Noah tentava dormir, revirou-se centenas de vezes no colchão, atulhado de lã e palha, que picava-lhe ocasionalmente. Desistiu de adormecer! Rastejou na cama, até ficar relativamente próximo da janela. Olhou para além dela, a sua atenção atravessou o prado brando, até se acomodar a examinar a extensão de carvalhos e eucaliptos. As palavras, que escutara nessa tarde, ecoaram no interior da sua cabeça:
- Quem se atreve a entrar no meu território? Não quero saber! Vão-se embora ou terei que vos fazer desaparecer! – Deixou que ecoassem incessavelmente, estudando-as minuciosamente, procurando captar o mais ínfimo pormenor sobre o seu emissor. Quanto mais pensava mais se assegurava: não fora uma mulher que o afugentara da mata, nem se sequer se deixava levar pela crença de que fora um homem. A lenda detrás da mata da bruxa tresandava a uma mentira mal fabricada, ou, pelo menos, um exagero da realidade. O homem tende a distorcer os factos para explicar pormenores que desconhece, tem sempre que engendrar uma justificação para tudo, até o disparate mais rebuscado faz sentido perante uma mente confusa.
Já ardera metade da vida da noite sem fulgência e Noah, ciente de que o sono não o visitaria, decidiu fazer a coisa em que era melhor: tomar uma atitude impulsiva. Iria investigar, em vez de deixar o assunto moer-lhe o juízo.
A madeira, da cama, rangeu timidamente quando saiu do seu seio. Ficou de pé, a deliberar exaustivamente. Ser apanhado não era opção, o pai oferecera-lhe uma reprimenda de horas quando descobrira que explorara a mata da bruxa. A mãe e a irmã tinham empalidecido devido à preocupação e a sua outra irmã, a bebe, reagiu da única maneira que sabia reagir, pelo menos assim lhe parecia, chorou.
Deixou a mente trabalhar. Descer pelas escadas era desaconselhável, a madeira iria ganir mais fervorosamente que qualquer canino, o estrépito acordaria o seu pai, o qual detinha um sono leve, o menor sonido e ele correria para fora da cama, no intuito o apanhar. Não, a única solução era sair pela janela!
Avançou pelo quarto, o mais silenciosamente possível para não deixar atravessar ruido para o andar inferior, onde dormiam os pais. Diante do compartimento, sentiu o peso da janela, cujo vidro começava a embaciar-se devido à humidade, a ser suportado pelas suas mãos. Empurrou-a para cima, a ferrugem fazia com que deslizasse muito devagar. Ao terminar a tarefa suspirou de alívio, por o ter feito sem fazer muito barulho. Apesar de não a ter aberto na totalidade, conseguiu passar pelo buraco ingreme da abertura, devido à sua constituição.
O vento frio invadiu-lhe a garganta e fustigou-lhe o interior quando se lançou para o ar, caindo na noite, até aterrar sobre um monte de palha, estrategicamente colocado debaixo da sua janela. Quase mordera a língua, agradeceu à sua sorte por não se ter magoado e elaborou uma prece mental à Vontade para que tivesse sido o mais silencioso possível, enquanto cuspia palha para fora da boca.
- Espero que ninguém me tenha ouvido. – Sussurrou para uma porção dos animais da quinta da sua família, os quais lhe fitavam curiosos, os restantes dormiam tranquilamente, totalmente alheios à sua presença. Os despertos correram até si, ansiavam cumprimentar o dono favorito. Os animais adoravam Noah, mal o viam apressavam-se a chegarem perto dele, lambendo-o ou rogarem por festas. Sorriu, deixava-o feliz ver a felicidade nas criaturas da natureza, as quais amava como se fizessem parte da sua família. Era-lhe mais fácil gostar de animais do que de humanos, com estes últimos existiam sempre intrigas e problemas. A vida era mais simples para os outros seres vivos, livres das intrigas que uma mente consciente lhes fornecia.
A camisola de pele resguardava-o contra as temperaturas desagradáveis, assim como os calções largos e castanhos, amarrados com um cordão áspero, o qual lhe dava um certo desconforto na cintura, devido ficar demasiado apertado por vezes, porém cumpria a sua tarefa, os calções jamais lhe caiam.
