Christian

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Toca o meu despertador, desligo o alarme e olho para ele. 05:30 da madrugada, hora de levantar para ir para o hospital. Tomo um banho, visto-me e vou ao quarto do meu anjo, ele ainda dorme, dou um beijo na sua cabeça e sigo para a cozinha, faço um café e preparo o biberão do Peter. Eu sei que o meu pai o faria, mas já que vou estar todo o dia fora prefiro fazê-lo. Mas vou apresentar-me.

Chamo-me Christian e tenho 28 anos, moro em Dublin desde sempre com o meu pai e o meu filho, apesar de não ser casado nem ter namorada. O Peter foi um anjo que caiu na minha vida, mas isso é lá mais para a frente. O meus pais tiveram-me ainda bem jovens ele tinha 17 anos e ela 15, mas assim que o meu pai descobriu que a minha mãe estava grávida foi falar com os meus avós maternos que expulsaram a minha mãe de casa. Ele já trabalhava numa oficina e alugou uma casinha para eles perto da oficina. Eu nasci e apesar do meu pai não ganhar muito não faltava nada a mim e á minha mãe. Quando eu  tinha 5 anos após o meu pai sair para mais um dia de trabalho a minha mãe arrumou as suas coisas, escreveu um bilhete ao meu pai a dizer que estava farta daquela vida mesquinha de mãe e dona de casa e de andar sempre a contar tostões e entregou-me mandando-me ir ter com o meu pai á oficina. Foi a ultima que a vimos. O meu pai criou-me sozinho, quando não tinha escola ficava com ele na oficina e depois de alguns anos ficava em casa, fazia as coisas em casa e estudava, o meu pai sempre me incentivou a estudar para ser alguém. Depois da minha mãe ele não teve mais ninguém, fomos sempre só nós dois, sempre vi o esforço do meu pai para me dar uma vida boa, nunca me deixou faltar nada, principalmente amor. Estudei de dia e de noite e quando terminei a secundária consegui uma bolsa para a Universidade, para seguir o meu sonho de estudar Medicina. Nas minhas horas livres, contra sua vontade, ajudava o meu pai na oficina, ele não queria mas o patrão dele aceitou-me lá.  Apenas na Universidade me permiti namorar e posso dizer que ela se tornou uma decepção, eu realmente gostava dela mas, tal como a minha mãe, trocou-me por um snobe com mais dinheiro do que o filho de um mecânico cujo part-time era ajudar o pai e sujar-se com graxa em vez de sair para me embebedar e curtir, o que me levou a dedicar ainda mais aos estudos. Durante o estágio interessei-me pela Pediatria e assim que terminei o Curso geral segui para a especialização em Pediatria. Terminei o curso entre os 5 primeiros e consegui logo trabalho no The Children's Hospital, um hospital pediátrico Universitário. Ao fim de 2 anos passei a chefe do serviço de pneumologia infantil, para além de dar uma cadeira universitária. Escusado será dizer que o meu pai está super orgulhoso de mim... O patrão do meu pai adoeceu e ia vender o negócio, entrei em acordo com ele e comprei a oficina, oferecendo-a ao meu pai que passou apenas a geri-la, a contra-gosto, mas ele já merecia um descanso.

Á 2 anos atrás uma sem abrigo entrou em trabalho de parto e acabou por não resistir. O bebé nasceu prematuro, com uma imaturidade pulmonar brutal, ninguém acreditava que ele fosse resistir, eu acompanhei-o pessoalmente e depois de muitas noites sem dormir de volta dele, ele começou a recuperar e a esta altura do campeonato já eu estava muito apegado ao meu Peter Pan, o rapaz dos sonhos. Depois de muito pensar e falar com o meu pai, iniciei os trâmites para o adoptar e, como continuávamos na casa alugada e esta era pequena, comprei uma casa, grandinha eu admito, tem 4 suites, cozinha, sala de jantar, sala de estar, casa de banho, garagem, mas mais importante, tem um jardim para o Peter brincar. Quando levei o meu pai a conhecer o Peter ele apaixonou-se logo por ele. Ele teve de ficar internado até aos 9 meses pois para além de ter nascido prematuro e dos problemas pulmonares, sofria de abstinência pois a mãe era toxicodependente, eu recebi os papéis da adopção antes dele sair do hospital. Desde que ele teve alta tornou-se o Bijú do avô, o meu pai não consegue negar-lhe nada, e sendo realista eu também não. A unica sequela com que ele ficou foi asma mas a bombinha anda sempre com ele para o ajudar. Posso dizer que hoje temos uma vida bem folgada.

- Bom dia filho.- diz o meu pai entrando na cozinha e quebrando os meus pensamentos e dando-me um beijo na testa como de costume.

- Já o cheiro chegou lá acima?- digo-lhe a rir

- Sabes que o cheiro do teu café é o meu melhor despertador. Sempre foi.

- Pai, a dedeira do Peter esta pronta. Eu tenho que ir andando pois quero chegar cedo hoje, tenho papéis para tratar e tenho que preparar a aula. O Peter ainda dorme e eu vou tentar chegar cedo hoje para irmos ver o jogo ao Pub. Tenho também de começar a preparar a festa de aniversário dele. 

- Sim Chris, não te preocupes. Mas vai com calma, está a chover. 

Despeço-me dele e sigo para o carro. Ponho a minha pen no sistema e vou com calma pois realmente está a chover. De repente um carro ultrapassa-me rápido demais e assusto-me mas continuo nas calmas, ele há cada doido na estrada. Também, já estou muito perto do hospital. Nem 200 metros á frente percebo o carro que me ultrapassou parar, faz marcha atrás, tipo contorna um obstáculo e arranca mais rápido ainda como se fugisse, acelero um pouco assustado e quando estou próximo vejo que está um corpo no chão caido. Paro o carro um bocado antes, ligo os piscas e corro para o corpo com o telefone na mão. Quando chego vejo que é uma mulher mas pior, tem uma criança ao colo. Vejo se tem pulso e graças a Deus tem, vejo a criança e percebo que está roxa, deve estar em paragem respiratória e pelo que vejo, pós convulsão e está a ferver. Pego na criança, ligo 112 para pedir ambulância enquanto corro para o carro para pegar a minha mala médica. Começo a reanimar a menina junto ao corpo da mãe, a sorte é que a mãe a protegeu da pancada, cubro a mãe com o blusão que estava na menina e continuo de volta da menina. Ligo para o Hospital e digo o que aconteceu e peço para prepararem tudo para receber as duas e que mandem alguém ali para apanhar o meu carro e ajudar-me. Logo vejo o segurança do Hospital chegar a correr afinal, eu estou quase á porta, vejo também 2 enfermeiros e logo oiço as sirenes, chega primeiro a polícia e depois a ambulância. De repente oiço um choro, consegui reanimar a menina, corro com ela para o hospital enquanto o pessoal da ambulância imobiliza a mulher para a levar e depois de dar instruções para a levar para o hospital onde trabalho. Assim que lá chego já me esperam e levam a menina para a sala de reanimação enquanto eu vou trocar a minha roupa ensopada.

Pégadas da vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora