Respostas(21)

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Haltr estava esperando algum tipo de discussão acalorada, brigas, gritos e talvez até lágrimas quando chegassem ao armazém, mas nada disso aconteceu. Quando Sieh apareceu junto com ele e Eider a única coisa que Esron e Ital pronunciaram foi o nome da filha antes de se aproximar para dar um abraço em conjunto. Sieh também pareceu desejar aquele abraço. Ficaram juntos por um longo tempo e Ital realmente chorou. Não se escutou palavras de repreensão naquele dia, nenhuma briga ou grito. Haltr pensou que de alguma forma tudo estava bem, mas aquilo só mostrou o quão pouco conhecia sobre os mistérios das relações familiares.

Estavam decididos a partir assim que a chuva parasse, embora não falassem o motivo, era óbvio até para Haltr que queriam evitar problemas ou boatos relacionados à Sieh e ao que aconteceu. Por sorte, a chuva durou apenas mais algumas horas e então parou completamente. De acordo com Esron as estradas continuariam ainda ruins por dias, mas era melhor irem.

Foi apenas na estrada que Haltr começou a perceber que as coisas não eram tão simples assim. Os lustsi, antes sempre simpáticos agora se demonstravam calados e soturnos em durante a viagem.

Aos poucos iam deixando pra trás Turach e seguiam pela região que Haltr nunca havia conhecido ou ouvido falar. Era um grande campo verde cheio de pequenos morros, os maiores não passavam de dez metros de altura e eram fáceis de escalar. As trilhas nunca passavam pelas sombras eternas que tais morros projetavam. Nessas sombras nada crescia, mas segundo os lustsi o lado escuro dos morros era habitado por animais perigosos que ali faziam seus esconderijos, as vezes criminosos espreitavam as sombras esperando por um alvo. E além de todos os motivos práticos diziam que simplesmente dava azar pisar as sombras dos morros. Os lustsis preferiam seguir a trilha enlameada que serpenteava sem tocar nas sombras do que arriscar cortar caminho pelas sombras dos morros.

Com frequência atolavam em algum lamaçal e se concentravam em desatolar as carroças, mas tudo eram apenas desculpas para evitarem trocar olhares ou de mencionar o que ocorreu em Turach. Sieh parecia não desejar falar com ninguém, surpreendentemente com quem ela mais parecia falar era Haltr, como se fosse o único com quem ela se sentisse à vontade. As conversas eram em geral sobre assuntos triviais, como os passarinhos que voavam, as plantas a beira da estrada ou lugares que ela já havia ido, mas tudo sempre em um tom levemente desanimado. Haltr tentou evitar o assunto que parecia proibido ali entre eles, mas sua mente estava borbulhando de perguntas, toda aquela conversa sobre deuses o havia deixado confuso e levemente perturbado. Não parava de pensar em um mundo sem deuses, abandonado.

No segundo dia de viagem logo após o almoço ele resolveu perguntar, enquanto andavam mais atrás do grupo.

- Sieh... tem algo que eu queria te perguntar...

Ela não demonstrou surpresa alguma, apenas disse.

- Me perguntei quanto tempo iria demorar... já estava esperando por isso.

- Hm - Haltr soltou um muxoxo de incerteza ao ver o modo como ela já parecia preparada para aquilo.

- Eu também estive pensando nisso... Acho que te devo mesmo algumas respostas né? Você foi bem paciente até. Pois bem... Vamos falar sobre enks.

Aquilo surpreendeu Haltr. É claro que havia se perguntando muito sobre enks também, mas não era exatamente aquilo que ele queria falar quando começou a conversa, mas já que ela havia mencionado aquilo, não seria mal perguntar. Mas antes que o fizesse ela continuou:

- Vamos fazer assim: eu te conto o que eu sei sobre enks e você me conta o que aconteceu com você em Porto negro.

- Contar o que aconteceu comigo? - Haltr não esperava por aquilo, um pequeno nó se formou em sua garganta. Ele não sabia que sentia sobre aquela proposta.

Entre a escuridão e a auroraOnde histórias criam vida. Descubra agora