- NOAH!!!! – Pulou, alarmado. O grito irado e profundo velejara de detrás de si, proveniente da sua casa acolhedora e de porte impressionante. O pai devia ter acordado e verificado o seu quarto. Carlus Reymes advertira-o, durante os seus quinze anos, quanto a se aventurar na mata da bruxa, fora expressamente proibido em sequer pensar lá entrar.
Virou-se para trás: a noite tentava ocultar a habitação, moldada pela madeira mais escura, a entrada fora decorada por uma fila de escadas e encoberta por um alpendre do mesmo material, enfeitado por resmas de musgo e hera. O pai mandava-o, por várias vezes, buscar uma faca, pegar num escadote e raspar as trepadeiras e musgo que procuravam engolir o edifício. Era uma tarefa demasiado árdua, que durava horas, ou dias, e que Noah absolutamente abominava. Seis janelas largas enfeitavam o andar inferior, outras quatro, de porte consideravelmente inferior, avistavam-se no primeiro andar. O topo da casa estava tapado por palha e troncos.
A porta de entrada chiou, ao ser aberta por dentro. Nem esperou para ver a forma do pai a surgir, pois saiu disparado, entre o mar de animais, na direcção da cerca, a poucos metros de distançia. Apoiou-se nesta, pulando-a, num esforço que esgotou grande parte da força presente nos seus braços. No entanto continuou a fugir, descendo o prado na direcção da mata. A falta de descanso desprovia-lhe de energia necessária, apercebeu-se disso ao constatar que corria mais devagar do que era costume.
- Anda cá seu inconsciente, quantas vezes te avisei para... - Rosnou o pai, pela primeira vez, a seguir no seu encalce. Carlus Reymes era um espécimen de inveja para os seus quarenta anos, tão possante quanto um touro e tão veloz quanto uma lebre, mesmo um jovem esguio e rápido como Noah era incapaz e o deixar para trás. – Noah volta aqui! – Ordenou o progenitor ao ver que o filho o deixava para trás. O último via-se prestes a deixar-se ceder perante o esforço, desejando tombar no solo de ervas e plantas e aguardar pelo regresso do seu folego. Porém, insistiu num ultimo esforço, acabou de descer a colina, travando apenas quando ficou diante da mata e deixara de avisar o pai na distançia.
***
Noah jamais se arrependeria duma decisão que tivesse tomado, apesar de começar a inquirir-se se teria sido uma boa ideia aventurar-se naquele lugar. Fugira do pai, o que lhe iria valer um grande castigo. Tudo para ir ali, porquê? Era assim tão importante descobrir o pormenor que faltava naquela história? Bem para si era, não sabia porque mas precisava de saber.
O breu entranhava-se na mata, cortando o seu campo de visão, mal conseguia perscrustar o que quer que fosse. Olhou para cima, a copa das árvores tapava o céu estrelado. Sentiu uma picada no pé desnudo, baixou-se para compreender que pisara um galho pontiagudo. Procurou ignorou o ardor incómodo. Temia que o pai surgisse, apesar de ter a vaga ideia que ele jamais entraria ali.
Aventurou-se por entre as arvores, o coração latejava devido a uma razão qualquer.
- Não pode ser, Noah Reymes não fica nervoso. – Murmurou para o vazio, apertando o peito, expirando e inspirando para se acalmar. Era incapaz de compreender porque tinha os nervos descontrolados.
- Todo o homem fica. – Respondeu a voz do dia anterior, que se alastrou ao longo da mata. O som parecia menos agressivo desta vez. – Eu sabia que voltarias! – A última frase veio detrás de si, juntamente com o sonido de galhos a se partirem. Virou-se, conseguindo avistar uma figura, um vulto resguardado pelas sombras. Pela primeira vez na sua vida, Noah tremeu.
- O que és tu? – Não resistiu a perguntar, entre engasgos.
- Sou um dos filhos da natureza, um Fo'eaf. – Noah conseguiu, finalmente, ver como era o emissor da voz, achando-o o ser mais estranho que jamais vira.
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A Canção Da Natureza(UM CAPITULO POR SEMANA)
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