33. A procura por Sérgio

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Os dias haviam sido compridos e difíceis para a família de Sérgio, desde o desaparecimento do garoto nas águas do rio que sumia no Buraco do Peixe. A família não medira esforços, na tentativa de encontrá-lo. Grupos foram organizados e, durante dias e noites, a busca foi intensa. O corpo de bombeiros viera e ajudara por vários dias. A notícia se espalhou na internet, rádio e televisão. Equipes da mídia fizeram plantão no local do desaparecimento. A polícia foi incansável e, no entanto, nada.

No dia do desparecimento, quando o pai e os amigos voltaram, logo após a ligação não atendida, não encontraram mais Sérgio. Rastros saíam das águas e seguiam, até se darem com os rastros do adolescente. Depois, as mesmas marcas mostravam que entraram nas águas, e nas águas foi o primeiro local em que procuraram.

O pai, que era exímio nadador, e os dois amigos, que também nadavam muito bem, mergulharam inúmeras vezes, em vão. Atravessaram o Buraco do Peixe até as cavernas, gritaram, procuraram, avançaram nos corredores e nada.

Então voltaram à praia, ligaram para a cidade, para a polícia e, logo, dezenas de pessoas vieram para ajudar na busca. Em vão. Somente os rastros que terminavam nas águas e nada mais. Vasculharam a mata próxima, passaram aquela noite acordados, incansáveis, procurando por toda parte, e nada.

No outro dia, tinha ainda mais gente, mais policiais e, no dia seguinte, já estava lá o corpo de bombeiros. Por fim, depois de uma semana, a equipe de bombeiros decidiu que tinha outros socorros a realizar e voltou para a cidade. Também a polícia desistiu, deixando só uns três soldados acompanhando o grupo contratado pelo pai. No fim, até estes afrouxaram as buscas.

Foi só depois de mais de quase uma semana de buscas frustradas que um colega de escola apareceu na casa do garoto. Queria falar com seus pais. Assim que estava a sós com eles, Kauã lhes disse:

— Eu sei onde está o seu filho.

— Onde? — disse o pai, entre apavorado e esperançoso.

— O local se chama Jaguari. É uma caverna com uma única entrada, que fica em uma colina.

— Como você sabe disso? Você o viu? Se o viu, por que não o ajudou? Por que não resgatou o garoto? Vamos! Não brinque com a nossa dor! — Não que o pai não acreditasse e não fosse verificar, mas já houvera tantas informações falsas, tanta perda de tempo ao tentar checá-las, tanto sofrimento, no fim.

— Eu estava pescando em um riozinho que tem lá perto, ouvi um grito de socorro e fui verificar. O som vinha da entrada de uma caverna.

— Mas você o viu?

— Sim. Entrei sorrateiramente e o vi amarrado. Parece que está sendo feito refém ou algo assim. Não sei por quem, mas confirmo o que vi. Por isso vim direto aqui, contar para o senhor.

O pai tinha dificuldade em acreditar naquela história, mas iria checar, ainda assim, com um grupo de seus empregados e a polícia local. Não queria se culpar, futuramente, por não ter tentado.

— Você nos leva até lá?

— Levo, sim. É só vocês falarem quando.

— Agora — disse o pai de Sérgio. — É só o tempo de mobilizar algumas pessoas e uma equipe de policiais.

— Tá bom. Aguardo lá fora — disse Kauã enquanto o homem fazia diversas ligações.

Assim, um grupo foi formado e partiu para a colina Jaguaru. O resgate foi rápido porque logo que chegaram no lugar encontraram Sérgio vagando em meio ao mato baixo. Ele estava em estado de choque e dizia palavras desconexas. Algumas dessas palavras ele repetiu mais vezes:

— Monstros. As cavernas são habitadas por monstros.

Após socorrerem o garoto e o levarem para o hospital, uma equipe de policiais, juntamente com o pai e um grupo de amigos e empregados, voltou à caverna. Resolveram tirar a limpo o que acontecera com o rapaz. Se equiparam com armas e potentes lanternas, e seguiram cheios de coragem. Chegaram ao local sem nenhum imprevisto. O dia estava tranquilo; o sol brilhava. Encararam a escura entrada da gruta e estremeceram.

— É ali — disse o pai de Sérgio. — Temos que entrar.

— Então vamos fazer isso rápido — disse um dos policiais.

Com as armas preparadas e firmes nas mãos, os soldados foram na frente. Ainda que não acreditassem em monstros, tinham consciência de que poderia ter animais selvagens habitando o lugar. As lendas deveriam ter origem em fatos.

Ao adentrarem os salões mais internos, era como se a escuridão fosse mais densa e úmida.

— Luzes. Precisamos de luzes aqui — disse o líder dos soldados. — Tá muito escuro.

Dois soldados, como se a ordem fosse especialmente direcionada a eles, guardaram suas armas e pegaram as lanternas. Ao focarem na escuridão, o susto foi enorme e o grito foi quase unânime. Alguns deles escorregaram no chão úmido, na tentativa de voltar. Os dois que estavam na frente recuaram, empurrando os outros para trás. Todos tremeram.

À frente deles, iluminados pela potente luz das lanternas, estava uma cobra gigantesca e um monstruoso lagarto com sete cabeças. Ainda que fossem homens adultos e preparados para enfrentar situações difíceis, eles não esperavam por aquilo. Desesperados, muitos correram em direção à saída, outros atiraram a esmo. O urro dos monstros os acompanharia por muito tempo nos sonhos.

Quando constataram a veracidade das histórias, saíram do local apavorados. Não estavam preparados para lidar com o que se depararam. Não tinham armas apropriadas e sequer sabiam como agir. Saíram e voltaram à cidade, mas não sem a promessa de que voltariam para dar um fim aos monstros.

— Então as lendas eram verdadeiras — disseram, por fim, o pai de Sérgio e os amigos, quando se encontravam a salvo. Não fossem eles, pessoas sérias e idôneas na cidade, os outros jamais acreditariam, pois a história era por demais fantástica.

Nas reuniões que se seguiram, com um grupo seleto de pessoas — fazendeiros, latifundiários, apenas quem movimentava a economia e o poder do município —, uma estratégia foi elaborada. Voltariam a Jaguaru, só que, dessa vez, mais bem preparados. A intenção era, depois de confirmar que os monstros estivessem dentro, explodir a caverna, assim, matariam os estranhos e terríveis monstros e destruiriam a entrada, lacrando-a, de forma que nunca mais pudesse sair algo dali.

***


A intensão era que o pai o levasse dali. Só isso. Mas as coisas não saíram como planejara. Não contava que eles verificariam a caverna. A partir de então, era uma questão de tempo para que retornassem. Então eles tinham pressa.

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Porãsy e o estranho mundo das histórias de seu avô indígenaOnde histórias criam vida. Descubra agora