— Bia.
Ela acordou com alguém balançando seu ombro de leve e começou a se espreguiçar quando a sensação de déjà vu a fez dar um pulo e olhar em volta. A visão familiar do seu quarto e o rosto do Fred afastaram o susto.
— Calma! — Ele deu uma risada. — Desculpa ter entrado, mas já são uma e meia e você nunca dorme até tarde.
— Eu cheguei de madrugada e custei a dormir. — A Bia passou a mão nos olhos, espantando o restinho do sono.
— A mamãe e o papai foram almoçar na casa do doutor Macedo, eles falaram que você pode ir pra lá, se quiser.
O doutor Macedo era o sócio do seu pai na clínica. Ele e a esposa eram uns amores, mas os almoços na casa deles eram um tédio. Só gente velha e conversa sobre trabalho.
— Você vai? — Ela examinou o irmão que segurava a chave do carro dele.
— Não, eu vou num restaurante qualquer aqui por perto mesmo. Você quer vir comigo? Ou eu posso trazer comida pra você, preguiçosa.
— Me dá quinze minutos?
— Eu te espero lá embaixo.
A Bia se arrumou em tempo recorde. Depois de usar o banheiro, ela fez um rabo de cavalo, porque dormir com o cabelo molhado tinha as suas consequências, colocou um vestido, sapatilhas e passou um batom.
— Cadê o seu carro? — o Fred perguntou, assim que eles puseram o pé fora da porta.
— Tá com o Diego. E antes de você perguntar, não, nós não voltamos. — A Bia pôs os óculos escuros, incomodada com a claridade e uma leve dor de cabeça.
— Mas, pelo jeito, é uma questão de tempo se vocês estão voltando aos velhos hábitos.
— A gente estava na mesma festa ontem e ele não tinha carona. Foi só.
— Onde você quer ir? — O Fred parou o carro na saída do condomínio e esperou.
— Qualquer lugar que tenha massa, pra mim tá bom.
— Sim, senhorita. — Ele arrancou e deu uma olhadinha de lado. — Pra você ter esquecido o Diego tão rápido, só pode ter outro cara na parada. Alguém que eu conheço?
— Não e nem vai conhecer.
— Você tá muito mal-humorada hoje, sabia?
— Desculpa. É que acabou antes de ter começado. — Ela massageou as têmporas, arrependida pela má resposta, mas conversar sobre o Lourenço era a última coisa que ela queria. — Será que a gente podia mudar de assunto?
— Tudo bem. — Ele não pressionou, talvez percebendo que o assunto era mais delicado que o normal.
O restaurante estava cheio e barulhento, mas na metade do prato de fetucine com molho branco, a Bia começou a se sentir humana outra vez. Carboidratos e calorias melhoram o humor de qualquer um. Depois, era só escolher alguma sobremesa com chocolate e deixar as endorfinas cuidarem do resto.
— Fica de boa e não fala nada — o Fred pediu, deslizando o braço por trás da cadeira, apoiando a mão no ombro dela.
Três moças passaram pela mesa deles, e pelo olhar mortal que uma delas lançou na direção do irmão, ele tinha aprontado.
— Sério que você acabou de fingir que eu sou sua namorada? — a Bia perguntou, com uma risada, depois que elas se afastaram.
— Ela vai pensar o que quiser. — O Fred tirou o braço e continuou a comer normalmente. — Não é minha culpa se ela achou que eu ia pedir ela em casamento por causa de uma noite.
A Bia largou os talheres, perdendo o apetite.
— Como é que os homens conseguem passar por uma experiência tão pessoal como o sexo de maneira tão impessoal?
— Essa acusação além de injusta, não podia estar mais ultrapassada. — O Fred balançou a cabeça. — Já era o tempo em que vocês eram criadas pra casar virgem e se sentirem culpadas por transar fora de um relacionamento sério. A Dani não pensa assim porque é mulher, ela pensa assim porque é a personalidade dela. E por incrível que pareça, já aconteceu de eu querer continuar a ver a menina e levar um fora porque ela não estava a fim de mais do que sexo.
