A sopa de pedras

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Segundo minha bisa, esta história aconteceu lá para os lados do Grotão Brabo, onde nem o diabo por lá arrasta o rabo. O lugar é tão cheio de pedra e pedregulho, que nem cupim consegue terra para fazer seu capinzeiro. De verde só há uns mirrados pés de barba-de-bode, alguns sapês e retorcidos samambaias, plantas de terras ácidas.
Depois dessa introdução à história, feita por minha bisa, ela, apressadamente, ainda me advertia:
— Não me pergunte o que o Pedro Malasartes foi cheirar num lugar desses! Homem tem o demônio no corpo, e o Pedro devia ter mais de cinco.
O certo é que ele caminhava por lá, morto de fome, quando avistou um casebre encardido e sem pintura. Aproximou-se e deparou com uma mulherzinha magra, feia e desdentada, a quem pediu comida. Ela, verdadeira unha de fome, jurou, lá do topo de sua varanda, não ter nada em casa.
— É uma pena muito grande, pois, com a fome que estou, comia até uma sopa de pedra.
— Sopa de pedra?! — Admirou-se a mulher, curiosa para saber a receita, pois assim comeria todas as pedras de seu quintal.
— Sim! É uma delícia.
— E como se faz essa sopa, moço?
— Não sei explicar. Só sei fazer.
— Sendo assim, entre e vamos até a cozinha!
E lá foram os dois. Sob o olhar atento da mulher, no caminho, Pedro pegou um punhado de pedras. Já na cozinha, lavou uma por uma, todas muito bem lavadas. Depois pediu uma panela com água para cozinhá-lás. Acendeu o fogo de lenha e pôs as pedras com a água para ferver. Vigilante, a outra acompanhava o preparo.
— E vai ficar boa?
— Muito. Mas, para ficar melhor, precisava de um pouco de banha. — Não seja por isso! — respondeu a dona da casa, indo até o armário e trazendo a lata.
Pedro Malasartes acrescentou boas colheradas à sopa fervente. Quando a banha derreteu, tirou a panela do fogo e avisou:
— Pronta para ser comida!
A mulher retorceu o nariz diante do caldo.
— Coma!
— Não! Obrigada! Tenha bom apetite!
— É para já — sentou-se à mesa, serviu-se e começou a alimentar-se.
— Está boa mesmo?
— Melhor seria se a senhora tivesse um pedaço de pão para eu comer com esta sopa.
A mulher, louca para vê-lo comer as pedras, cedeu também a esse pedido e trouxe o pão.
O Pedro foi molhando o pão no caldo e comendo, comendo...
— O senhor não vai comer as pedras?
— Como no fim, porque é a parte mais gostosa — respondeu o Malasartes, atravessando um pedaço de pão na boca e continuando a comer.
Quando terminou o pão e o caldo, deu-se por satisfeito:
— Puxa! Eu estava com uma fome do cão.
— E as pedras? O senhor não vai.comer?
— Não
— Não por quê?
— Porque eu já comi bastante. Coma as pedras a senhora, que ainda não comeu nada.
A mulher ficou xingando, enquanto o Pedro partia daquele inferno de rochas.

Aventuras de Pedro MalasartesOnde histórias criam vida. Descubra agora