Prólogo

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Há quase uma eternidade, eu vivo uma existência disfarçada, dúbia, me ocultando entre os humanos. Sempre assumo a forma do corpo deles, vivendo uma história entre eles. Faço isso vida após vida, século após século, vendo as gerações passarem. Um segredo jamais revelado.

Desapareço de entre eles por tempos, invisível em florestas ou campos e cerrados, nas cavernas e diferentes antros. Reapareço em outros momentos, vivendo outras vidas, em comunidades diversas...

E, agora, mais uma vez, volto a estar entre eles.

O povo escolhido é sempre aquele que foi o de minha mãe. Ela, a filha dos primeiros humanos, a mais bela das jovens, a desejada por homens, deuses e demônios. Sempre retorno entre eles: os que a amaram e, por conta do pai dos seus filhos, a odiaram.

Minha mãe, nos tempos do início, foi raptada e possuída por um ser demoníaco e, por causa dessa união funesta, amaldiçoada pelos deuses, rejeitada pelos humanos.

Assim nós, os seus filhos, nos tornamos o que somos. Meus outros seis irmãos e eu somos todos filhos da mesma mãe inteiramente perfeita e do mesmo pai abominável.

Ao assumirmos uma vida perto de humanos, às vezes, convivemos uma geração; em outras, ficamos separados, mas somos unidos de corpo e alma. Os sete são diferentes uns dos outros, no corpo e na essência, mas irmãos, e, por isso mesmo, cúmplices, geração após geração.

Talvez não devêssemos ter voltado. Há sempre um risco, mas quem sabe não tenhamos alternativa? Quem sabe seja essa a nossa sina? Um destino fadado a viver uma vida próximos e procurando por aquela que pode vir a ser a destruidora de todos nós: a menina doce, linda, conhecida como a Mãe da Beleza, e a única que conseguirá nos destruir... Ou nos salvar...  

Pelo menos, essa é a versão contada.

A profecia fala que os deuses a colocarão no mundo para controlar um mal que, eles sabem de antemão, voltará mais uma vez a se manifestar. 

Na verdade, nós somos este mal...

Nossos pais são Tau e Kerana. E eu sou Kurupiry, conhecido como um monstro, como um amaldiçoado pelos deuses. Eu sou um ser imortal e estou de volta entre eles. Estou, de novo, vivendo entre os seres humanos. 



Porãsy e o estranho mundo das histórias de seu avô indígenaOnde histórias criam vida. Descubra agora