Cap. 12 - Limbo

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Ele acordou nu em um deserto de areia cinza e céu escuro. Não havia estrela alguma. Ele sentou de pernas cruzadas, sentia a pele e o testículo em contato com a areia fria. No seus arredores apenas o vazio, o horizonte negro mostrava algumas dunas, altas, baixas, mas apenas isso. Não havia árvores, não havia nada. Ele levantou sentindo o ar morno e lento, mais como um bafo do que como uma brisa. Sabia onde estava, já esteve ali antes. Girou um pouco e escolheu uma direção aleatória, começando a caminhar.

Não esperava encontrar alguma coisa, só não ficaria parado. Estava consciente do ritual que havia feito com Loche e do banimento da criatura infernal, mas estando ali duvidava de que havia dado certo. Passava mal cada dia mais e agora nem mesmo se lembrava de onde estava, e na realidade, parecia bem acordado. Parou, mechou os dedos, sentiu a areia fria entre eles, os grãos incomodando abaixo da unha. Se beliscou e sentiu a dor latejando em sua barriga. Real ou não, voltou a caminhar

...

Já havia mais de dez horas de caminhada, seu corpo não cansava, mas sua mente parecia exausta. Foi então que ouviu um grito de dor alto e estridente. Correu na direção, sabendo que deveria fugir daquilo, mas até o perigo era melhor que todo aquele vazio. Saltou por cima de uma pequena duna trapaceira, era bem maior do outro lado e desceu em passos longos até tropeçar e cair, rolando o restante do caminho. Levantou e viu a fonte dos gritos, Dianta estava abocanhando um bebê gigante, de quase um metro, e balançava como um cachorro, o sangue que escorria da criatura respingava pela areia quando ela tentava rasga-lo ao meio. Ele foi gritando e balançando os braços até ela, como se espantasse um animal selvagem. Dianta largou aquele ser e fugiu entre as dunas rindo, ela estava nua e imunda de sangue e areia.

Quando se aproximou, aquilo começou a levantar. Era melhor descrito como um feto de um metro, a pele toda vermelha com regiões cobertas de sangue, a pele fina permitia ver seus órgãos internos como manchas azuladas. Seus olhos eram bolotas pretas úmidas e tinha até mesmo uma espécie de rabo onde a coluna terminava, era totalmente ausente de pelo, e o rasgo que Dianta fez estava em suas costas, sangrando e escorrendo pelas pernas tortas.

Edgar o olhava com curiosidade ao invés de medo. Alguma coisa naquela criatura, por mais bizarro que fosse, era familiar a ele, mas mesmo que se esforçasse não sabia dizer o que era.

- Você está bem? Aquela diaba te pegou de jeito.

- Estou bem. - O feto gigante se levantou com dificuldade e, ao que parece, sorriu. - Vai passar.

Edgar olhou ao redor procurando Dianta, mas ela não estava mais ali, havia fugido sabe lá para onde.

- Você vai lá agora?

- Oi?

- Vai para o próximo nível - o feto apontou para baixo - lá onde elas estão?

- Quero distância delas. Você sabe onde estou?

O feto caminhou para o lado de Edgar deixando um rastro de sangue na areia cinza. Ele imitou o gesto de Edgar de olhar ao redor e respondeu com sua voz esganiçada.

- Aqui é o limbo. O primeiro dos muitos círculos do inferno. Você não vai conseguir ficar aqui por muito tempo, você vai acabar indo para o próximo círculo.

- Inferno... - Edgar deu de ombros e sentou de pernas cruzadas. Era estranha a sensação da areia fria em suas nádegas nuas. Fez uma careta e continuou - Eu já estive aqui antes, e é meio frio para ser o inferno, não?

- Ah é. - O feto tinha o mesmo tamanho de Edgar sentado. - Mas aqui é mais como... A favela do paraíso. Aqui tem muita gente boa, sabe, de verdade mesmo, mas... explicaram errado para nós, você aprende aqui, você vai onde tem mais afinidade, é uma questão de ressonância e vibração, não de ser bom ou mal. Claro que se você for bom, provavelmente vai parar em alguns dos céus ou aqui no Limbo, talvez no purgatório... depende.

A Flor NefastaOnde histórias criam vida. Descubra agora