Capítulo 2 - Passeio pela cidade

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Londrina, Maio de 2012


Levo a noite inteira numa fatigante batalha com meu cérebro de ervilha para tentar entender por que, diabos, minha mãe decidiu fazer isso comigo. Por mais que eu tente, não consigo encontrar motivos suficientemente justificáveis para ela de repente querer me mandar para um internato. Talvez esteja me castigando por algo errado que eu provavelmente tenha feito. Mas, estranhamente, não consigo me lembrar de nada.

Não me lembro de tê-la desobedecido. Pelo contrário. Sempre fui – e ainda sou – um garoto obediente, e na escola sempre tiro notas que variam entre 7 e 8. Nunca repeti o ano e também nunca fiquei depois da aula. Jamais cheguei a lugar nenhum sequer um minuto depois do horário estabelecido e sempre fui um espectador assíduo até mesmo das aulas mais chatas que podem haver.

Passo a noite em claro, e quando finalmente amanhece, percebo que troquei um problema por outro. Estou exausto como nunca estive e alguma coisa parece estar bloqueando minha audição. Ouço alguém gritar, mas o grito parece estar a léguas de distância e eu não consigo entender uma mísera palavra. De repente, a porta do quarto vem abaixo. Quase caio da cama. É quando vejo Érica entrando com seu rosto bonito retorcido pela raiva que me lembro que tranquei a porta por dentro.

— Graças a Deus! Você está vivo! – diz ela, ofegante. – Você não estava me escutando? Eu tive que entrar que qualquer jeito! Quer me explicar por que se trancou?

Fico calado, olhando para o chão.

— Meu filho, você tem que tomar uma decisão. Você não é mais uma criança.

Meneio a cabeça em concordância. Mas o que eu posso fazer? Pode onde posso começar?

— Temos que conversar seriamente. Isso não pode continuar assim. Mas primeiro, vamos tomar café. Sua avó preparou panquecas. Eu sei que você adora.

Em outras ocasiões, eu teria descido correndo e comido panqueca até não aguentar mais. Mas agora, por motivos de força maior, me recuso a sair do quarto. Não quero sair da cama. Não quero fazer nada. Não quero viver.

— Tudo bem. Posso me sentar aí?

Balanço a cabeça outra vez.

— Bom... – Érica está procurando as palavras certas. Minha mãe é o tipo de pessoa que pensa com muita cautela antes de dizer qualquer coisa. – Sei que a situação que você está passando não é fácil. Acredite, não é fácil para mim também. Sou igual à você. Hipersensível. Acho que isso é hereditário. Bem... Acho que o que estou tentando dizer é que você tem todo o direito de ficar triste pela morte do seu pai. A vida dele foi interrompida. Ele era jovem e tinha um futuro à sua frente. Tinha planos. Quando você terminasse o ensino médio, nós três faríamos uma viagem inesquecível para o Havaí. Ele vivia dizendo isso, lembra? Dizia que ia se arriscar a pegar uma onda com Kelly Slater, embora soubesse que não conseguiria ficar de pé numa prancha nem mesmo por dois segundos...

Ela se cala. Olho para ela e percebo uma lágrima escorrendo do seu olho esquerdo.

— Desculpe... Como eu estava dizendo, seu pai era um sonhador. Mas como nunca sabemos o dia de amanhã, aconteceu algo inesperado. Seu pai ficou doente e...

— Mãe, pára!

— Não. Deixe-me falar, ok? Seu pai morreu, é verdade. Não podemos fazer nada. Não por ele. Sua vida acabou, mas a nossa continua. Temos uma vida inteira pela frente. Você tem uma vida inteira pela frente. Acha que ele ficaria feliz em te ver preso neste quarto o dia inteiro, em vez de viver a vida que te espera lá fora?

Para Sempre - A EscolhaOnde histórias criam vida. Descubra agora