Capítulo 7

482 53 16
                                    

Estavam no meio da aula de história com a professora McGonagall quando os guardas interromperam, avisando que o correio tinha chegado.
Em qualquer outra situação, a instrutora ficaria estressadíssima, mas a ansiedade no rosto das selecionadas fez com que ela desistisse de concluir o seu raciocínio sobre a rivalidade entre a Irlanda Oriental e a Irlanda Ocidental.
Jane, Sirena e Severina foram as únicas a ficarem sentadas, sem a menor ansiedade para irem atrás de cartas para elas, talvez porque soubessem que não as receberiam.
- Deve ser por isso que os diplomatas estavam aqui no sábado - disse Sirena, sabiamente - Illéa é uma intermediária no conflito.
- Eu espero que eles consigam - comentou Jane - Essa situação é bem inconveniente.
- Querem um chá para continuar discutindo a geopolítica mundial? - perguntou Reyna, debochada, guardando um envelope em um bolso que as suas criadas devem ter costurado a seu pedido.
Provavelmente, uma carta vinda de seu pai. Ou será que ela tinha irmãos? Não, se tivesse um provavelmente já teria mencionado, como Sirena já tinha feito.
- Oh, por favor! O meu com gengibre - brincou Sirena.
- Odeio chá - respondeu Jane.
Elas pareciam surpresas por sua revelação.
- Não sabia que futuras princesas odiavam chá - disse Sirena.
- E o que você gosta de beber? - perguntou Reyna, levantando uma sobrancelha.
- Cerveja - respondeu Jane, sem hesitar.
A professora McGonagall engasgou, enquanto as outras duas começaram a rir.
- Você é uma caixinha de surpresas, Jane - comentou Reyna, solene.
Abriu a boca para perguntar qual era o problema de gostar de cerveja, confusa, antes que as outras meninas voltassem a seus lugares, sorrisos saudosos e empolgados nos rostos após conseguirem notícias de seus familiares.
- Sexta-feira vocês estarão no Jornal Oficial de Illéa para uma entrevista com a jornalista - McGonagall voltou a falar, depois que todas pareciam mais calmas e centradas - Se quiserem alguma ajuda para enfrentar essa situação, podem me procurar.
- Seria de grande ajuda se pegasse emprestada a pauta de perguntas da Rita Skeeter - Fabiane brincou.
- A surpresa é a graça da entrevista - retrucou Stelle - Imagina que chato seria se todas soubessem exatamente o que falar. Seria tudo apenas respostas decoradas.
- Não é como se a rainha pudesse fazer isso sempre, em reuniões diplomáticas - acrescentou Chavelle.
- Bom, exceto invasão de estúdio e furto de materiais jornalísticos, - disse McGonagall, fazendo-as rir da brincadeira - podem pedir a minha ajuda para o que precisarem.
Jane questionou-se se ela estava comentando aquilo por causa da pequena aula de etiqueta que deu para Artemisa e algumas outras selecionadas e quase sentiu-se mal, mas a leveza em sua voz não dava a entender isso.
Lembrou-se do brilho nos olhos de Liam e sentiu o coração aquecer-se por um momento. Ele teria contado a alguém o que viu? Gostaria de saber o que tinham feito para causar aquela expressão tão tenra, apenas para repetir e poder vê-lo assim mais vezes.
- Eu gostaria que você voltasse a falar sobre a Irlanda Oriental e sua relação com Illéa - pediu Queensley, recebendo a concordância de várias outras garotas.
McGonagall sorriu, antes de continuar com a sua aula.

♛♛♛

Myrtle, Hope e Pomona estavam estranhas.
Elas fofocavam por suas costas, sempre parando de conversar nada naturalmente e super suspeitosamente quando entrava em seu quarto. Elas não eram muito boas em disfarçar que estavam escondendo um segredo dela.
Jane não gostava de sair pressionando as pessoas, mas a curiosidade começava a consumi-la. O que elas estavam escondendo tinha relação com ela? Com o príncipe? Com a seleção? Ou era um problema entre elas? Por que não confiavam nela?
Então, quando sexta-feira chegou, ela descobriu que elas não estavam escondendo um segredo, elas estavam conspirando contra ela - sua convivência com Sirena estava começando a afetar na sua personalidade.
Tudo começou quando ela estava sentada na cama, lendo um livro em irlandês. Se Illéa estava tão próxima das negociações entre a Irlanda Oriental e Ocidental, seria sábio considerar que talvez as selecionadas pudessem enfrentar aquela situação uma hora ou outra, e estar preparada era praticamente um dever seu como princesa, mesmo que ela não fosse princesa de Illéa. Estava ajudando a um aliado, apenas isso.
Então as três criadas confabuladoras entraram silenciosamente no quarto, Pomona segurando um cabide que estava com um tecido ao redor para esconder o seu conteúdo. Todas com sorrisos muito suspeitos.
- Podem começar - ela deixou o livro de lado, cruzando os braços - O que significa isso?
Hope desceu o zíper, mostrando um vestido azul de tirar o fôlego.
As mangas eram soltas, abaixo dos ombros, como se estivessem flutuando, de um azul transparente. Ela não sabia o nome do tecido, mas conseguia comparar ao véu de uma noiva. Na curva da cintura, pedrinhas brancas estavam costuradas juntas para demarcar. Cintura alta, não cintura baixa. Ela não conseguia ver alças nem um tecido transparente que tornasse possível aquela construção, e isso só o tornava mais perfeito ainda: a sensação de que as coisas estavam em seu lugar apenas por mágica. No início das mangas transparentes e da gola tomara que caia do vestido, as pedrinhas brancas também faziam presença, junto com desenhos florais.
- Não acha exagerado para uma entrevista? - perguntou Jane, encantada.
- Nada que você vista fica exagerado - respondeu Pomona.
- Já está na hora - disse Hope.
Então elas começaram a arrumá-la.
Não é que Jane não gostasse dos momentos em que era mimada e tinha a sua pele cuidada pelas loções e maquiagens, é só que ela não tinha o que fazer nesses momentos, além de ficar encarando o teto, esperando para acabar. Queria chamar Sirena para conversarem, mas ela também devia estar se arrumando para a entrevista, assim como Reyna e todas as outras garotas.
Encostou a cabeça em um dos braços, cheirando a loção que elas passaram.
- Esse cheiro é novo - ela notou - Pensei que todas éramos obrigadas a usar a mesma loção porque é o cheiro favorito do príncipe?
- Não combina com você - foi apenas o que Pomona respondeu - Macadâmia é bem melhor.
- Além do mais, você tem que se destacar, não é? - Hope deu uma piscadela discreta.
- Tem um gosto muito bom - disse Myrtle, parecendo distraída.
As outras duas pararam de passar a loção por suas pernas, olhando para a terceira criada.
- Macadâmia tem um gosto muito bom - Myrtle tentou explicar-se, envergonhada - É uma noz.
- Você não é alérgica, certo? - perguntou Hope, parecendo preocupada - Tem uma selecionada que é alérgica a nozes.
- Não, eu só tenho alergia a frutos do mar - respondeu Jane.
- Eu não tenho alergias, deve ser horrível - comentou Myrtle.
Pomona deu uma cotovelada nela, como que dizendo que deveriam se concentrar em arrumá-la, em vez de ficarem conversando.

UndercoverOnde histórias criam vida. Descubra agora