Prólogo

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- Querida, onde está o bebê? - Disse o Gnomo, rechonchudo de longa barba branca apresentando extremos sinais de cansaço ao entrar pela porta que rangeu alto ao se abrir.

- Oras que pergunta é essa, meu bem? Esta no berço, onde ele dormi todas as noites. O que aconteceu, meu amor? Você está bem? Está tão pálido!

O Gnomo caminhou alguns passos espalhando o barro de suas botas sobre o tapete felpudo ao meio da sala, apoiando-se sobre a pequena mesa rústica de madeira, ainda muito ofegante procurou o ar que parecia evitar seus pulmões.

- Elgo, seu velho mal educado... Estou falando com você, não de as costas para mim! - Gritou a Sra. Gnomo, arremessando uma colher de pau no pobre coitado, e por pouco não o acertou em cheio.

Mas o Gnomo pouco se importou ao passar do lado do quadro de um antigo retrato pendurado na parede, onde sua imagem algumas décadas mais nova, agora tinha uma colher de pau cravada como novo adereço. Com uma das mãos puxou a velha espada pendurada sobre a lareira, que queimava esquentando o pequeno casebre aconchegante construído em um enorme cogumelo, daqueles bem vermelhos repletos de bolinhas brancas.

- Elgo, você está me assustando! - Disse a Sra. Gnomo, e Elgo sabia que para assustá-la não era fácil.

- Migsa, prepare um bornal com mantimentos para alguns dias... Depressa! Vamos mulher, o que está esperando? - Disse o Gnomo, embainhado a espada no surrado cinto de couro que conhecia as histórias de suas velhas calças verdes, há tempo demais.

- Não me digas o que fazer dessa forma! - Gritou Migsa. - Você sabe muito bem que não sou a sua empregada! Se você pretende ir pescar a essa hora da noite deveria ter  me avisado antes!

- Uma vez na vida, faça o que eu te pedi sem questionar! - Implorou Elgo, e foi aí que Migsa percebera o quanto seu amado esposo estava aterrorizado.

- Desembucha de uma vez Elgo, me diz o que aconteceu? - Perguntou, tratando de encher com todos os alimentos que encontrara no velho armário da cozinha o espaçoso bornal de pano já amarelado pelo tempo.

- A maldita voltou - Disse o Gnomo.

- Quando? Onde?

- Está noite, toda a vila está um caos - respondeu Elgo, apanhando do berço o pequenino e delicado bebezinho de bochechas avermelhadas que ainda dormia tranquilamente. Rapidamente Migsa o enrolou em um manto verde que ela mesma havia tricotado. O Pequeno Gnominho resmungou os resmungos típicos de bebê, mas quentinho e sentindo o cheiro de sua mãe que o abraçou firme contra o peito adormeceu novamente.

- Precisamos sair daqui agora - sussurrou Elgo, quando ouviu um barulho estranho do lado de fora. Migsa consentiu.

- Vamos - disse, tomando a frente e ao ouvir barulhos no telhado desembainhou a espada.

- Tem alguma coisa no telhado! - Gritou Migsa, aterrorizada.

- Psiu! Ela pode nos ouvir - disse Elgo, puxando Migsa para trás de seu corpo, onde acreditou que poderia protegê-la com sua espada.

- Elgo, eu estou com muito medo - Sussurrou Migsa, abraçando ainda mais o bebezinho.

- Eu também meu amor! - Disse Elgo, com olhos fixamente atentos enquanto algo arranhava a maçaneta da porta da frente do casebre.

- Vá agora! Pela porta dos fundos, rápido! - Gritou Elgo, quando a porta fora arrombada.

- Eu não vou sem você!

- Migsa vai agora! Leve o bebê para um lugar seguro.

A Sra. Gnomo segurou firme nas vestes de seu amado, com os olhos inundados beijou-lhe a face e correu sem olhar para trás, no momento que algo entrou pela porta revirando os móveis avançando contra Elgo.

Enquanto corria Migsa escutou claramente os gritos terríveis de Elgo ao enfrentar o monstro implacável, e logo o silêncio dentro da casa prevaleceu.
A enorme criatura negra de oito pernas saltou para fora da casa despedaçando os vidros da janela.  Seus vários olhos de um vermelho intenso pareciam acesos na escuridão, e como lanternas iluminavam os rastros de sua presa que não era suficientemente rápida para escapar.
Nas margens de um estreito riacho que cortava a propriedade daquele casal que por décadas foram tão felizes naquele lugar, Migsa escondeu-se abaixada atrás de uma framboeseira carregada, e ali não ousou nem respirar.

No momento que a criatura passou pelos dois, Migsa suspirou aliviada acreditando em sua salvação, mas um chorinho de fome que em qualquer outra circunstancia seria facilmente compreendido e rapidamente atendido com carinho, revelou suas posições.

E antes que Migsa tivesse tempo de alguma reação o par de presas venenosas da criatura perfurou seu corpo, e injetando uma boa quantidade de uma poderosa neurotoxina, à criatura agora apenas esperava com calma o veneno agir no corpo da Sra. Gnomo, no momento que uma enorme folha descia seguindo o fluxo da correnteza bem próxima as margens do riacho. E nessa hora, Migsa não pensou em mais nada, a não ser em salvar seu bebê, e usando aquela força que invade por completo o corpo das mamães ao verem seus filhos em perigo, caminhou cambaleante até a beira d'água e com seu último movimento repousou seu bem mais precioso sobre aquela folha, e com todo seu amor desejou sua salvação. Antes que a terrível criatura agarrasse seu corpo, e o envolvesse por completo em um longo e belo fio de seda.

Você deve estar se perguntando o que aconteceu com o pequeno bebezinho, não é?
Bom, o que te posso dizer é que ele foi salvo por um coelho bondoso, e se quiser saber o resto desta história nas próximas páginas eu irei te contar.

O Jardim de Bumberdin Uma história de Gaillardia Onde histórias criam vida. Descubra agora