Cap. 14 - Momentum

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Edgar bebia tranquilamente uma cerveja gelada enquanto assistia a um show antigo do Scorpions, uma imagem velha e desbotada na TV, ainda assim a melhor remasterização que conseguiram. Still loving you era cantada pelo vocalista de forma quase apaixonada, mas seu jeito cansado deixava o show um pouco lento. Loche insistiu que se encontrassem, mas ele quis ficar sozinho essa noite, recuperando um pouco de sua realidade, tomando os momentos banais para si como uma vitamina que o mantinha vivo. Quando Ariel chegou, sorriu ao ver ele ali sentado, aparentemente bem e tranquilo, como costumava ficar, como se nada tivesse acontecido.

- Oi Edgar.

Ele olhou por cima do ombro e a viu, estava cansada, olhos fundos, cabelo preso com fios que se soltavam sem querer, longos e dourados brilhando à luz amarelada da sala. O uniforme com manchas de suor abaixo do braço e a maquiagem um pouco descuidada. O mais curioso, contudo, era uma esfera de carne do tamanho de uma bola de futebol que orbitava ao redor de sua cabeça, ela possuía um único e grande olho de pupila em forma de fenda, vertical e de Iris cor de rosa como uma ferida recente. Ele fechou os olhos com força e os abriu novamente, agora a bola girava e uma pequena protuberância brotava de sua superfície e dela, uma língua fina e rosa como a de um tamanduá lambeu a cabeça de Ariel e se recolheu, continuando a órbita grotesca ao seu redor. Escondeu a surpresa e o medo o máximo possível, sabia que ela não fazia a menor ideia que aquela coisa estava ali e, até o momento, poderia não passar de uma alucinação.

- Está tudo bem? Como você está se sentindo?

- Estou melhor. – Seu olhar acompanhava a bola de carne escura circulando sua cabeça como um urubu. – Acredito que estou melhor, ao menos estou acordado.

Ariel pegou a garrafa da sua mão e deu um gole, e mais uma vez uma protuberância apareceu no globo e a língua se estendeu, lambendo sua testa. Ela sentou ao seu lado e largou os olhos na televisão, soltando os ombros e relaxando o corpo. O show continuava, simples e sem animação. Edgar se afastou um pouco para que a bola não o tocasse, ela torceu o lábio quando ele fez isso, mas não reclamou.

- O que o médico falou?

- Um monte de abobrinha, me receitou uns remédios e ficou por isso mesmo. – Suspirou e a olhou, o reflexo da televisão em seus olhos. -Pelo que eu entendi meu corpo não estava conseguindo descansar, aí ele desligou para não morrer, poupar a bateria sabe? Aí fui medicado e estou aqui.

Edgar notou que Ariel pressionava uma mandíbula na outra, tencionando os músculos da bochecha e do rosto. Seu lábio tremeu um momento, ia dizer algo, engoliu algumas vezes a seco, mas nada disse, preferindo afogar aquelas palavras em um longo gole de cerveja. Edgar pegou a garrafa de volta e a terminou, deixando-a no chão.

- Aconteceu alguma coisa nesses dias que passei fora?

- Conheci sua namorada, Loche. – Ariel suspirou e sorriu. – Todos achamos que iríamos... que você não ia conseguir. O médico chegou a falar isso, sabe, daquele jeito que médicos falam "o prognóstico não é bom, e se vocês quiserem se... "

Ariel não conseguiu continuar, colocou as duas mãos no rosto e chorou. A bola de carne agora gerou tantos tentáculos que ele nem mesmo conseguiu contar, e todos lambiam o rosto dela e suas lágrimas. Edgar respirou fundo e tomou coragem para abraçá-la. Ela deixou por um momento, mas depois o empurrou com força e se levantou, correndo para seu quarto e batendo a porta. Edgar fez menção em se levantar, mas a súcubo que agora estava com ele brotou de sua própria sombra e segurou seu ombro, o mantendo no sofá.

- Você vai fazer agora o que eu mandar. E você precisa prestar bastante atenção. Ariel está com uma larva, aquela bola. Ela vai atrapalhar nossos planos se ela continuar ali se alimentando. Você vai comprar flores, chocolates, vai elogiar ela amanhã pela manhã e fazer o café, vai tratá-la bem e dizer que Loche não é sua namorada. Ela não vai conseguir se livrar dessa larva sozinha.

A Flor NefastaOnde histórias criam vida. Descubra agora