Capítulo 9

786 70 5
                                    

— Bem agora, quando eu entrar, o dr. Baxter vai dizer: "Aqui está a enfermeira Bel, sempre com um sorriso no rosto" — Dulce se vangloriava, com Anahi, do progresso de seu romance unilateral com o chefe do serviço de obstetrícia. — O dr. Baxter é um amor.
— O homem arranjou uma rima ridícula com um nome que nem mesmo é o seu, e você acha isso um progresso?
— Bem, você está mantendo telefonemas de sexo com um namorado de dez meses e chama a isso de progresso?
— Por favor, Dulce, diga logo ao homem qual é seu nome. Ok?
— Não quero humilhá-lo, é só!
— E você não se sente humilhada, ao ser chamada por um nome errado?
— Espero que um dia ele veja o nome certo na etiqueta do meu avental.
— Dulce notou que uma pessoa se aproximava. — Aí vem o dr. Story. Até mais tarde — ela disse.
Anahi franziu a testa. O médico estava com cara de poucos amigos.
— Bom dia, dr, Story.
— Enfermeira Portilla, soube que você aceitou um animal e cuidou ontem dele aqui nesta sala, pondo em risco nossos programas e empregos, sem falar nos riscos das vidas em emergência. Qualquer paciente não gostaria que suas facilidades de assistência fossem bloqueadas por causa das violações causadas por uma enfermeira que deveria estar dando exemplo a todo o corpo de enfermagem.
Se ele tivesse parado de falar para respirar, Anahi teria se defendido. Mas, quando o médico terminou com seu longo discurso, ela simplesmente pediu desculpas prometendo não repetir o episódio.
— Mas, se isso acontecer de novo, você será despedida no ato.
Os olhos dele confirmaram a ameaça:
— Nada de cartas de recomendação, nada de festas de despedida.
O médico retirou-se da sala e Anahi engoliu em seco. Uma segunda chance naquele campo era rara e ela não deixaria escapar a oportunidade que um dia tivera. No momento, ressentia-se intensamente do oficial Alfonso Herrera por a ter envolvido com aquele vira-lata e por ter entrado na cabeça dela na última noite enquanto se divertia com Manuel.
A lembrança dos fatos a excitou. Talvez Manuel fosse de fato o homem com quem poderia explorar suas fantasias, todas elas. Sorriu enquanto preparava a papelada para as visitas aos pacientes. Imagine! Um homem que, tal qual ela, mostrava uma face ao mundo, enquanto bem no fundo também procurava a companhia de alguém para expor suas paixões. Que maravilha terem se encontrado, ela e Manuel! Anahi sorria procurando ignorar a imagem de Alfonso Herrera tirando-lhe da garganta o pedaço de pão que a sufocava. Ele salvara a vida do cachorro e a dela no espaço algumas horas.

Graças ao bom Deus o resto do dia se passara sem grandes problemas. Em especial quando ela voluntariamente se oferecera para trabalhar no departamento de doação de sangue até tarde da noite. Relaxaria no telefonema com Manuel quando chegasse em casa. Uma maravilhosa compensação extra seria o sono que viria depois, apesar da sufocante temperatura do apartamento.
Anahi saiu do hospital às três horas, tencionando voltar mais tarde para o trabalho no departamento de doação de sangue, à noite.
Abanava-se com um caderno que encontrou na bolsa, apresentando como desculpa para seu exagerado interesse por sexo a influência do calor nos hormônios. Estava se portando de maneira estranha, fazendo telefonemas de sexo com um homem, com Manuel, e fantasiando outro. Se não era delito grave era, no mínimo, um pecado muito extravagante.
Anahi procurava seu assento costumeiro no último banco do ônibus quando deparou com um anúncio num poste da rua. Cachorro perdido. Mestiço, macho, pêlos longos e de várias cores. Atende pelo nome de Tralfaz.
Anahi fez uma careta. Tralfaz? Não admira o pobre cachorro ter fugido de casa.
Depois de tomar nota do endereço, teve uma idéia. O posto policial ficava a uma quadra do hospital. Ela poderia deixar o endereço com o oficial Herrera no caminho. Com certeza ele levara o animal a um abrigo para cães e lá o deixara.

