Capítulo 2

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— Venha, Anahi, pare de ficar aí caçando moscas e comece a gritar. —Dulce ria fazendo a amiga se levantar da cadeira, levando-a para apreciar o homem quase nu que usava um penteado original e girava um bastão com fogo em ambas as extremidades, parecendo ignorar o perigo que aquilo representava. Movimentava-se pelo palco aos pulinhos, ao som do calipso, tocado tão alto que poderia ensurdecer qualquer um. Tinha um corpo musculoso e bem-proporcionado.
Anahi apenas olhava enquanto Dulce aplaudia como se nunca tivesse visto um dançarino girando um bastão. Na realidade, umas cem mulheres batiam palmas, erguendo as mãos para oferecer gorjetas a todos os rapazes que caminhavam na passarela.
Naturalmente, eles não faziam muita cerimônia para ir se despindo, peça por peça de roupa que ainda faltava ser removida. A audiência delirava. A música e os gritos das mulheres alcançaram um crescendo que fez Anahi recear que os espelhos que ornamentavam o palco se quebrassem a qualquer momento.
De repente, ela quase perdeu o equilíbrio e agarrou-se no encosto de uma cadeira. Ficou sem jeito. Cada centímetro de sua pele formigava, os seios pesavam e ela sentiu a tontura do desejo.
Segurou a respiração e deixou que a atmosfera do ambiente a consumisse. O aroma do óleo que cobria o corpo dos rapazes, o gosto de suor, a quantidade de corpos em volta dela, as luzes que piscavam o tempo todo, a música que ensurdecia, tudo a circundava tal qual onda de sexualidade cheia de átomos com carga positiva. Não a impressionavam tanto os dançarinos nus mas o fato de que os homens eram orgulhosos de seu físico e as mulheres não tinham receio de demonstrar sua apreciação Anahi umedeceu os lábios. Tudo aquilo lhe parecia mais do que bastante para uma mulher decente agir de maneira diversa da habitual.
Ela procurou pela bebida que mal havia tocado. Envolvendo o copo gelado com a mão, passou-a em seguida no rosto que pegava fogo. Olhou para Dulce a fim de ver se a amiga notara sua atitude estranha. Mas ela ria e sacudia no ar notas de um dólar.
Achando que o álcool talvez adormecesse seus sentidos, Anahi tomou mais alguns goles da bebida. Porém em vez de ter os sentidos adormecidos, uma onda de sensualidade invadiu-a. Um rapaz aproximou-se, dançando, e tirou o chapéu para recolher as apostas das mulheres em pé no perímetro do palco. Anahi sentiu de novo um formigamento nas coxas e uma frustração no peito. Tentou projetar o rosto de Manuel no corpo do dançarino, mas não conseguiu conciliar as duas imagens, uma de estabilidade, a outra de sensualidade.
— Um verdadeiro atleta do sexo, não? — Dulce perguntou, tirando a amiga de seu sonho.
— Como? — Anahi examinou os consideráveis atributos do homem. - Oh, sim, acho que sim. — Ela esvaziou o copo dum só trago.
— Ei, sente-se bem, Anahi? Eu estava apenas amolando você por causa de Manuel. Vocês dois brigaram, ou houve qualquer coisa semelhante?
— Não, nada.
Dulce foi ao toalete e Anahi seguiu-a, contente por abandonar um pouco aquele ambiente cheio de sugestões eróticas.
Antes mesmo que a porta se fechasse, Dulce tirou do bolso um cigarro de mentol. Anahi franziu a testa, e apanhou na bolsa o batom, dizendo:
— Eu não sabia que você fumava esse tipo de cigarro.
Dulce exalou uma fumaça perfumada e inclinou o corpo esguio contra a grade do bar.
— Apenas em ocasiões especiais. Então, está se divertindo, Anahi?
— Estou, claro.
— Mentirosa. Viajou por outro mundo a noite toda.
Anahi achava que a bebida subira-lhe à cabeça. Afinal, por estar de estômago vazio sentia-se voando no espaço, e também um tanto filosófica.
— Penso em todos os homens que tive em minha vida — ela comentou.
— Em todos os homens? Interessante, não me lembro de você ter tido tantos homens assim no tempo de escola.
Anahi olhou-se no espelho e passou batom nos lábios. Depois confessou:
— Estou inquieta, distraída, nervosa.
— Sexualmente excitada?
— Dulce, você acha que eu poderia saber se Manuel é homossexual?
Dulce ficou chocada com a pergunta e quase engasgou com a fumaça do cigarro.
— Provavelmente poderia. Porém, por que está imaginando isso?
— Não sei bem por quê. É que não consigo descobrir do que ele gosta e do que não gosta.
— Todos os homens têm suas manias, Anahi. Meu antigo namorado, por exemplo, gostava de ouvir o noticiário do rádio enquanto fazíamos amor. Imagine! Deixe-me pensar. — Dulce fechou os olhos. — Manuel quer as luzes apagadas e quer ficar de meias?
— Como posso saber? — Anahi sorriu.
— Quer dizer que nunca fizeram sexo? — Dulce arregalou os olhos.
— Isso mesmo.
— Céus! Até onde chegaram? Ao segundo estágio? Ao terceiro??
— Não tenho muita certeza de que consistem esses estágios.
— Você está fugindo do assunto, Anahi.
— Ok, nós nos beijamos.
— Nada de apalpar?
— Nada.
— Ele nunca tocou seus seios?
— Nunca.
— E sexo oral? Fizeram?
Anahi sacudiu a cabeça num gesto negativo.
— Por Deus. Agora entendo por que você pensa que ele é gay! Eu tive muitos amigos homossexuais, e apostaria qualquer quantia que Manuel não é gay.
— O que quer então dizer que ele não me acha atraente, não é verdade?
— Anahi olhou-se no espelho.
— Veja sua imagem — Dulce insistiu. — Você tem cabelos maravilhosos, rosto e corpo lindos. Acho mais provável que o homem se sinta intimidado.
— Oh, que absurdo, Dulce! Não sou nenhuma sereia, pois não?
— Acontece que na maior parte do tempo você tem um aspecto de mulher intocável. — Dulce removeu a fivela que segurava os cabelos de Anahi e deixou-os soltos. — Olhe! — disse. Em seguida tirou da bolsa um batom muito vermelho. — Limpe o seu e experimente este.
Anahi obedeceu e franziu a testa.
— É brilhante demais.
— Sim, madame. — Dulce desabotoou a blusa da amiga até a beirada do sutiã aparecer. — Você precisa mesmo usar sutiã?
— Claro! Pele nua sob tecido branco? Nunca!
— Ok, ok. — Dulce puxou para fora a blusa de Anahi e amarrou na frente as duas pontas fazendo com que o umbigo ficasse visível. — Pronto! Precisa ser um pouco mais ousada, Anahi. Garanto que Manuel necessita de algum sinal.
Anahi se olhou novamente ao espelho e perguntou:
— Você acha?
Dulce salpicou o rosto de Anahi com o batom vermelho e depois espalhou-o com o polegar.
— Pronto — disse de novo. — Faça alguma coisa para sacudi-lo um pouco. Sabe, apareça para Manuel usando apenas um cinto ou algo parecido. Nada de roupas.
— E se Manuel me rejeitar? — Anahi mordeu o lábio.
— A perda será dele. Ao menos assim você saberá em que terreno pisa. Porém confie em mim, ele não lhe dará as costas.

