Capítulo 3

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É uma questão de tempo.

O Diego continuava cercado pelas pessoas disputando sua atenção. Ele e a Bia estavam mais afastados do que nunca, mal se viam e até as conversas pelo telefone estavam estranhas. Ela, que tinha terminado com tantos namorados, esperava a qualquer momento sofrer fim igual.

Mesmo sem outra companhia, a Bia fez questão de estar presente no primeiro desfile dele. Outra tentativa de demonstrar apoio e tentar se enturmar com a nova tribo do namorado. A griffe de roupas fechou um bar em Copacabana e, ao invés de uma passarela, os modelos tinham simplesmente passeado por entre as mesas. A nova profissão do Diego estava minando o relacionamento deles, o que não impediu o peito da Bia de transbordar de orgulho, ele atraiu todos os olhares e foi a sensação da noite.

— Até que enfim — ela murmurou quando a rodinha em volta do namorado se desfez e ele conseguiu andar, no mesmo instante em que o garçom colocava a vodca que ela tinha pedido na sua frente.

As batidas do coração da Bia acompanharam os passos do Diego. Ele não ia gostar de vê-la bêbada. Antes que ela pudesse pedir ao garçom para sumir com a vodca, a Vera interceptou o Diego, o puxou para a esquerda e o levou embora. A Bia riu da piada que só ela entendeu. O caminho dele para chegar até ela tinha sido exatamente igual ao namoro, devagar no começo, tomou fôlego e pareceu ir bem, até que, de repente, pegou um desvio inesperado e que ninguém sabia onde ia parar.

Ela pegou o copo e tomou um gole grande.

— Ei! — A Bia olhou para o garçom que ainda estava parado do lado dela. — Isso é água.

Tudo bem, era open bar, mas tentar fazer água se passar por vodca era demais. Ela estava bêbada, não burra.

— Eu achei que você estava precisando.

— Garçom não é pago pra achar nada. Garçom é pago pra trazer o que o cliente pede. — Ela estendeu o copo de volta para ele.

— Eu já trago a sua vodca, senhorita. — Ele não foi irônico, e pegou o copo da sua mão trêmula com calma e indiferença.

Ele não era muito mais velho que ela e já estava acostumado a ser tratado como lixo pelas Patricinhas de Copacabana Hills que frequentavam o bar. O estado de embriaguez não impediu a Bia de se envergonhar pela explosão anormal.

— Desculpa. — Ela segurou o braço dele, que a olhou com as sobrancelhas levantadas. Que lugar era esse em que ser maltratado era comum e um pedido de desculpas causava espanto? Ela não queria se acostumar com aquilo, pior, ela não queria que o Diego virasse aquilo, e, no entanto, parecia um caminho sem volta. — Eu não tô acostumada a beber e tô tendo uma péssima noite. Eu ainda quero a vodca, mas deixa a água. Obrigada.

Ele colocou o copo de volta na mesa.

— Talvez, se você comesse alguma coisa — o rapaz sugeriu.

— Uma porção de batata frita. Grande. Com um potinho de ketchup, por favor. — Ela riu da própria piada, e arrancou um meio sorriso dele.

— Eu posso te arrumar um prato de queijo ou azeitonas.

— Só a vodca tá bom, obrigada. Eu prometo que bebo a água todinha até você voltar.

Ele deu um sorriso inteiro dessa vez.

Num desfile de modas até o garçom é bonito, ela acompanhou as costas dele indo embora.

A Bia bebeu outro gole de água, olhando em volta para ver se alguém estava prestando atenção em como ela era o tipo de pessoa que cumpria as promessas que fazia, mas ninguém nem olhava na sua direção. Talvez ela devesse ir procurar o Diego só para dizer isso para ele? Impossível. Ele estava perdido de vez atrás da massa de pessoas que começava a se balançar na pista de dança improvisada ao som da música eletrônica.

Dançar.

Dançar sempre a animava e seria ótimo para clarear o cérebro. Ela deu um pulo do banco alto e precisou se segurar na mesa para não cair porque o bar começou a rodar.

Banheiro, antes.

Jogar um pouco de água fria no rosto poderia ajudar. O orgulho por ter encontrado o banheiro sozinha acabou quando ela abriu a porta e o cheiro forte de perfume a fez correr até o cubículo mais próximo e colocar um pouco do álcool no seu estômago para fora.

Vomitar também ajuda, ela consolou mentalmente a moça de olhos avermelhados que a encarava de volta pelo espelho.

A Bia jogou água no rosto, bochechou com enxaguante bucal e se jogou no pequeno sofá de couro preto que ficava num canto do banheiro. A tontura melhorou um pouco, mas dançar ainda parecia uma tarefa super difícil e ela se recostou para descansar só um minutinho.

O barulho da porta do banheiro abrindo a despertou e ela não soube dizer por quanto tempo tinha ficado apagada.

Duas moças entraram rindo e foram direto para a pia. Como se a Bia fosse invisível, elas espalharam um pó branco no balcão e cheiraram com o que parecia ser uma nota enrolada. Desde que tinha começado a frequentar as festas do Diego, ela presenciou tantas cenas como aquela que nem se espantava mais.

— Tá a fim? — uma das moças ofereceu, encontrando o olhar da Bia pelo espelho.

— Não, valeu.

Álcool era o máximo de intoxicação que ela se permitia, e mesmo assim, só de vez em quando. O curto período de ilusão que as drogas oferecem não compensa o resto do tempo em que elas te fazem de escravo.

Uma das meninas entrou num dos cubículos e começou a vomitar. A Bia olhou a garrafinha de enxaguante bucal quase vazia.

Será que aquele era o item número um da lista de compras do dono do bar? Provavelmente.

O cheiro voltou a deixá-la enjoada, e não dava para continuar dormindo no banheiro. Perder a linha na pista de danças e envergonhar o Diego também não era uma boa ideia.

Ir para casa. Nesse instante.

Ela pegou o celular.

Bia: Eu tô passando mal. Eu preciso ir embora.

Alguns minutos depois veio a resposta.

Diego: Tudo bem. Amanhã a gente se fala.

— Que droga! — A Bia jogou o celular dentro da bolsa e apertou os olhos para evitar as lágrimas. No começo do namoro, a mensagem teria feito o Diego largar tudo e vir correndo. Agora ela não recebia nem um 'o que você tem?', ou um 'tá precisando de alguma coisa?'.

Amanhã, quando ela não estivesse tão bêbada, os dois iam se falar, sim. Eles iam sentar, conversar e parar de jogar aquele jogo covarde de não admitir que o namoro já era, e que o conto de fadas tinha chegado ao fim.

Mau Amor [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora