Capítulo 17 - Ganhou na loteria

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— Pois é — Bob disse

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— Pois é — Bob disse. — A parte legal foi no outro dia. Eu fui agradecer e perguntei o que poderia fazer para retribuir o favor. Ele só disse para eu nunca me tornar igual àquelas pessoas. Nunca me esqueci disso. Mesmo quando a vida ficou boa para mim, sempre me vigiei para nunca me tornar uma daquelas pessoas. Então acho que posso dizer que Ick deixou uma marca em mim.

Eu lembro da festa em que isso aconteceu. Eu lembro de ver o Bob preso no armário e me neguei a ajudar. Lembro que fiquei brava com Ick por ele ter feito aquilo. Sou uma pessoa horrível.

Eu não acho que Bob fez por mal. Eu tenho que assumir a minha parcela de inocência em acreditar que sairia com o homem com o qual pratiquei bullyng por anos e o assunto não viria à tona.

— Bob, nem sei o que dizer — segurei a mão dele que repousava na mesa. — Eu honestamente quero me desculpar pelo o que você viveu no ensino médio. Eu sei que sou um dos culpados, mas juro por tudo que é mais sagrado que amadureci muito desde então. O Ick me ajudou muito nesse processo, além disso. — Apontei para o meu filho sentado na cadeirinha de bebê. — O pequeno Ick também me obrigou a mudar.

— Não, está tudo bem... — ele respondeu puxando a sua mão para longe da minha. — Na época parece o fim do mundo, mas agora é como se nunca tivesse acontecido. Para ser brutalmente sincero, eu até agradeço por isso.

— Como assim?

— Ah, é o tipo de coisa que eu penso às vezes. Se eu fosse aceito no ciclo social das pessoas daquela escola, me tornaria alguém completamente diferente. Provavelmente andaria mais com eles e acabaria mais parecido com eles. Pensando coisas parecidas, agindo parecido. Se eu estivesse nas festas e nas partidas de futebol, provavelmente sacrificaria todo os finais de semana em que fiquei em casa estudando programação e lendo meus gibis de super-heróis. Pois esse era o tipo de coisa que eu só fazia para espantar a solidão, mas acabaram contribuindo para compor a pessoa que sou hoje. E eu meio que tenho orgulho de quem sou hoje, sabe?

Ele segurava um sorriso doce e não desviei o meu olhar do seu rosto enquanto falava. O homem que conversava comigo era confiante, firme, forte e eu nunca imaginaria que seria o tipo de pessoa que aceitaria ser incomodado ou preso a um armário de troféus.

— Sem contar que você foi para a cama com a Kate Upton — completei.

Ele riu e ficou vermelho:

— Ah, é. Acho que tem essa também...

— Acho que funciona por compensação — falei.

— Como assim? — Bob pareceu legitimamente confuso.

— É a minha teoria. Acho que toda esta história sobre quem somos na escola e quem somos no mundo real funciona por compensação. Você, por exemplo, não gostava da pessoa que era no ensino médio e agora é um milionário bonitão. O Ick também não esteve muito confortável em nenhum momento. Ele escondia as poesias que escrevia, sabia? Tinha medo dos "amigos" tirarem sarro dele! Agora ele está feliz na capital, escrevendo e logo será reconhecido por isso como o novo Paulo Coelho, sei lá! Já eu amava a minha versão adolescente, a escola era o meu reinado e tudo me fazia feliz. Hoje, vivo um perrengue atrás do outro e estou até começando a perder um pouco a noção de quem eu sou. Onde você acha que aqueles cara fortões estão hoje? Os mais ricos trabalham na empresa do pai e nunca virarão adultos de verdade, os mais pobres vão sofrer em subempregos. Acho que funciona por compensação. Se você é feliz na escola recebe infelicidade na vida adulta. Se é infeliz na escola... pega a Kate Upton!

— Todo o lance da minha ex te impressionou um pouco, né?

— EU TINHA UM POSTER DELA NA PAREDE DO MEU QUARTO! Preciso de tempo para digerir a informação!

Bob gargalhou e deixou a pizza cair no chão.

— Bom, eu não sei se acredito tanto nessa sua ideia de compensação. Isso estaria intrinsecamente ligado a noção de que o mundo é justo e não tenho tanta certeza se isso é verdade.

— É só uma teoria — Ick ensaiou um choro e eu o peguei nos braços. — Tenho certeza de que você conhece o mundo melhor do que eu!

Ícaro continuou chorando. Quando olhei para ele, notei que estendia os dois bracinhos e jogava o corpo na direção de Bob.

— Acho que ele quer vir comigo... — Bob disse.

— Estranho! — Fiquei impressionada. Ícaro sempre foi uma criança mais tímida do que as outras, nunca nem sorriu para estranhos, quanto mais pular no colo. A própria Vanessa precisou de horas para convencê-lo disso. — Ick não costuma gostar de estranhos...

— Deixa eu tentar — Bob se levantou e pegou meu filho nos braços. Ficou brincando com ele e Ick sorriu enquanto passava as mãozinhas no rosto do meu amigo. Ele apertava as bochechas, o nariz, passada os dedos na sombrancelha...

— Acho que você ganhou na loteria — falei.

— Ele é muito esperto! — respondeu, brincando distraidamente. — Vamos indo?

— Sim. Quanto te devo?

— Relaxa, minha cortesia!

Bob sentou ainda brincando com Ícaro e pediu a conta. Enquanto o garçom não voltava, uma coisa passou pela minha mente:

— Mas, não tem absolutamente nada que você faria diferente?

— Sempre tem algo...

— O que faria?

— Acho que fui comportado demais — ele disse sem pensar. — Se eu pudesse voltar no tempo, faria algumas maluquices.

— Quer fazer alguma agora? Uma bem imatura?

— Tipo o que?

— Tem um carro de uma certa pessoa que eu estou louca para cobrir de ovos podres!

***

Nota do autor

Thamy era uma leitora como vocês. Ela aparecia em todos os eventos, recolhia autógrafos, tirava fotos e estava sempre sorridente enquanto falava sobre livros. Eu nunca conversei com a Thamy fora dos eventos, mas a relação entre autor e leitor não se mede em palavras ditas e sim em palavras lidas. 

Thmy, dedico este capítulo a você.

Thmy, dedico este capítulo a você

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JÉSSICA - MÃE AOS DEZESSETE (HISTÓRIA COMPLETA)Onde histórias criam vida. Descubra agora