28. Aty Guasu, a grande assembleia (parte 2)

99 13 6
                                    


E foi nesse momento de confusão que alguém se lembrou de Thomas. Talvez tenha sido o avô, ou os pais da menina, ou talvez ele próprio tenha se levantado e se manifestado. O importante foi que a palavras chegou a ele e, quando ele tomou o microfone na mão e a arara do deus Jahari, enviada a ele por Tupã, pousou em seus ombros, as pessoas se calaram e acalmaram. Um a um, todos se viraram e observaram o garoto e sua imponente ave.

Thomas, quando todos estavam atentos, começou a falar. Suas palavras repercutiram e calaram nas mentes, corações e sentimentos. Eram palavras profundas, palavras de um sábio. Seu discurso, ainda que em palavras mansas, tornou-se imponente, majestoso, e sua presença calma e segura se impôs. Era só um garoto em sua aparência física, poderia estar se divertindo em outro lugar, com outros garotos de sua idade, mas falou com sabedoria e segurança e todos pararam para ouvi-lo. Suas palavras ecoaram como se fossem falas do mais idoso xamã ali presente e exalaram um conhecimento que remetia ao mundo espiritual e ao tempo dos primeiros deuses, quando estes habitavam com os humanos na antiga Terra, antes dela ter sido inundada pelas águas do primeiro apocalipse.

O adolescente trouxe uma breve mensagem de amor, unidade e companheirismo. Usou palavras simples, mas que, para ele, foram as mais difíceis de serem ditas, devido ao momento, pois estavam todos muito agitados, revoltados, com sentimentos de fúria e ávidos por vingança. O adolescente apelou ao sentimento comum de ânsia por uma solução para tantos males e deixou em cada um dos assistentes a semente da bondade e da esperança.

No entanto, nem mesmo Thomas, o que possuía as palavras de Tumé Arandu, o sábio, poderia ter um resultado tão surpreendente nos que o ouviam atentos, não fosse uma outra atuação ali, que não foi percebida por todos. Somente ele e outros sábios mais antigos tiveram consciência do fato. Eles perceberam a ação de Tupã produzindo a tranquilidade e fez todos atenderem as palavras de Thomas e o ouvirem atentos.

Mas Thomas ainda precisava fazer mais uma coisa. Então, despedindo as pessoas e recomendando que fossem para suas casas e garantissem a segurança de suas famílias diante das adversidades do momento, pediu que permanecesse com ele somente conselho da aldeia local.

Logo, em uma sessão secreta, se reuniu com os notáveis da etnia, e disse afinal:

— Sei que sou jovem. Muito jovem, aliás. Mas o que trago para vocês não é novo. Não digo nada novo contando-lhes que estamos vivendo um tempo em que a morte se impõe sobre a vida e a tristeza ocupa o lugar antes reservado à alegria. O ódio é agora o sentimento que substitui o amor. O sangue nas veias de todos corre com mais força que as águas em nossos rios e córregos. A água cristalina da vida se escurece turbada pelas nuvens escuras da morte. Se as coisas continuarem dessa forma, caminhamos para a destruição e desaparecimento. E todos sabemos que não pode ser assim. Temos que fazer algo rápido e definitivo.

Os homens, todos de grande sabedoria, se calaram diante das palavras do jovem rapaz, ansiosos por apreenderem o que ele tinha para lhes passar. Thomas fez uma grande pausa e, depois de observar o atordoado silêncio, continuou.

— Vou revelar a vocês um segredo.

Todos eles permaneceram atentos e assentiram com a cabeça. Com exceção de seu avô, que já tinha ideia do que ele lhes falaria, todos estavam curiosos em conhecer o segredo que movia Thomas.

— Tupã me enviou seu mensageiro. Esse mensageiro permanece comigo, me instruindo e indicando como agir.

Ele assobiou e a arara azul, que tinha ido para uma árvore próxima e brincava com a outra arara, a vermelha, veio e pousou em seu braço.

Porãsy e o estranho mundo das histórias de seu avô indígenaOnde histórias criam vida. Descubra agora