De Novo Não

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CAPÍTULO NOVE

A G N E S • H E R N A N D É Z

A única coisa que faço bem
é me destruir...

Sentia vontade de morrer cada vez que eu abria os olhos, parecia que estavam martelando a minha cabeça, uma dor tão infernal que não aguentei e comecei a chorar.

Estava sozinha em um lugar onde acredito ser a enfermaria, me lembro de tudo, inclusive Nicolas me deixando aqui e sendo expulso pela enfermeira, ele não queria sair.

Depois de um tempo chorando em silêncio eu achei melhor levantar e procurar um remédio, vejo vários comprimidos em uma estante e começo a procurar um que sirva pra dor.

Não tem ninguém aqui...

Pego vários remédios e guardo no bolso da minha blusa de frio, vejo uma caixinha preta e pego curiosa, quando estava pronta pra abrir alguém bate na porta me assustando e eu guardo a caixinha no bolso sem nem pensar duas vezes.

- Que bom que está de pé, fiquei preocupada - Micheline fala e eu dou um sorriso meio sem graça.

- Sra. Fiore liberou você de todas as atividades, pode descansar até amanhã - só então percebo que tinha passado a noite aqui na enfermaria.

- Nicolas? - pergunto saindo de perto da estante de medicamentos.

- O Nicolas está pintando, é um hobby dele e aqui fazemos o possível pra pessoa se sentir bem - ela sorri e eu vejo que não é tão sincera.

- Por que a Sra. Fiore nunca mostrou o rosto? E o Sr. Fiore existe? Ele nunca se pronunciou, pelo menos não pra mim - sabia que não ia ter respostas, mas quem não arrisca nunca irá saber né.

- Tem muita coisa que é melhor você não saber criança, muita coisa - Micheline abre a porta e eu saio pensativa.

Todos nós temos segredos, isso é fato, e não cabe a mim querer saber o dos outros. Mas que realmente me intriga o fato de sermos controlados por pessoas que não sabemos quem são, isso eu não posso negar.

O caminho até o meu quarto é silencioso, Micheline estava pensativa e eu novamente a observava, cada dia me convenço de que ela não está aqui por que quer.

- Por que o Nicolas não tem um tutor? - pergunto e ela para me olhando no fundo dos olhos - Por que eu tenho vantagens que eles não tem? - ela me olha mas não responde.


- Não sei por que reclama - ela abre a porta mas não entra.

- Não reclamo, só queria saber mesmo - dou de ombros e entro no meu quarto.

Assim que Micheline fecha a porta eu corro pro banheiro. Coloco todos os remédios e a caixinha na pia, tiro minha roupa e jogo no chão caminhando pro box, eu precisava de um banho... Um longo banho.

Ter feito amizade com Nicolas nesse lugar foi um grande avanço, só não sei quanto tempo demorará pra ele se soltar com as outras pessoas e começar a me deixar de lado.

Ignoro esses pensamentos e entro debaixo da água fria, nunca gostei de banhos quentes, na verdade eu não me lembro de ter tomado algum banho em que a água era aquecida.

Passo a mão no meu cabelo e sinto ele todo embaraçado, vou ficar uma vida desembaraçando ele, melhor começar logo.

Sinto uma tontura e encosto as mãos no vidro do box, fecho os olhos pra ver se passava, assim que os abro vejo vultos em minha frente.

- De novo não - sussurro me jogando no chão.

A água caia sobre mim enquanto eu chorava desesperada, várias vozes sussurrando ao mesmo tempo dentro de minha cabeça e eu não conseguia controlar... Eu nunca consegui.

Depois de um tempo percebo que adormeci, levanto cambaleante e já não tinha vultos nem vozes nenhuma. Respiro aliviada e desligo o chuveiro, dessa vez nada de ruim aconteceu.

Havia marcas roxas em meus braços, pernas e barriga, sem saber o que aconteceu eu me enrolo na toalha e vejo um lugar escondido do banheiro pra guardar o que peguei na enfermaria.

Termino de guardar tudo e dou um sorriso, ninguém nunca vai encontrar. Nunca fui boa em guardar coisas, mas dessa vez até que me superei, se bem que só Micheline entra no meu quarto então não preciso me preocupar.

Me olho no espelho e passo creme no cabelo que precisava ser cuidado, o que estou pensando? Não cuido nem de mim, quem dirá do meu cabelo, nunca me preocupei com isso e nem nunca tive motivos.

Eu até me considero uma garota bonita, loira igual mamãe, porém os cabelos dela era maior, batia na cintura e ela cuidava toda semana, eu achava lindo.

Meus olhos são do mesmo azul que os de papai, mas os deles eram mais intensos, expressivos, os meus nunca tiveram vida, sempre ofuscados pela dor.

Saio do banheiro me segurando pra não me atormentar com minhas lembranças, tenho que esquecer meu passado mas como fazer isso? Será que é possível esquecer uma vida inteira de dores? Espero que um dia consiga.

- Agnes - escuto aquela voz fria capaz de trazer a tona todos os demônios que fui capaz de esconder durante esse tempo.

- Papai - sussurro sentindo uma dor no peito.

- Stai sempre bella* - ele se aproxima de mim e eu sinto o meu corpo amolecer.

Meu pai passa as mãos em meus cabelos e eu fecho os olhos parando de respirar, de novo não, dessa vez não.

♤♤♤

Tradução das palavras ditas em italiano:

Stai sempre bella -- Você está sempre bela.

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