4- Passado

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Eijiro acompanhou Fumikage até a cozinha, assim ambos poderiam socorrer Midoriya caso este acordasse de supetão. A faceta do garoto não era das melhores, e Kirishima ficava cada vez mais apreensivo.

— Você é o primeiro editor a aguentar tanto tempo – cruzou os braços —, eu conversei com Uraraka sobre, e creio que você seja o melhor para perceber as coisas em sua volta.

— Hm, como assim? Pensei que Ochaco já havia me informado tudo o que fosse necessário para minha estadia...

— Nem ela possui conhecimento de todos os problemas de Izu... – colocou as mãos sobre as têmporas, as massageando. — Os únicos que sabem sobre algo é minha noiva e eu. Então, estarei confiando em você para ajudá-lo.

— Ajudá-lo? Mas, mas... eu pensei que já fazia isso... – viu Tokoyami balançar a cabeça, negando.

— Uraraka lhe informou o básico do básico – estalou a língua. — Kirishima, eu sei tudo o que acontece nessa casa... Eu e Deku conversamos todos os dias por mensagem.

Aquilo acabou pegando Eijiro; se sentia especial por saber mais sobre o ídolo, contudo, pelo rosto que o maior fazia, parecia que não era algo bom de se saber ou coisa do gênero.

— Hoje é o início da semana de aniversário da morte da mãe de Izu... – Kirishima colocou a mão sobre a boca que formava um belo 'o'. — Ela... cometeu suicídio na frente dele. Por isso ele tem alguns surtos e precisa de terapia. Todos os nossos amigos o abandonaram, julgando-o ser louco. Ninguém aguenta ficar ao lado de uma pessoa que precisa de apoio, não é? – falou baixo, soltando uma risada irônica. — Apenas minha noiva e eu ficamos, e, pode acreditar, foram os piores anos de nossas vidas. Não porque tínhamos que cuidar do pequeninho, mas sim porque vê-lo mal nos machucava. Aliás, uma curiosidade aleatória: foi ele quem nos juntou.

— Q-Quando foi isso? – perguntou, apreensivo.

— Quando ele tinha 13 anos. E, por causa dos traumas, ele acabou desenvolvendo duas síndromes: a de Asperger que o dificulta de socializar e se comunicar com eficiência e a de pânico. Essa ele melhorou bastante de um tempo para cá, mas durante essa semana, ela acaba entrando no ápice.

— E o pai dele?

— Ele morreu indo ver Midoriya no nascimento. Possivelmente isso afetou a mente da mãe dele... – falou com o cenho franzido.

— O que acontece se ele ficar sozinho? – foi até o fogão preparar um chá para que ambos bebessem.

— Uh, ele tenta se matar – puxou uma cadeira e se sentou. — Inclusive, um dos "ataques" dele já aconteceu em minha frente. E isso era quando eu era mais presente na vida dele – suspirou, apoiando a cabeça nas mãos. — Contudo, os anos foram passando e daqui seis meses eu irei me casar. Pretendo construir uma família, mas tenho medo de me afastar e, sabe... Enfim. Eu amo Izu como um irmão menor.

— Então você quer minha ajuda para isso, certo? – colocou uma xícara na frente de Tokoyami e puxou uma cadeira para se sentar também, bebericando o próprio líquido adocicado. — Eu não posso nem me aproximar dele direito.

— Sabia que ele fala bem de você todos os dias para mim? – sorriu de leve, vendo o espanto na cara do garoto. — Ele gosta de você, mas por conta da síndrome ele acaba sendo ignorante para afastar possíveis abandonos. Ele me liga chorando todas as noites com medo de ter sido muito babaca e você nunca mais voltar – bebeu um pouco do chá, fazendo uma careta em seguida.

Começou a batucar os dedos sobre a mesa; tinha muitas coisas que Deku lhe falava que lhe deixava com vontade de pedir demissão e sair correndo chorando de tão doloroso que era. Todavia, entendia que ele era uma pessoa que sofreu o suficiente para usar àquele recurso como escapa.

— Izu precisa de um amigo ao seu lado e você convive com ele todos os dias. A minha esposa é psicóloga, mas como Midoriya tem uma péssima lembrança com essa profissão, ele sente que ela irá tentar o persuadir para começar uma terapia. Então eu acabo fazendo isso indiretamente por ela... Eu e Tsuyu presamos pela melhora do nosso pequeno – falou abrindo um sorriso gentil. — Gostaríamos que ele fosse nosso padrinho, mesmo que fosse impossível. Por isso lhe peço ajuda.

