Monique, a prima

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O tédio é perigoso.

Já dizia aquele dito popular, "mente ociosa, oficina do capeta", e isso não podia ser mais verdade as onze da noite, com algumas latas de cerveja na cara, em uma festa de família extremamente entediante onde a maior atração era o tio Afonso, gordo e suado, dançando os maiores hits dos anos noventa. Era engraçado, isso ninguém podia negar, e os outros tios e tias entravam na brincadeira a medida que o álcool subia a cabeça. Para a maioria ali, isso parecia divertido, nada mal para uma reunião de família, mas não para os mais jovens, e isso inclui os primos de vinte a quase trinta, enquanto a criançada corria ao redor da piscina esperando os adultos ficarem embriagados o suficiente para mergulharem lá, melhor ainda se um desses adultos der o primeiro pulo.

Edgar passou a mão na testa oleosa e limpou na calça jeans, uma das mais caras que tinha, e ajeitou a camisa social branca. Mais parecia um garçom, e não um gerente, mas quem ele queria enganar, era apenas um gerente de um fast food meia boca, não era nem mesmo uma franquia multinacional. Pensou que poderia arranjar alguma coisa hoje, alguma mulher, nem que fosse uma prima, já diziam seus amigos, "prima não é parente, é presente." Esse pensamento era perigoso, mas ele não se importava muito, não quando não conseguia parar de olhar para sua prima preferida, Monique, que estava sentada no balcão que dividia a cozinha americana, sozinha com sua roupa gótica justa ao corpo e seu decote visivelmente atrativo. Ouviu um dos tios ainda zoar que ela parecia uma vaca, mas referia-se apenas aos seios, não ao corpo. Ou talvez a personalidade? Edgar e Monique já se conheciam de muito tempo atrás, eram crianças na época e Monique não apresentava nem um terço do corpo de mulher que tinha hoje, mas ele já se afeiçoava pela garotinha de personalidade esquisita.

"Um dia eu vou ressuscitar um bicho, você vai ver. É só convencer o demônio certo." Isso lhe rendeu inúmeras visitas a psicólogos e psiquiatras, ela só tinha 10 anos na época, não é uma idade em que a criança deveria imaginar esse tipo de coisa. Mas e quem se importa com o que aconteceu a quinze anos atrás, a hora era agora, Edgar havia terminado com a namorada a pouco mais de um mês e da última vez que checou nas redes sociais, aquela Monique estava solteira, deveras, quem arriscaria? Mas sempre ficava ali olhando aquela mulher gótica, com suas fotos sensuais, rosto fino com pó branco demais e aqueles olhos amarelos, uma leve heterocromia entre verde e castanho claro.

"Ela vai arrancar seu pinto fora". Uma voz lhe advertiu na cabeça, era de um dos seus amigos, Hermes, o mais falastrão, mas estava próximo da meia noite, já havia bebido o suficiente para lidar com uma menina com algumas neuroses, mas por precaução, a caminho do balcão, tomou duas doses de coragem liquida, também conhecida como tequila.

Ela estava ali, sozinha, tomando absinto em uma taça chique, com detalhes dourados e de cristal. Imaginava se ela tinha trazido a taça de casa, quanta soberba. Agora entendia porque era sozinha. Mesmo assim, sentou no banco em frente a ela, pousou a caneca de cerveja que trouxe com certo desastre, fazendo a espuma escorrer do copo e molhar o balcão. Ele não se importou, e talvez nem tenha notado, mas os olhos de Monique escorreram para aquilo, lhe arrancando um suspiro de tédio.

- Festa de família, hein? – Edgar começou com um sorriso inebriado no rosto. – O que mais falta aqui, um barraco?

- Na verdade... – Monique olhou para os lados e sorriu para Edgar, o que pareceu um sorriso sedutor, mas poderia ser deboche da mesma forma. – Só está faltando primo pegando prima, barraco já teve.

Frio na barriga, estava certo o que ouviu? Parece que sim.

- Ah, mas isso nós podemos arranjar.

Monique revirou os olhos e tomou um gole do seu absinto.

- Quantas dessas você já bebeu, Edgar? - Ela passou os dedos na taça de cristal, acompanhando o movimento com os olhos. – Eu sei que você curte umas fotos minhas de vez em quando.

A Flor NefastaOnde histórias criam vida. Descubra agora