afirma.

Concordo com a cabeça.

– E você pediu desculpas? – Sua voz é calma e afetuosa.

– Eu tentei, mas não sei se me desculpar vai resolver alguma coisa.

– Talvez resolva.

– É... talvez... – suspiro.

– Por que você não dá um tempo para ela e depois tenta conversar de novo. Vocês são muito amigos, menino Pedro, tenho certeza de que ela vai levar isso em consideração.

Acho engraçado ela me chamar de Menino Pedro. Aliás, até prefiro que ela me chame assim do que de Senhor Pedro. É mais familiar e me faz confiar um pouco mais nela. Talvez um dia eu possa contar para ela um pouco mais sobre mim. Lucinha poderia ser uma ótima amiga. O fato de ter apenas uma amiga é triste, não se tem com quem contar quando acontece uma coisa dessas.

Ela se levanta, pega o seu pano de prato, ajeita a cadeira e se prepara para voltar à cozinha.

– Obrigado, Lucinha. Você é uma segunda mãe para mim.

Levando a mão e ela a segura, dando um aperto forte e maternal, enquanto sorri gentilmente.

– Pode sempre contar comigo, senhor Pedro!

Ela se vira pra ir embora, mas eu a chamo de volta.

– Lucinha, posso te pedir mais um enorme favor?

– Claro, senhor.

– Prefiro menino Pedro do que senhor Pedro. – Sorrio para ela e ela sai de fininho para a cozinha, com um sorriso largo no rosto.

Tomo um café rápido, me arrumo e minutos depois já estou no ponto de ônibus. Recebo uma mensagem e tiro o celular do bolso para ver quem é.

"Bom dia filho, estou com saudades!" – Recebida às 08:12

"Bom dia, mãe. Prometo que logo irei visitá-la. Também estou morrendo de saudades. Preciso do seu colinho de mãe. :(" – Enviada às 08:12

Espero por sua mensagem, mas ela me liga. Atendo no primeiro toque.

– Oi, mãe.

– Oi meu filho, o que aconteceu? Está triste?

– Ah, mãe, estou sim. Acabei me desentendendo com a Carla e ela disse que vai embora hoje para outro lugar.

– Nossa, filho, mas foi grave assim? – Sua voz transmite preocupação.

– Ah, mãe, foi complicado, mas vou dar um tempo para ela antes de fazer alguma coisa. – Tento manter minha voz baixa, afinal não quero que o cara ao meu lado escute o que eu estou dizendo.

– É verdade, filho, às vezes o melhor é dar tempo ao tempo mesmo.

– Pois é, mãe. Vou esperar e ver no que vai dar.

– Ah, filho! Deixa eu te contar. A mãe do David voltou a ficar mal e está internada de novo, acredita?

– A mãe do David? – Minha voz sai mais alta do que pretendia. O rapaz do meu lado me olha de esguelha.

– Ela mesma. Eu acho que ele chegou aqui esta manhã para ver como ela estava.

– Nossa mãe, vou mandar uma mensagem para ele então.

– Faz isso. Ele deve estar morrendo de preocupação.

– Tá bom, vou mandar agora.

Vejo meu ônibus se aproximando ao longe.

– Agora preciso ir mãe. Fica com Deus!

– Beijo, filho! Bom trabalho. Tchau.

Ela desliga. O rapaz negro do meu lado faz sinal para o meu ônibus e entra, seguido por mim. Passo pela catraca ainda segurando o celular. Não posso esquecer de mandar a mensagem para o David. Ele se senta em um assento vago e o único disponível é ao seu lado, então me encaminho para sentar. Reparo em como ele é bonito e está bem vestido de roupa social azul clara e calça preta. Digito uma mensagem para David.

"David, minha mãe me falou que você está por aí." – Enviada às 08:29

"Me dê notícias da sua mãe, estou preocupado." – Enviada às 08:30

O rapaz ao meu lado pigarreia e eu o olho.

– Muito cuidado ao falar no telefone no meio da rua. – Ele aponta para o telefone na minha mão. – Rio de Janeiro é meio perigoso.

Sinto minhas bochechas ficarem vermelhas. Eu nem conheço esse cara e ele já vem me passar um sermão sobre onde e como devo usar meu telefone. Me dá uma vontade súbita de dar uma má resposta, mas me seguro.

– Ah, sim. Era meio urgente. – Forço um sorriso.

Ele dá de ombros.

– É só tomar cuidado que tudo fica bem. – Ele sorri, simpático.

– Pode deixar, eu vou tomar. – Retribuo o seu sorriso.

Guardo o celular no bolso e olho para o outro lado. Cara mais chato!    

Copiloto (Amor sem limites #2)Onde histórias criam vida. Descubra agora