O Lourenço tinha lhe feito um convite no dia seguinte à primeira primeira vez deles, mas ele foi motivado pela culpa de ter tirado a virgindade de uma menina bêbada e não porque se importava com ela. E o pedido do telefone no outro dia foi com a única intenção de acrescentá-la na lista de contatinhos dele. A descoberta da noite anterior confirmava tudo aquilo.
A Bia até concordava que homens e mulheres se tornavam cada vez mais iguais, mas se apegar não tinha nada a ver com criação. Toda mulher tinha o instinto de querer cuidar e ficar perto, afinal elas eram mães. E os homens, desde os tempos das cavernas, precisavam ser fortes e desapegados para largar a família e sair para caçar. Independente do estado da evolução humana, as mulheres sempre iam se importar mais do que os homens, mesmo que não dessem o braço a torcer.
— E o que você fez? Quando você quis continuar e ela não? — Ela brincou com a comida no prato.
— Arrumei outra. Nada como um novo amor pra ajudar a superar o antigo.
A brincadeira do irmão não lhe arrancou um sorriso, como ele provavelmente esperava. Colocar uma variável extra naquela equação não iria resolver o problema da Bia, e seria melhor seguir com o plano de ficar sozinha por um tempo.
— Se você quiser, eu posso ir lá tirar satisfações com ele pra você — o irmão ofereceu.
— Por quê? Porque eu sou a Dani dele, e ele é o meu Fred? — Sua franqueza fez os olhos dele se arregalarem. — Eu não esperava um pedido de casamento, ele foi honesto e eu sabia o que eu estava fazendo, e nem é arrependimento, é só que eu queria... mais.
O Fred puxou a irmã para um abraço e ela deitou a cabeça no ombro dele.
— Se ele não conseguiu ver que você é uma menina que merece muito mais, você tá melhor sem ele.
— Olha quem tá cheio de frases feitas hoje. — A Bia deu uma risada seca.
— Eu tô lendo uma porção de livros de autoajuda pra impressionar a estudante de psicologia que eu tô paquerando — o irmão brincou e daquela vez consegui fazê-la sorrir. — E nesse caso é verdade. Você já reparou como os seus ex-namorados sempre correm atrás de você depois que você termina com eles? É porque eles não se conformam em te perder.
A Bia se separou do abraço, revirando os olhos.
— Não exagera.
— Eu não tô exagerando. O Diego mesmo, tem mais de um mês que vocês terminaram e ele não ficou com o seu carro ontem porque estava sem carona. — O Fred levantou as sobrancelhas a desafiando a contradizê-lo. A Bia foi obrigada a morder os lábios e ficar calada por culpa da porcaria do beijo do ex-namorado na despedida. — Ele é um cara legal, Bia, por que você não dá outra chance pra ele?
— E se eu te dissesse que a Dani também me pareceu uma menina super legal?
— Eu ia responder que é uma merda como o nosso coração não gosta de obedecer à gente.
— Me empresta seu livro? Ele tem resposta pra tudo. — A Bia deu uma risada.
— Vai debochando, vai. — Ele se fingiu de ofendido. — Mas a minha filosofia barata fez você se sentir melhor.
Era verdade, a conversa com o Fred tinha consolado um pouco a Bia, mas não por causa da filosofia barata, mas pela maneira com que ele sempre se preocupava e cuidava dela.
Como todo bom irmão mais velho, ele era implicante e chato, mas bastava alguém ameaçar sua irmãzinha que ele vestia a capa de super-herói, pronto para defendê-la de todos os vilões.
A Bia quase disse aquilo, mas ficou calada. Ele já era metido demais.
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Mau Amor [Concluído]
RomanceQuem nunca se enganou com uma pessoa? Aceitou primeiras impressões só para descobrir que não era nada daquilo? Ou será que era? Bia está longe de ser uma princesa, mas quando o príncipe encantado aparece em sua vida, ela resolve lhe dar uma chance...