Capítulo 6

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Ouvi passos vindo em nossa direção e tive que parar no mesmo instante. Escondemos o rosto uma na outra até que uma moça passasse por nós.

- Tenho que ir, é tarde. — Eu não disse nada e ela virou caminhando alguns passos.— Quer que te leve até em casa ou você tem como voltar que não seja em um táxi? — Sorri tirando uma tensão que iniciava.

- Vou trocar de roupa. Você vem?

- Não. Melhor não. Te espero no estacionamento, não demore muito, sim?

Alícia saiu e eu fui ao camarim. Me olhava no espelho sem acreditar no que tinha acabado de fazer. Não só beijei uma mulher, essa mulher era a minha psicóloga e eu a desejei com toda minha alma! Eu realmente estava louca. Busquei meu celular onde havia uma mensagem de Clara.

• Fui ao camarim, te liguei mas não atendeu. Saí com um boy do curso, acho que não dá em nada mas ele é divertido. Te vejo amanhã e cuidado.

Troquei de roupa com rapidez sem deixar de pensar no que viria. Na verdade, só essa atitude em me perguntar como voltava para casa, já me surpreendeu. Que diferente era com uma mulher e principalmente uma mulher madura como ela. Saí de calça, uma blusa e minha jaqueta. Minha mochila parecia ainda mais pesada. Quando cheguei no estacionamento, vi o carro de Alícia já ligado e ela no celular.

- Demorei?

- Não muito. Você vai direto ou...

- Não. Direto.

Ela ligou o som em uma rádio com músicas estilo anos sessenta. Achei ideal para a madrugada congelante.

- Obrigada por ter vindo. De verdade. — Ela só me olhou rapidamente e sorriu.

Um pouco de silêncio em nossas falas e não tardamos em chegar.

- Chegamos. Sua casa tá escura.

- É que a minha mãe viajou. — Eu nunca havia visto tanta confusão no olhar dela. — Quer entrar? — Acho que piorei isso.

- A linha tênue entre o querer e poder... Ficarei aguardando daqui até você entrar.

- Fique bem, Alicia. Outra vez, obrigada por hoje. — Eu ia saindo e ela me segurou.

- Caroline, você sabe que eu sou...

- Não, Alicia... Por favor, hoje não. Boa noite.

Falei em um tom carinhoso. Não precisava ser muito inteligente para saber o que vinha dos seus lábios e eu sabia. Quis encerrar aquela noite ali, sem uma conversa onde sabia no que daria. Quando somente fechei a porta, vi Alícia indo embora. Me sentia um pouco enjoada, talvez fosse fome. Busquei um bolo que minha mãe havia feito. A cena do meu beijo naquela boate não saía da minha cabeça, parecia um filme onde apenas uma cena era voltada uma e outra vez.

A noite pareceu ainda mais curta. Eu pouco dormi, seguia sem acreditar que aquilo tinha acontecido. Tentei não formular rótulos sobre mim, isso agora era o de menos. Minha mãe voltou cedo de viagem e claro, quis que eu contasse tudo a ela. Contei até onde pude. Imagina dizer: "mãe, nem sabe, eu e Alícia, sabe, minha psicóloga... Nós nos beijamos." Sentia palpitações só em lembrar dos seus olhos cheios de intensidade sobre mim.

Depois de almoçar com ela, passei o resto do dia com meu pai. O dia foi tranquilo mas o suficiente para evitar pensar mais em Alícia. Confesso um receio em vê-la. Não por imaginar o que vai dizer, mas sim das nossas consultas. Não queria perde-la como psicóloga também.

Quando a semana começou, eu estava ainda mais cheia de trabalho. Era final de ano e na agência minha mãe precisava de mim. Haveria um jantar  beneficente com um desfile onde haveriam alguns famosos. Não era exatamente minha paixão fotografar desfile. No início da tarde, recebi a ligação que Alícia não poderia ir. Segundo sua assistente, aconteceu um imprevisto e ela não poderia estar. Inevitavelmente pensei que poderia ter sido pelo que aconteceu na boate mas não... Ou será que sim? A noite então resolvi jantar com Jack e Luna.

Décimo nono andarOnde histórias criam vida. Descubra agora