Difícil escolha (3)

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Naquele exato momento Haltr estava se perguntando se era mesmo o garoto mais idiota daquele lugar. Primeiro foi enganado pelo tesoureiro. E agora havia decidido brincar com a espada de um cavaleiro que parecia rico, e foi pego no flagra. No momento do erro ficou tão encantado pela espada que sequer pensou no que poderia acontecer. Não pretendia roubar a espada. Na verdade nunca sentiu o mínimo desejo de roubar qualquer coisa que fosse, mas agora não importava. Aquele escudeiro com expressão enjoada podia acusar ele. E acreditariam.

- Eu não ia roubar... - Começou a explicar sem graça, com uma voz cheia de culpa - eu só queria...

- Que se dane o que você queria! Passe a espada pra cá! - Exigiu o escudeiro em um tom autoritário e uma expressão fechada, intensificada ainda mais por suas sobrancelhas diminutas.

O modo como ele se portava e olhava para Haltr o deixava irritado. Era como se Haltr fosse um verme nojento. O pior é que de alguma forma ele com todo aquele desprezo estava com razão naquele momento. Como se fosse justificado. Haltr sabia que não devia ter feito aquilo. Portanto não podia protestar ante aquele tratamento, e aquilo o deixava mais irritado ainda.

- Vamos logo. Ladrãozinho. - Dizia o escudeiro com veneno nas palavras.

Haltr mordeu a língua para não protestar, e de cabeça baixa se aproximou do garoto enquanto estendia a espada. Resolveu que era melhor entregar daquela forma mesmo. Sem a embainhar novamente. O garoto recebeu a arma com um olhar de satisfação. Parecia lhe causar prazer que ele estivesse lhe obedecendo. Haltr tinha certeza que o garoto não passava de um nobre arrogante e nojento. Só que além disso ele estava com a razão agora.

O escudeiro examinou a espada como se analisasse se ele tinha quebrado alguma coisa e então olhou de volta pra ele com a diversão bailando no olhar.

- Vamos ter que limpar. Já que tocou ela com essas mãos imundas de criado... que tal limpar com seu sangue? - Comentou enquanto um sorrisinho maldoso se insinuava nos lábios.

Haltr arqueou as sobrancelhas começando a estranhar as palavras. Estava esperando ser entregue aos guardas. Ser preso. Imaginava até uma forca preparada só para ele, embora raramente se punisse com morte um primeiro roubo. Mas sangue? Começou a pensar em recuar e pedir ajuda. Estava desarmado agora. Contra um nobre arrogante com ideias perigosas. Porém antes que desse um passo para trás ou chamasse alguém Urag avançou contra ele brandindo a espada. O golpe foi bem rápido. Haltr mais sentiu-o do que viu. O acertou do lado esquerdo do pescoço, com toda força, fazendo a lâmina lamber sua pele.

No mesmo instante seu coração bateu tão desesperado que causava dor. Sentiu seu corpo congelar e já imaginava uma cachoeira de sangue escorrendo de seu pescoço. Suas pernas perderam a força e caiu de joelhos enquanto emitia um som engasgado segurando a ferida com a mão direita. Exceto que não encontrou a ferida. Estranhou não sentir a mão melada de sangue. Mas tinha certeza absoluta de que a espada havia lhe acertado o pescoço com toda força. Continuou a tatear buscando o ferimento, na esperança alucinada de que tivesse sido menor do que pensava. Talvez conseguisse estancar o sangramento e não morrer.

Só começou a estranhar a situação quando não encontrou ferida alguma por mais que tateasse. E viu que o escudeiro estava morrendo de rir enquanto o observava.

- O qu-... - A voz de Haltr ainda estava engasgada. Percebeu que sua garganta estava doendo.

Não entendeu o que estava acontecendo. Exceto que não estava morrendo. Seu coração ainda estava disparado mas não havia ferimento algum. Mas foi a risada quem fez ele perceber que foi algum tipo de brincadeira. Uma brincadeira cruel. Não entendia como, mas afinal pareceu que foi intencional não o ferir mortalmente. Se levantou do chão ao perceber que havia caído. Perder as forças. Se sentir sem ar. Foi tudo apenas uma ilusão provocada pela adrenalina e o medo. E agora que já não tremia de medo, tremia de raiva. Uma raiva incandescente começou a queimar no coração de Haltr. Não pela dor que sentia no pescoço. Que parecia ter levado um chute. Mas sim por ter feito ele passar momentos desesperados pensando que estava morrendo. Haltr cerrou os dentes com força e partiu para cima do escudeiro. Não pensou em mais nada naquele momento. Apenas cerrou os punhos para disparar socos. Nem sequer falou uma palavra. Nenhum xingamento um injúria proferida contra seu oponente.

Entre a escuridão e a auroraOnde histórias criam vida. Descubra agora