Acordo assustado com alguma coisa me encostando no pescoço e logo me dou conta de que dormi. A propósito, a "coisa" em questão é Henri, me beijando no pescoço.
– Te assustei, dorminhoco? – Ele me dá mais um beijo e se senta ao meu lado.
– Acabei pegando no sono. – Digo sem graça e faço um esforço para me sentar.
– O que achou do barco? – Ele pergunta, fazendo carinho na minha orelha, enquanto me observa, me deixando sem graça.
– Gostei, gostei bastante, é maravilhoso! – Sorrio. De repente me lembro que o barco é do seu tio e me sorriso se desfaz.
– O que foi? – Henri parece ler meus pensamentos.
– Hummm.... – Penso por um minuto, não sei se quero levantar esse assunto agora, mas a ideia do nosso encontro hoje foi justamente essa. – Fico meio sem jeito de você pegar alguma coisa emprestada com seu tio, depois dá a maior confusão entre vocês e eu acabo me sentindo culpado.
Ele franze a teste e me observa por um momento com uma expressão séria. De repente sua expressão muda de séria para humorada, me deixando completamente confuso.
– Quem te disse que esse barco é do meu tio? – Ele volta a mexer na minha orelha.
Me acomodo na poltrona, dobrando uma perna e sentando em cima.
– E não é?
– Nem tudo o que eu tenho ou uso pertence ao meu tio, Pedro. A maioria das coisas que eu uso são minhas.
– Desculpa, Henri. É que eu ainda conheço muito pouco sobre você. – Deixo escapar, para ver se estimulo a me falar mais.
– Então já que não tem mais jeito, vamos ter aquela conversa... – Ele se recosta na poltrona. Pensando antes de falar.
– Não queria te pressionar, Henri, mas cada ligação ou mensagem minha que você não responde, eu já imagino que foi embora e me deixou de vez.
Ele me olha de soslaio por um minuto, como se não acreditasse no que eu acabei de dizer. Então ele fecha os olhos por um momento e começa:
– Bom, então vou continuar de onde eu parei aquele dia na sua casa. – Ele faz uma pausa. – Como já te disse, meus pais morreram em um acidente de carro, juntamente com a minha tia, esposa do meu tio, aquele que você conheceu no evento de gastronomia. Meu tio ficou um tempo em coma durante vários meses se recuperando. Eu como não tive sequer um arranhão, fui entregue para uma família temporária.
– Você não tem avós ou tios, sei lá? – Interrompo.
– Não, meu pai e meu tio, são de origem italiana, dois filhos criados por uma família tradicional. Quando meus avós morreram, eles vieram para o Brasil. Não sei muito sobre a família dos meus avós, eu era muito pequeno quando meus pais morreram e nunca me contaram direito. E meu tio se recusa a falar sobre esse assunto. Continuando – ele retoma a história de onde parou – fiquei um tempo com uma família adotiva, uma experiência terrível. Eu era o menor da casa e as outras crianças faziam de tudo para me importunar, e seus pais, obviamente, nunca me escutavam quando eu reclamava. A perseguição dos meus irmãos se estendia até a escola, e seus amigos sempre se envolviam em brigas comigo. Fui expulso da escola particular onde comecei e fui levado para uma escola pública, onde passei quase pela mesma situação várias vezes.
"Depois que meu tio se recuperou, ele me levou para sua casa e cuidou de mim. Meu tio já tinha muito dinheiro na época e meu pai era seu sócio. Eles tinham uma empresa de investimentos que compravam e vendiam outras empresas a fim de tirar lucros, ficar com patentes e registro de marcas. Depois do acidente, meu tio ficou muito tempo sem falar comigo, o que me deixava ainda mais chateado e rebelde. Ele só passou a falar comigo muito tempo depois, quando começou a me levar para pescar e nos tornamos bons amigos. Não tenho nada a reclamar sobre a educação que meu tio me deu. Eu estudei nas melhore escolas, fiz os melhores cursos e vários intercâmbios. Depois me formei em ciências aeronáuticas e me apaixonei por voar, foi quando me tornei seu piloto particular, afinal de contas eu queria ter a minha independência. Depois disso, comecei a frequentar os eventos e coquetéis da alta sociedade, onde conheci Renata, filha de um arquiteto famoso de Juiz de Fora. Nós namoramos um tempo e ficamos noivos, e daí... bom... daí você sabe... veio você. "
Fico observando o seu rosto ainda pensativo. Ele ainda precisa me contar alguns detalhes, mas tento não forçar a barra. Observo enquanto ele esfrega suas mãos, nervosamente. Seguro uma delas e aperto na minha. Ele parece relaxar um pouco e prossegue.