Anahi nunca estivera dentro de um edifício da polícia antes. Achou tudo uma verdadeira confusão. Soldados andavam por todo o lado, em grande atividade. Ela teve de esperar em fila durante vinte minutos para falar com um funcionário de meia-idade.
— Em que posso ajudá-la? — o homem lhe perguntou.
— Procuro pelo oficial Alfonso Herrera.
O rapaz examinou-a da cabeça aos pés e depois sorriu.
— O assunto é da polícia? — perguntou.
— Não, é pessoal.
— Oh? — Aí ele arregalou os olhos. — Oh. Apenas um momento. — Pegou o telefone, falou alguma coisa e desligou em seguida. — Por aqui — disse.
Anahi seguiu o homem num labirinto de corredores e assustou-se um pouco ao deparar com grupos de soldados pelo caminho. Que diabos estará acontecendo?
— Alfonso! — o homem de meia idade gritou. — Feliz aniversário, homem!
Alfonso Herrera virou-se, viu-a e levantou-se vagarosamente da escrivaninha, o rosto uma máscara de surpresa. Anahi engoliu em desalento.
Alfonso era atraente tanto quanto ela se lembrava, céus!
— Bem? — O homem que a recebera fitou-a. — Trouxe sua própria música?
— O que está havendo? — Alfonso indagou das pessoas que o rodeavam.
— Klone providenciou uma dançarina de strip-tease para seu aniversário, Alfonso! — o homem explicou.
O grupo rompeu então em aplausos e vivas de encorajamento. Anahi gelou. Uma dançarina? Acharam que ela era uma dançarina de strip-tease?
Cruzou então os braços e ficou olhando para Alfonso, os olhos arregalados, como a lhe pedir socorro. Porém Alfonso não pareceu nada preocupado. Apenas disse:
— Miss Portilla é uma enfermeira registrada do condado.
Um silêncio reinou no lugar e o grupo se retirou. Quando os dois ficaram sozinhos na sala, Alfonso disse, divertido:
— Oi!
— Alô — Anahi respondeu, bem menos divertida.
— Sinto muito pelo que houve, madame. Os rapazes se enganaram. Aceita uma xícara de café ou qualquer outra coisa?
Oh, aquele negócio de "madame" a deixava louca de entusiasmo. Ela molhou os lábios e respondeu:
— Não, obrigada. Vim para lhe dar o número de um telefone.
Alfonso sorriu e ela apressou-se em acrescentar:
— Não o meu. Vi um anúncio num poste, sobre um cachorro perdido, e achei que poderia ser o que você atropelou.
— Acidentalmente — ele corrigiu-a, irônico.
— O que quer que seja. Tome. — Ela estendeu-lhe o papel com o número do telefone.
— Obrigado.
Alfonso não pareceu tão grato assim, pelo menos Anahi achou. E ela perguntou:
— Você o levou para algum abrigo de animais?
— Não. Levei-o comigo.
— Oh, que lindo!
— Você teve dificuldade no hospital por minha causa?
— Tive.
— Sinto muito, madame.
— Não sente coisa nenhuma. Eu lhe disse que não podíamos receber cachorros lá, mas você não foi embora.
— O cão podia ter morrido.
— Olhe, eu gosto de cachorros tanto quanto gosto de gente. — Anahi sacudiu a cabeça. — Mas como você se sentiria se tivesse um enfarte e visse um cachorro deitado na cama ao lado da sua?
— Depende. Você seria a enfermeira?
— Adeus, oficial Herrera.
— Espere. Eu estava saindo para o almoço. Quer comer alguma coisa comigo? Ao menos um cachorro-quente?
— Não!
— Oh, aceite. Afinal, salvei sua vida ontem. Você me deve um cachorro quente. Ademais, é meu aniversário hoje.
À vista dos brilhantes olhos castanhos, ela hesitou.
— Bem...
— Alfonso — um rapaz atrás dele gritou. — Feliz aniversário, homem!
A turma toda voltara, escoltando uma loura vestida com uniforme de enfermeira. Isso se as enfermeiras usassem minissaia, claro. E saltos de dez centímetros.
Anahi encolheu-se num canto quando a enfermeira, uma dançarina, colocou sobre a escrivaninha uma caixa de música, apertou um botão e começou a ondular o corpo ao som da música "Feliz Aniversário!"
A mulher tirou então o gorro de enfermeira soltando uma massa de cabelos louros que lhe cobriram o rosto. Quando ela começou a desabotoar a blusa Anahi deu um passo atrás, travando uma terrível batalha emocional. Queria ver como Alfonso reagiria ao convite.
Oficial Herrera parecia estar adorando tudo. Não de maneira libidinosa, mas divertindo-se. A mulher ficara reduzida a um biquíni e sutiã, e enrolava os braços em volta do pescoço dele, dançando ao redor. Anahi imaginou-se então no lugar da mulher, despindo-se, mas para a assistência de uma só pessoa. Porém, que pessoa?
Ela arregalou os olhos. O que estava pensando?
Quando a mulher fez Alfonso sentar-se na cadeira e acomodou-se no colo dele, Anahi fugiu.

Muito quente para dormir AyA - ADP (Finalizada)Onde histórias criam vida. Descubra agora