— Sua noiva não sente ciúme? – perguntou.

— Asui é bem compreensiva. Assim como eu, ela também considera Izu demais, contudo sempre que fala algo sobre sua profissão, o pequeno começa a ignorar, então ela evita o possível – revirou os olhos e suspirou. — Não estou pedindo para que fique o resto da sua vida com ele, entretanto mesmo você estando a pouco tempo aqui, já fez tanta coisa! Eu só quero que ajude ele, e, com certeza, poderá contar comigo se resolver aceitar.

— É uma responsabilidade tão grande, não sei se vou conseguir fazer tudo corretamente, mas farei o possível para vê-lo bem!! – sorriu mostrando os dentes brancos. — Eu devo muito a ele também. Se não fosse pelas obras espetaculares, eu provavelmente estaria morto agora – viu o mais velho soltar o ar, relaxado. — Pode contar comigo para o que der e vier.

— Você não sabe o quão feliz me deixa ao ouvir isso... – encarava Kirishima que batucava freneticamente os dedos na mesa.

— Aliás, posso fazer algumas perguntas? – viu Fumikage concordar com a cabeça. — Desde quando você e Ochaco o conhecem?

— Nossos pais eram amigos, então nos conhecemos desde o primário – bebeu outro gole do chá, este que já estava gelado. — O pai de Midoriya era o principal escritor da empresa do pai de Ura e minha mãe a advogada que cuidava da parte burocrática.

Kirishima prestava a atenção devidamente, sem atrapalhar o outro, que assim continuou:

— Quando entramos no ensino fundamental, Ochaco foi para uma escola particular e Izu e eu para uma pública, então nunca mais nos vimos – parou para buscar ar. — Até a adolescência. Ela sempre foi muito mandona, mas nunca ganhava de Izu.

— E quando a mãe dele... sabe...? – perguntou enquanto ia esquentar o próprio chá.

— Ele não tem nenhum outro parente, e pela antiga amizade, a minha mãe e o pai de Uraraka conseguiram a guarda dele para que não fosse para um orfanato. Como você pode imaginar, o choque foi muito grande então ele vivia indo em diferentes médicos... – suspirou. — Ele teve tantas melhoras e recaídas que os médicos chegaram a lhe considerar louco e lhe internaram em uma clínica psiquiátrica. O que resultou, claro, em outros traumas.

Kirishima sentiu seus olhos marejarem só por saber do passado do ídolo.

— P-Por que ele começou a escrever...? – perguntou.

— Ele sempre escreveu, mas era só um passatempo – disse olhando nos olhos do mais novo. — Quando tinha 15 anos, a psicóloga sugeriu que levasse suas obras à uma editoria e foi o que fez assim que conversou com Ochaco, esta que foi rapidamente entregar os manuscritos de Deku para o pai. A primeira obra dele foi terminada aos doze anos, e óbvio que o enredo foi se aprimorando, o que lhe levou a ganhar seu primeiro prêmio. Foi então que ele se agarrou a escrita, suas obras mais tristes foram escritas durante suas recaídas, ele transmitia aos personagens tudo o que sentia, duvido achar alguém que leu uma daquelas obras que não chorou.

— Confesso que tem algumas que eu nem me atrevo a ler...

— Você quer me contar sobre aquilo que me disse? Sobre o Izu lhe salvar – sorriu.

— Ugh, claro – fez uma faceta de dor. — Eu sofria bullying na escola. Me batiam na hora da saída, e por eu não ter os melhores pais do mundo, ficou por isso mesmo. Eles só serviam para dizer que eu era um inútil – fez uma pausa. — Eu já estava cogitando suicídio – riu fraco. — Mas aí eu saí para ler, e, ironicamente, encontrei uma novel do Deku e a frase que o protagonista disse, se fundiu em mim...

— Qual frase? – Tokoyami perguntou, interessado.

- "Por mais que tudo pareça perdido, eu continuarei vivendo e lutando, em busca da minha luz." – recitou. — Desde aquele dia, Deku salvou minha vida.

Os dois continuaram conversando sobre tudo e Midoriya passou o resto do dia escrevendo.

Meu estranho editorOnde histórias criam vida. Descubra agora