– Minha relação com meu tio se tornou complicada depois disso, Pedro. Meu tio mantém toda a tradição da família dele, inclusive a parte de manter o gene da família no mundo e ele viu isso ir para os ares quando Renata o confrontou dizendo que eu estava saindo com outro homem. – Ele parece levemente envergonhado ao dizer essas palavras.
– Sinto muito, Henri. Por te causar problemas. – Digo do fundo do coração.
– Não, Pedro, não sinta. Você foi a melhor coisa que me aconteceu até hoje. – Ele beija a minha mão.
Ficamos quietos por mais alguns minutos quando ele resolve voltar a falar.
– Meu tio é meu melhor amigo, Pedro. Quando todos se viraram as costas para mim, enquanto os meus colegas da escola riam de mim por ser órfão e brigavam comigo por qualquer motivo, meu tio estava lá para me dar conselhos e me ajudar. Ele sempre foi um pai para mim, mesmo eu não sendo seu filho legítimo. Ele é a única família que eu tenho, e eu não quero perdê-lo. – Ele joga a cabeça para trás por um momento e dá um longo suspiro. – Mas também não quero te perder. Então eu me sinto na obrigação de tentar fazer meu tio pensar diferente, mas ele não o faz.
"Sobre aquela semana em que eu sumi... foi obra dele. Ele me mandou em uma viagem internacional urgente. No começo achei meio estranho, mas já havia feito outras viagens urgentes antes. Então, estava em Nova York e tudo e todos ao meu redor faziam de tudo para que eu não entrasse em contato com você. Até sumir com meu celular eles sumiram. Depois disso, a suposta reunião que eu deveria ir, era na verdade, uma tentativa de me reconciliar com a Renata. Foi tudo armado. No começo, a única coisa que eu queria era te ver, mas começaram a encher a minha cabeça de que deveria voltar com a minha noiva, de que família era mais importante e que qualquer aventura que eu estivesse tendo era coisa passageira. E me disseram que eu estava jogando a minha família fora por causa de um capricho. Na época eles não sabiam de você, mas sabiam que eu estava interessado em qualquer outra coisa que não fosse me casar. No final das contas, acabei acreditando que a família deveria vir em primeiro lugar e que era minha obrigação para com meu tio ter a minha própria família, então reatei o noivado com a Renata e voltamos para o Brasil. Tudo estava indo como o planejado e meu tio ficou muito mais tranquilo, mas minha cabeça não parava de pensar em você, então vi suas mensagens. Senti muita vontade de te responder, Pedro, mas engoli tudo o que eu estava sentindo e segui firme em minha decisão de me casar... até o dia da formatura. "
Minha cabeça não dá conta de tanta informação. Então, resumindo, o sumiço foi por causa de uma tentativa de restaurar o noivado e a família tradicional almejada pelo seu tio.
– Não quero me fazer de santo. – Ele interrompe meus pensamentos. – Eu decidi que não poderia te ver mais. Ninguém me obrigou a ignorar suas mensagens, Pedro. Eu tive muita culpa nisso tudo. Mas posso te dizer que foi a pior decisão que eu já tomei.
– Agora tudo está mais claro para mim. – Me aproximo e dou um beijo rápido em sua boca. Ele fica de olhos fechados esperando mais, mas eu me afasto.
– Ah, esse beijo. – Ele suspira. – Não consegui esquecer esse beijo. E naquele dia na formatura, eu te vi lá no meio... você estava lindo... você se destacava no meio de tanta gente. Assim que te vi, a lembrança de nossos beijos, nossa noite juntos, tudo voltou à tona e naquele momento, tudo o que eu queria era te beijar mais, então te puxei para conversar. Foi quando Renata ouviu tudo o que eu disse para você e começamos a brigar, quando você saiu. No final das contas, terminamos de vez, ela contou tudo para o meu tio e desde então as coisas mudaram entre nós. Ele não fala mais comigo, tenta toda a oportunidade que tem de me mandar em viagens longe do Rio de Janeiro.
– E como foi quando você resolveu se mudar para cá? – Fico muito curioso.
– Bom, isso é uma outra história... – Ele se levanta e me puxa. – Vamos aproveitar o nosso dia?!
–Vamos. – Respondo mais animado, com o coração mais leve.
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Copiloto (Amor sem limites #2)
RomanceAssustado em como sua vida mudou desde que conheceu Henri, Pedro se muda para o Rio de Janeiro, colocando um ponto final em sua relação com o Piloto. Ele decide começar uma vida totalmente nova na Cidade Maravilhosa com seu novo emprego e sua nova a...