Cap 17 - Miasma

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Nas primeiras vinte e quatro horas, Edgar não pensou muito no ritual, ou no que acontecia no momento em sua vida. Logo pela manhã tomou café sentado no sofá, de short e regata, sentindo-se cada dia mais recuperado de seu cansaço anormal. Ariel ainda questionou o que era aquela coisa pendurada na parede da sala, e ele apenas respondeu que era um presente de Loche, afinal, só precisaria exaltar o nome de Orobas se seu pedido fosse realizado.

Na noite daquele dia recebeu Loche e a atualizou do acontecido, explicou como aconteceu, mas ao explicar, alguns detalhes o escapavam, como se tentasse recordar um sonho assim que acordasse. Loche ouvia tudo com atenção acadêmica, e quando a conversa finalmente acabou, ela juntou seu celular, sua carteira de cigarros e a chave de casa. Quando fez menção de ir embora, Egdar segurou sua mão sorrindo, e a convidou para, sei lá, quem sabe assistir um filme ou só ficar de bobeira no sofá.

Aquilo para Loche era um pouco mais do que imaginava para aquele relacionamento, não se via compartilhando momentos com Edgar, momentos como aquele eram para casais, namorados que apreciavam a companhia um do outro apenas pelo simples motivo de estarem ali, juntos, independente do que estavam fazendo. Loche teve vontade de saltar nos braços daquele cara de short e regata, mas de barba feita e de perfume amadeirado. Teve vontade de abraçá-lo e dizer "claro, com certeza". Mas tudo que fez foi guardar o celular no bolso e a carteira de cigarros, e dizer um simples "fica para a próxima".

Já na rua, chutando pedrinhas com o All-star e um cigarro queimando na boca como um incenso, Loche maldizia Edgar por ser tão, tão... Prepotente ao ponto de convidar ela para, "sei lá, quem sabe assistir um filme". Isso era o que namorados faziam, e não eles. Eles eram companheiros, parceiros ritualísticos se você quisesse um rótulo.

Filho de uma puta. Atirou a guimba de cigarro e a amassou com força, esmagando embaixo dos seus pés como um verme.

...

As 48 horas foram diferentes. Logo pela manhã sentiu fortemente a presença de alguém em seu quarto. Havia uma pressão em sua cabeça e um peso fora do normal em seus ombros, além disso, tinha aquela sensação gozada no meio da testa, acima e entre os olhos, como se alguém colocasse o dedo sem tocá-lo em sua testa. Aquilo o incomodou, e procurou nas sombras olhos amarelos ou coisa do tipo, mas não havia nada, apenas a penumbra matinal e os sons na cozinha de uma Ariel "prendada" fazendo o café da manhã. Ainda chegou a perguntar em voz alta quem estava ali, mas não houve resposta. Era diferente, não era Adrastia, alguma lilim ou súcubos, nem mesmo Orobas. No final, deu de ombros e deixou como estava, não tinha o que fazer ali naquele momento.

No almoço foi agraciado com duas coisas, uma foi um convite de Hermes para um churrasco que faria a noite, "só para amigos mesmo", mas que sabia que ia lotar de gente, como sempre. E a segunda foi um almoço realmente muito bom feito por Ariel, mais uma macarronada, mas de atum acebolado com molho branco. Um pequeno momento de normalidade e de prazer rotineiro em sua vida.

Decidiu pela parte da tarde que iria a festinha de Hermes, mas não convidou ninguém, nem Loche, nem ninguém. Iria sozinho, tranquilo, sem esquentar a cabeça com nada.

- Com nada, claro.

E Adrastia já estava do lado dele. Ariel estava no quarto se preparando para ir trabalhar, e ele estava no seu próprio quarto, as mãos na cintura olhando o nada. Ela apareceu como uma nuvem espessa de piche que logo se solidificou naquela figura esguia e de ombros largos. O rabo balançava para cá e para lá, as mãos na cintura como as dele e os olhos amarelo brilhando na leve penumbra do entardecer.

- Há muitas coisas com que esquentar a cabeça. – Adrastia jogou as mãos para trás do corpo e dançou de um lado para outro sem sair do lugar. – Podemos começar com o fato de você ter ido ao inferno, de eu estar aqui, de você ter feito um ritual satânico, de você estar predestinado ao inferno, de Ariel estar estranha... Notou que ela está um pouco estranha desde, você sabe... – e fez um sinal com a mão, enfiando o indicador em um "o" na outra mão.

A Flor NefastaOnde histórias criam vida. Descubra agora