Capítulo 53 - O Problema Da Outra Pessoa

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O frio que Clarice estava enfrentando naquele momento tinha pouco a ver com a temperatura da cidade, e muito a ver com o lugar que ela estava. A garota, simplesmente, detestava hospitais. Nenhum trauma escondido, mas isso não diminuía a sensação estranha de um lugar que pouco acolhia, e favorecia tanto para a aflição aumentar dentro do peito.

Ela olhava com falso interesse, só para ter algo para ocupar a mente, os cabelos vermelhos conversar com a recepcionista, então os mesmos cabelos vermelhos conversar com outras pessoas vestidas de branco, até, por fim, encontrar-se com cabelos tão dourados que quase chegava a doer, na pequena porta que separava a recepção a parte interna do hospital. O dono dos cabelos loiros sorriu, as rugas se formando em volta de seu rosto, e ela viu quando os ombros de Pedro relaxaram por alguns segundos, antes de ficar tensos de novo.

Clarice arqueou a sobrancelha no exato momento que o médico desviou o olhar de Pedro para encará-la. Ela desconfiava que estavam falando dela e sentiu as mãos acumularem suor, assim como seu rosto começou a esquentar.

— Um encontro de Vales nunca pode acabar bem, não é? – Duda disse, enfiando o celular no bolso de seu macacão – Afinal, o que estamos fazendo aqui mesmo?

— Você, não sei – Clarice apertou o estofado do sofá que estava sentada – Eu tô aqui esperando notícias de João.

— E por quê?

— Por um monte de coisas, Eduarda – ela suspirou, cansada – Que tal tentarmos... empatia?

— Empatia não existe.

— Hein?

— Você já leu Guia do Mochileiro das Galáxias?

Clarice franziu o cenho encarando a amiga. Mas Eduarda já estava mexendo no celular de novo.

— Num determinado momento, Douglas diz que deixar as coisas invisíveis é quase impossível, então o jeito mais fácil que encontraram de conseguir foi transformar a outra coisa em Problema de Outra Pessoa. Assim, os outros não viam. E ficava invisível. Essa é minha opinião sobre empatia.

— Quando você se tornou nerd?

— Sempre fui. Mas as pessoas acham que é mais fácil me ver como a militante chata – deu de ombros – Problema da Outra Pessoa, lembra?

— Isso é ridículo.

— Na verdade, não muito – Duda a encarou – Antes de começar a transar com seu orientador, você também não via as dores dele, porque eram Problemas de Outra Pessoa. É uma pena que você era uma pessoa muito mais saudável do que agora.

— Isso não foi legal.

— Eu sou sua amiga – rebateu – Não tô aqui pra ser legal. Tô aqui pra falar verdade.

Clarice abriu a boca pra responder, mas antes que o som saísse, o cara de cabelos dourados parou na sua frente. Pedro estava logo atrás dele.

— Clarice, não é? – ele sorriu e ela leu o nome no crachá dele – Daniel.

— Hm – Duda resmungou – Um médico que não se apresenta pelo título. Você está ouvindo isso ou eu tô alucinando?

— Você é tão inconveniente – Clarice se afundou no sofá de vergonha.

Mas se o médico se intimidou, não deixou transparecer. Apenas girou o rosto para encarar Eduarda e abriu um sorriso que parecia quase de menino.

— Algumas pessoas têm uma certa consciência de que, apesar do dicionário dizer que pode ser sinônimo da categoria médico, ou advogado, está muito mais ligado a uma titulação acadêmica. E, não, eu não tenho essa titulação. Os neurônios para muito estudo ficaram com meu primo aqui – apontou com a cabeça.

Diversas Formas de Nós [COMPLETA]Onde histórias criam vida. Descubra agora