Foragidos

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CAPÍTULO TRINTA E TRÊS

A G N E S • H E R N A N D É Z

"Se eu te amo fosse uma promessa
Você a quebraria se fosse honesta?
Diga ao espelho o que você sabe que ela já ouviu
Eu não quero mais ser você"
Billie Eilish - idontwannabeyouanymore.

A fome tinha me atacado de jeito, os armários da Alysson não tinha uma comida decente, mas na hora da necessidade qualquer coisa serve.

Dou graças aos céus que aqueles quatro estavam se divertindo longe daqui e não estavam presenciando o meu estado, estou deplorável. O cabelo amarrado lá no alto em uma coisa que não posso chamar de coque porque meu cabelo é um pouco curto pra isso, um blusão preto com uma cruz branca na frente e nos pés minhas inseparáveis meias.

Termino de esquentar o nescau e abro dois pacotes de biscoito, um de morango e o outro de chocolate, despejo tudo em um potinho que parecia uma flor. Ainda faltava alguma coisa, abro a geladeira e vejo um paraíso de iogurtes, pego uns 4 e agora sim eu posso encher minha barriga.

Meu celular tocava de 5 em 5 minutos e claro que só podia ser o Kevin, que por sinal estava podre de bêbado, só deixar registrado que já tenho problemas demais e não vou cuidar de ninguém mesmo que chegue aqui morrendo.

Coloco o celular no silencioso e vou pra sala ver o que tinha de bom na televisão, não era algo que eu curtia, mas no momento até que estou precisando.

- Jornal, jornal, só passa isso - reclamo enquanto vou passando os canais até ver algo que chama minha atenção.

- Os internos Agnes Hernández Conte, Jack Smith, Nicolas Shantal, Alysson Vegas e Kevin Dias se encontram foragidos no momento. Responsáveis pela maior chacina do ano, eles não vão sair impune - a repórter falava enquanto mostrava nossos rostos.

É lógico que depois do que fizemos as coisas iriam ficar feia pro nosso lado, foi muito rápido e agora além de louca sou foragida da polícia.

Termino de comer e subo correndo pro quarto, preciso fazer essa transferência rápido e dar o fora daqui, o México ficava apenas 2 horas dos Estados Unidos, 2 horas somente e não vou ser presa. Embora eu seja a única de menor, não quero ser apreendida.

Recebo uma mensagem de voz do Jack e ignoro, outro bêbado que vivia me mandando fotos borradas, ainda bem que não fui senão estaria passando raiva uma hora dessas.

Eu já não tinha unha mais, o sistema de segurança do meu pai era coisa de outro mundo, mas vou conseguir passar esse dinheiro que é meu por direito pra minha conta.

Preciso pagar aqueles dois e também comprar uma casa, não uma casa não, vou comprar uma cabana no fim do mundo e ninguém nunca mais vai me ver.

Senha, meu pai é péssimo em escolher senhas e isso é uma puta de uma vantagem pra mim. Tentava adivinhar a senha e mordia a minha unha ao mesmo tempo, meu coração ia sair pela boca.

- Minchia - respiro fundo quando erro pela segunda vez.

- Sono ubriaco - alguém fala no corredor e reconheço ser a voz do Kevin, pelo visto a diversão acabou cedo.

E lá vai eu ser trouxa e fazer tudo o contrário do que falei, saio do quarto me xingando mentalmente e suspiro seguindo os rastros do meu melhor amigo cachaceiro.

- Parlo molto bene italiano - ele se embola e eu reviro os olhos concordando.

Tiro as roupas dele ignorando seus protestos e quando vou tirar a cueca eu percebo o volume, não acredito que ele tá excitado. O puxo pro banheiro e ligo o chuveiro o jogando debaixo da água fria, um marmanjo desse fazendo show porque a água tá gelada.

- Por isso que seu macho tava lá agarrando outra, você é muito má - Kevin fala tremendo assim que saímos do banheiro.

- Veste essa droga e vai dormir, Kevin - entrego com muita má vontade a cueca na mão dele.

- Veja - ele mostra uma foto do Jack com uma garota ruiva - Eles vão pro motel.

Meus olhos enchem de lágrimas, mas não me permito chorar, deito o Kevin na cama e apago a luz o cobrindo.

Me ama, que droga de amor é esse que ele sentia pra tá ficando com outra? É lógico que eu disse que não acreditava, mas eu sou uma idiota, só sirvo pra ser usada.

Pego uma faca na cozinha e saio da casa indo pro quintal, começo a cortar algumas plantas enquanto caminho até achar um local afastado. Tinha mato pra tudo quanto é lado e bem no centro uma pedra, me sento na pedra e fico cantarolando uma música até o ódio me dominar.

Eu já nem ligava mesmo, começo a fazer cortes em mim, mas não é o suficiente, fico de pé e começo a bater em uma árvore dando socos e chutes sem me importar com a dor.

Cansada e machucada, solto um grito alto caindo e atravessando a faca no chão, sem forças pra me levantar eu me permito chorar.

Adormeço em meio a dor e inúmeras feridas, amanhã não vou me lembrar de nada disso mesmo.

Dou um sorriso amargo e deixo a imensidão da noite me engolir.

♤♤♤

Tradução das palavras ditas em italiano:

Minchia -- Caralho
Sono ubriaco -- Estou bêbado
Parlo molto bene italiano -- Eu falo muito bem italiano

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