t w e n t y o n e | run

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Dizem que sonhos, às vezes nos contam o futuro.

Flashes rápidos do que pode vir a acontecer. Fragmentos de uma vida que ainda está por vir. Sinto-me um pouco amedrontado ao pensar nisso. Dá a sensação de que não estou realmente no controle de minha vida. Que tudo o que vou viver já está escrito em algum canto do universo.

Mas meus sonhos não me dizem nada sobre o meu futuro.

Se podem dizer, talvez eles guardem isso para si mesmos. Como um segredo. Não faço questão de descobrir o que há para mim em frente. Quero ver quando acontecer, sem spoilers.

Pouco antes de meus olhos se fecharem, antes de eu mergulhar em meu sono, eu sinto o calor de Astrid ao meu lado. Seu corpo se aninha o mais profundamente que consegue em mim, seus braços me apertam. O aroma que Astrid exala me tira todas as forças.

O mundo se torna escuro, e eu sinto medo.

Meus olhos encaram a inundação negra infinita dos meus sonhos. Estrelas ao longe, diminutos pontos de luz no céu, escorregam para o fim do cosmos e lá se apagam da existência. Meus pés descalços correm num chão invisível, não fraquejando para o cansaço.

Eu corro até não sobrar ar em meus pulmões, mas não paro. Não consigo. Em minha vista, não há um ponto final. Apenas continuo correndo. Meus pés estão esfolados, e a dor é insuportável. Mas não desisto de minha maratona. Por que eu não paro? O que espero tão desesperadamente lá na frente, a ponto de sacrificar meu corpo para chegar até lá?

A escuridão me faz companhia. Seus dedos gélidos rastejam sobre minha pele, lábios murchos sussurrando em meu ouvido. Não quero ouvir o que tem a dizer. Apenas necessito chegar até o final de minha corrida. O negrume urra perante minha ignorância para com ele, e se torna violento. Punhos me socam e empurram. O que antes era um sussurro, se tornam promessas que gritam em minha mente.

Não vai dar certo. Não existirá nada para você lá.

Lá, não precisam de você. Nunca precisaram. Nunca precisarão.

Meus pés aceleram, e ganho novo fôlego. Minhas mãos cobrem meus ouvidos. Não acredito na escuridão. A escuridão sempre esteve comigo, e antes disso, nos primórdios da criação. Sempre sussurrando promessas. Ela sempre esperou que estivéssemos frágeis, quebrados. Em sua infinidade, a escuridão tem milênios de experiência e prática.

Como posso esperar vencer algo tão grande assim?

Meus olhos enxergam o infinito nada. Não consigo mais ver estrelas pontilhando o céu.

Eu quero ver. Quero enxergar.

Pés cansados vão diminuindo a velocidade. Reduzem tanto, que agora estou caminhando. Fecho os olhos, esperando a escuridão dizer o que ela quer que eu faça. Fecho os olhos, desistindo de ver.

O calor em meus braços e peito se esvai, abandonando-me. Meus olhos se forçam a se abrirem um pouco. Tenho forças apenas para dizer apenas uma coisa:

– Fique...

No fim do universo, onde tudo é esquecido, consigo apenas desejar. Desejo que a sensação em mim não me deixe. A razão do que me mantinha no caminho fique comigo. Meus pés doem, minha respiração falha, e meus olhos desatam a chorar.

Em minha marcha lenta, consigo virar-me para trás. E meus olhos veem. Poeira estelar segue-me, demarcando meu rastro.

Aqui, aonde tudo é obliterado e apagado da existência, algo de mim insiste em continuar a existir. Insiste em ser visto, por mais fugaz que seja a sua breve estadia aqui. Outras pessoas podem ver que eu existo. A pessoa que eu amo pode ver que eu existo.

Estou aquiOnde histórias criam vida. Descubra agora