Capítulo 7 - Velhos amigos

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— Miguel! – grito, sem pensar duas vezes.

— Adrian? – grita de volta.

A garota que está do lado me espia por cima do ombro, com uma mochila de panda espiando por cima dos ombros dela. Encaro-a brevemente. É alta, magra, tem cabelos ruivos, pele clara e olhos num tom dourado hipnotizante. Nossos olhares se encontram, e por um instante penso que está rolando alguma química entre nós.

Mas a alegria de rever meu melhor amigo depois de muito tempo me faz esquecer disso num piscar de olhos.

— Não acredito que você está aqui em São Paulo! Só posso estar sonhando.

— Não é sonho não, parceiro – diz Miguel, beliscando meu braço, o jeito dele de fazer alguém cair na real. – Sou eu mesmo, ao vivo e em cores.

— Há quanto tempo não nos vemos.

— Há mais de um ano.

— É – Fico sério de repente. – Por mais de um ano, fiquei sem notícias suas. E na carta você dizia que...

— ... iria escrever para você. Eu sei. Mas não pense que esqueci de você. Não foi a minha intenção. – O semblante dele também se modifica. Se eu não o conhecesse tão bem, juraria que ele está prestes a chorar. – Você não sabe, mas aconteceram muitas coisas. Coisas que mudaram a minha vida. Uma delas foi a morte do meu avô. As coisas nunca mais foram as mesmas depois que ele se foi. Ele era a alegria da casa. De todas as piadas que ele contava, não me lembro de nenhuma tosca. Também passamos por uma grave crise financeira. Meus pais ficaram desempregados durante meses. Eu não sabia o que estava acontecendo. Parecia que havia uma verdadeira conspiração contra nós. Acredite, nós passamos fome. Chegamos, inclusive, a sair correndo pelas ruas pedindo ajuda. Nessa época, ainda não morávamos em São Paulo.

"Eu gostaria de ter incluído na carta o endereço do lugar para onde estava indo. Mas não tive tempo. Como já estávamos atrasados e tínhamos que pegar o avião, não pude me despedir. Mas, apesar disso, eu tinha decidido que, assim que chegasse à minha nova casa, lhe escreveria uma carta contando sobre a minha repentina mudança de ares.

"Eu lamento que as coisas não tenham saído como eu esperava. Mudamos de cidade para melhorar nossa situação. Meu pai ganhava pouco e, ainda por cima, vivia endividado. Mamãe ganhava menos da metade do que ele ganhava e, óbvio, não era o bastante para pagar as contas e suprir nossas necessidades. Um dia nos reunimos e concordamos que o melhor para nós seria mudar de cidade, tentar a vida em outro lugar. E foi o que fizemos. Só não imaginávamos que dali em diante as coisas iriam piorar.

"Foi como um colapso. Nada do que planejamos correu como esperado. Meus pais não conseguiram emprego. Meu avô ficou doente – tuberculose – e, como não tínhamos dinheiro suficiente para o tratamento, ele não resistiu e se foi. Durante os meses em que mamãe e papai ficaram desempregados, sofremos horrores. As dívidas do meu pai cresceram assustadoramente. Ficamos literalmente na sarjeta! Comemos o pão que o diabo amassou!

"Quando mamãe ficou doente, nos desesperamos. Temíamos que acontecesse com ela o mesmo que aconteceu com o meu avô. Sem dinheiro, não tínhamos condições de cuidar dela. Diante daquela situação horrível, eu cheguei a pensar que Deus tinha realmente se esquecido de nós. Mas, daí, um milagre aconteceu. Isso é o que eu chamo de um verdadeiro milagre.

— O que aconteceu?

— Meu pai recebeu uma oferta de emprego de um recrutador que mora aqui, na capital. Acho que o nome dele é Tomás... Tomásio... Tomé... não sei. Só sei que ele gostou do currículo dele e o contratou.

Para Sempre - A EscolhaOnde histórias criam vida. Descubra agora