Dulce tinha uma aptidão toda especial de pôr o preto no branco. E mesmo que quisesse protestar, Anahi olhou sua imagem refletida no espelho e admitiu muitas possibilidades. Ela fizera um curso de pós-graduação de três anos, sempre com muito sucesso. Encarara e resolvera bem situações difíceis no hospital. Então, por que relutava em mudar de atitude para com um homem que namorava havia vários meses? Talvez por achar mais seguro deixá-lo continuar pensando que ela era miss Modéstia em vez de arriscar o crescimento da paixão que aflorava em seu corpo? Claro, não queria se transformar num tipo de mulher... bem, como as amiguinhas de seu pai, conforme sua mãe as chamava, desprezando-as.
— Vamos! — disse Dulce. — Vamos pegar uma mesa perto da pista de dança. Temos planos em andamento.
Anahi seguiu a amiga, esfregando a testa. A dor de cabeça começava.
Enquanto muitas pessoas tinham consciência, a consciência dela tinha uma consciência, algo que reinava em sua alma e a fazia se portar da melhor maneira possível, sempre.
Pelo menos até agora fora assim.
Ela engoliu em seco.
Anahi entrou no apartamento e acendeu a luz. Ainda ligeiramente tonta por causa do último drinque, chutou os sapatos e lançou um olhar ao novo telefone. A secretária piscava anunciando recado. Que elegância! Ela levou o aparelho portátil ao quarto. Não tinha um pingo de sono. Na verdade, sua pulsação aumentava a cada passo que dava.
Nas últimas horas, pensara nos conselhos de Dulce e se permitira envolverse nas ondas erógenas que rolavam no clube de strip-tease. Decidira considerar sua amiga certa. Manuel esperava que ela desse o primeiro passo.
Durante o trajeto de táxi que fizeram juntas, Dulce dera o último conselho, insistira que ela ligasse para Manuel usando a linguagem do fone sexo.
Anahi protestou, dizendo que não saberia como fazer, e o que dizer.
— Saber o quê? Fale qualquer coisa, dê uns gemidos e desligue.
— Mas como posso perguntar a Manuel se ele quer?
— Não pergunte, faça.
E se Manuel ficar chocado, Anahi pensou, ela poderia sempre se mudar
para outro estado e trocar de nome.
Andando vagarosamente no escuro, refletia. De qualquer forma, estava ansiosa para saber o que aconteceria. O fato de nunca ter usado o fone sexo antes, só contribuía para aumentar sua ansiedade. Sentia o coração palpitar com mais força, e as coxas úmidas.
Acendeu a luz, tirou o jeans, sentou-se na beirada da cama e enterrou os artelhos no tapete de crochê verde que ela fizera quando tinha quinze anos de idade. Havia séculos, portanto. Aquela idade fantasiara um romance fabuloso. Seria Manuel seu companheiro nesse romance?
Suspirou. Bem, em poucos minutos saberia se suas fantasias o atrairiam ou se o assustariam.
Anahi olhou para o relógio. Uma e meia da madrugada, quarta-feira.
Manuel entrara no primeiro sono, por certo. Mas estaria bem acordado em alguns segundos. Antes de ter tempo de reconsiderar os fatos, ela tirou a calcinha e jogou-a no tapete. Com mãos trêmulas pegou o fone e apertou o botão do número do telefone de Manuel, previamente programado.
Quando o fone começou a tocar, Anahi sentiu um calafrio no estômago.
Após o terceiro sinal, entrou em pânico e ia desligar. Mas antes que pudesse encontrar o complicado botão, ouviu uma voz.
— Alô?
— Oi, Manuel, aqui é Anahi.
— Como?
— Não fale. — Anahi acomodou-se numa pilha de travesseiros e baixou a voz, num tom que ela esperava ser sexy. — Apenas ouça.

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Ei pessoal, então, vou tentar estabelecer os dias de postagem: Segundas e Quintas! Aproveitem o capítulo e comentem!

Muito quente para dormir AyA - ADP (Finalizada)Onde histórias criam vida. Descubra agora