e l e v e n | stumble

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Não posso estar apaixonada por Sam.

Repito isso em minha cabeça inúmeras vezes. Se estou encarando demais ele, eu repito. Se estou olhando seus lábios, eu repito.

Tenho que me lembrar constantemente que estou com Jaime. Lembrar-me que o toque de Jaime é suficiente, seu olhar é suficiente. Se eu me esquecer dessas coisas, será como traí-lo. Estarei machucando-o. Eu confiei num futuro com Jaime, ao aceitar ser sua namorada. Eu confiei que ele seria suficiente para mim, não é?

Um pequeno tropeço. Esse sentimentos por Sam são isso, um pequeno tropeço em nossa amizade. Eu quero acreditar nisso, com todas as minhas forças.

Sinto Sam se remexer, tirando o moletom. Ele olha para mim, e estende ele em minha direção.

– Ponha, você vai pegar um resfriado.

Eu desvio meu olhar de Sam e fito o céu. Tão cinza quando os olhos dele. É quase inverno. Sam pousa a roupa em meu colo, e aguarda eu colocá-lo. Se eu colocar esse moletom, estarei aceitando que meus sentimentos por ele são reais. Significa que tocarei o infinito.

Estar com Jaime, é como estar no chão. Um futuro sólido, firme, um que valeria a pena buscar. São sentimentos lúcidos, emoções refreáveis. Se tem controle sobre tudo, desde o começo até o final. Com Jaime, existe estabilidade. Mas não se pode alcançar outras coisas estando no chão. Outros planetas são inalcançáveis.

Meus dedos alisam a roupa preta, enquanto meus olhos consideram possibilidades.

Pensamentos exageram a realidade. Recheiam o vazio, dão complexidade ao simples.

Fito novamente aqueles olhos, que me prendem com facilidade. Eu vejo Sam Clarke. Fios de cabelo, parecem feitos da vastidão negra do espaço. Olhos cinza feitos do céu. Meu olhar segue as veias e artérias que se estendem em seu braço. Algumas escondidas, outras saltadas. No punho, veias fazem desenhos. Em seus dedos, elas se adaptam na curvatura dos ossos, como uma luva. Eu me flagro olhando demais, e repito em minha cabeça: não posso estar apaixonada por Sam.

Se eu colocar esse moletom, estarei aceitando que meus sentimentos por ele são reais.

Se eu ficar com Jaime, posso ter algo assegurado. Ou posso rejeitar isso, e alcançar o infinito do cosmos. Posso ver o florescer de algo que conheço, ou assistir estrelas morrerem e se tornarem buracos negros. Posso tocar nuvens, ou caminhar na superfície de um sol.

Agarro a roupa preta nas mãos, me virando para devolver para Sam. Meus olhos encontram simplicidade. Sam encara o céu, quieto. Ele estica a língua para fora, um pequeno floco de neve pousa na ponta. Sam recolhe a língua, e sorri. Ao virar o rosto, ele me nota. Seu rosto fica vermelho, e seus olhos encaram outro canto, encabulados. Meus dedos agarram o moletom mais forte.

Eu deveria repetir mais uma vez. Repetir que não posso estar apaixonada por Sam.

Ao invés disso, minhas mãos começam a manusear a blusa. Passo minha cabeça por dentro, meus braços deslizam por dentro das mangas. O moletom fica folgado demais em mim. Ele me envolve, me aquece. Enterro meu queixo no peito, e sinto o cheiro da roupa. Ela cheira a chuva, assim como Sam.

Sam se levanta do banco onde estamos, e estende a mão para mim.

– Vamos para casa?

(...)

Eu tenho que contar para ele.

Nada me parece mais justo. Sam contou para mim seu maior segredo. Um segredo à plena vista de todos, mas que eu consegui enxergar. Ele confiou em mim, e eu quero retribuir essa confiança. Mas devo proteger Jaime. Eu não sei mais o que fazer em relação a Jaime. Não posso simplesmente abandoná-lo. É errado. Meus sentimentos por ele não mudaram, não diminuíram. Mas também não aumentaram.

Estou aquiOnde histórias criam vida. Descubra agora