César prestava atenção à televisão enquanto separava algumas moedas. Queria somente as de
prata pura. Havia reservado um bom número delas. As notícias da fera que assombrara Porto Alegre
não o impressionavam. Conhecia aquele tipo de fera. Era aliada aos sete. Um vampiro com o dom de
transformar-se em lobo. O Lobo. Mais um do qual já haviam descoberto o porquê do nome. Mais um
assassino. Uma espécie de lobisomem. De sua providencial reserva de moedas, separou dezesseis de
prata e colocou-as em um pequeno saco de papel pardo.
Olavo virou a cabeça na direção do amigo ao ouvir o tilintar metálico das moedas que caíam
ruidosamente para dentro do saco. Ele também conhecia a estranha fera vista na noite passada e já
havia se deparado com os próprios vampiros, bem no pátio do IML. Havia olhado nos olhos daquelas
criaturas. Aquelas criaturas que tinham tirado a vida de seu amigo e dado vida aos mortos. Sabia que
tinham poderes funestos. Congelavam e ressuscitavam. Por que não haveriam de se transmutar em
lobos bestiais e carniceiros? Era hora de acabar com aquilo.
César levantou-se e dirigiu-se para a porta. Foi seguido por Olavo.
- Você vai fazer o que eu tô pensando? - perguntou.
César meneou a cabeça positivamente enquanto guardava o pacote pardo no bolso da jaqueta
jeans.
- Você sabe fazer? - perguntou César.
- Não, mas sei quem sabe. Lembra do Neco?
Cesão balançou a cabeça novamente, trancando a porta.
- Que tem o Neco?
- Pois é, o Neco é ourives. Se ele não souber fazer, pelo menos vai nos levar até quem trabalhe
com isso.
Os dois subiram no jipe verde-oliva temporariamente emprestado pelo Exército e partiram
vagarosamente.
O sol estava radiante, mas mesmo assim César fez questão de usar a jaqueta. Já estava
acostumado com as reviravoltas meteorológicas desde que aquele português havia despertado. Poderia
passar frio, mas não por falta de precaução.
César imprimiu maior velocidade ao jipe, fazendo o vento aumentar.
- Você acha que funciona?
- O quê?
- Esse negócio de bala de prata.
- Sei lá, Olavo. É melhor funcionar. Tudo o que temos a nosso favor são essas lendas. Os
próprios vampiros, para mim, até dois dias atrás eram lendas. Hoje... você sabe. Onde há fumaça,
sempre há fogo. Se o Exército inteiro, com arma de tudo que é qualidade e calibre, não está
conseguindo botar um ponto final nessa palhaçada, é melhor que as moedas nos ajudem. Vamos juntar
todas as lendas que conhecemos sobre vampiros...
- Água benta, crucifixos, alhos...
- E, para lobisomens, bala de prata. Não é?
- É, acho que é.
Cinco minutos depois estacionavam em frente a uma velha residência, com altos portões de
madeira, no centro de Amarração. Era a casa do ourives Neco. Desceram. Olavo sabia que não havia
campainha e tratou de bater palmas. A primeira resposta foi o latido do pastor alemão de estimação de
Neco. Continuaram a clamar até que ouviram o homem gritando para aguardar. Neco apareceu com
cara mal-humorada, enrolado num roupão de mulher que mal encobria a gorda barriga. Era um cara
engraçado, magro mas barrigudo ao mesmo tempo. Neco segurou o cão pela coleira e pediu para os
rapazes entrarem.
- Que é que vocês dois querem assim tão cedo?
- Dá um tempo, Neco. São quase onze da manhã.
A casa de Neco era uma das únicas na cidade que possuía grades de ferros grossos em todas as
janelas e portas. Deveria ter um bom estoque de metais e pedras preciosas.
Olavo explicou o que queriam.
- Alas para que diabos vocês vão querer bala de prata, gente?
- Para matar lobisomem. - respondeu César, secamente.
Neco desatou a rir até quase perder o fôlego. Estava com o corpo encurvado, debruçado sobre a
própria barriga. Ergueu os olhos para ver se os dois o acompanhavam naquela gostosa gargalhada.
Ficou meio sem jeito quando viu que eles permaneciam em silêncio, limitados a observar. Neco parou
de rir.
-- Balas de prata?
Confirmaram com um meneio de cabeça.
- Que tipo de balas de prata?
Cesão fuçou na bolsa e pegou um pacote pardo.
- Trinta e oito e cargas para espingarda calibre doze.
Estendeu o material ao ourives, mostrando que se tratava de cápsulas deflagradas. Tirou do bolso
da jaqueta o outro pacote pardo.
- São moedas de prata pura. Faça quantas balas conseguir. Pago para você em dinheiro porque
desconfio que vou precisar de todas que tu puder extrair dessas coisas aí - explicou Cesão, com a voz
grave.
Neco apanhou o segundo pacote e o colocou sobre a mesa de trabalho, enquanto coçava o queixo.
- Eu faço.
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Os sete
HorrorDo mesmo autor de "O Senhor da Chuva", Adré Vianco. Lançado de forma independente em 2000, Os Sete, de André Vianco, conquistou uma multidão de fãs e se tornou um best-seller, vendendo mais de 100 mil exemplares. O sucesso foi tão grande que consagr...