Capítulo 15 _ Sinapses do amor

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Após sair do trabalho à noite, decidi jantar sozinha em um restaurante no centro. Precisava refletir sobre tudo que estava acontecendo na minha vida. Afinal, junto com a minha caótica situação amorosa, estava também a profissional. O vigésimo sexto encontro de neurologia brasileira estava aproximando e eu era inevitavelmente obrigada à ir. Óbvio que o fato do evento ser no nordeste me deixava ligeiramente animada, afinal, eu amava com devoção àquelas praias maravilhosas, e consequentemente era sempre bom me manter atualizada no meu contexto profissional.

Enquanto eu pedia a conta notei um casal apaixonado sentado no canto do restaurante. Por um segundo os invejei em silêncio, desejando poder estar no lugar da moça que recebia calorosos e atrevidos beijos em público.

A que ponto eu havia chegado, Senhor?

Então o garçom finalmente trouxe a conta e após pagar, decidi ir até o banheiro. Ao passar pelo casal que me despertara inveja, notei uma pequena e confusa familiaridade. Ao voltar do banheiro notei os dois de mãos dadas, e então sem aviso prévio a moça me olhou quase fazendo meu queixo cair no chão.

— Camile? — Perguntei perplexa e ela arregalou os olhos.

— Doutora... Não... Não é o que você está pensando. — Ela levantou abruptamente e o homem que a acompanhava me olhou alarmado. Eu também já tinha visto ele no hospital, provavelmente Romeu o conhecia.

— E o que você acha que estou pensando? — Questionei irritada e ela sorriu nervosa.

— Eu... É que o Paulo é meu amigo... Eu não via ele à muito tempo... E por isso... — Tentou justificar atrapalhada e eu cruzei os braços. — Nós não... Eu... Por favor, não conte nada ao Romeu.

— Se você não o ama porque raios não termina logo?

— Terminar com um homem que acordou de um coma e está desmemoriado? — Ela rebateu balançando a cabeça. — Não dá, por mais que eu queira não posso deixá-lo agora.

— E vai se casar com ele então? — Questionei inconformada e ela me olhou incerta.

— Eu... Não sei o que fazer. Minha família e a família dele estão me pressionando...

— Conte a verdade à todos. — Exigi e ela abaixou a cabeça.

— Eu não posso. Essa história é mais complicada do que você imagina. — Murmurou cabisbaixa.

— O que tem de complicado? Você não o ama mais e não quer se casar. Pronto. Resumo perfeito e que abrange todo o necessário. — Afirmei e ela me olhou com os olhos cheios de lágrimas.

— Não é só isso. Por favor, você não entende. Não diga nada. — Choramingou e de repente correu para o banheiro me deixando confusa com sua reação.

Aproveitei a deixa e fui para o estacionamento. Minha mente fervilhava, eu não devia e não podia me intrometer nessa história, entretanto essa informação era tudo que Romeu precisava para se livrar finalmente do casamento.

Liguei para Romeu e ele me passou o endereço de onde estava. Dirigi para o local ainda sem saber se deveria abordar o assunto ou não.

Durante muito tempo era suposto que o ser humano possuía cem milhões de neurônios, entretanto era um número apenas aproximado. Após uma confirmação científica de um estudo feito por uma equipe brasileira, descobriu-se que na verdade temos oitenta e seis milhões de neurônios. Bem menos do que imaginávamos e bem mais do que parece quando estamos apaixonados. Não que eu estivesse apaixonada por Romeu, mas era fato que eu já não raciocinava com tanta clareza desde o dia que havia conhecido ele.

Estacionei na frente de um prédio e segui para o mesmo, tentando preparar meu psicológico para o possível encontro com os pais dele. O que eu diria para eles? Qual explicação seria sensata o suficiente para uma médica ir visitar o seu paciente que já não estava mais sob seus cuidados?

Parei na porta do elevador e respirei fundo, tentando não deixar transparecer o nervosismo. Por que de repente todos os meus oitenta e seis milhões de neurônios haviam parado de funcionar?

Hesitei mais um instante. Eu parecia uma adolescente tentando encontrar soluções miraculosas para poder ficar com o cara que eu gostava. Isso era errado em tantos níveis diferentes. Era assunto dos dois, não meu. Por que eu estava me metendo nesse assunto? Por que tinha pressa dos dois terminarem o compromisso? O que estava acontecendo comigo?

Respirei fundo mais uma vez. Eu não podia mais voltar para trás, afinal assim que as portas do elevador abriram no quinto andar do prédio, me deparei com Romeu parado no corredor. Ele tinha um sedutor sorriso nos lábios e seus olhos pareciam em dúvida quanto à minha súbita visita.

— Sentiu saudades? — Ele ironizou e eu senti meu rosto esquentar.

Só então notei o quanto eu estava parecendo ridícula ao procurar por ele após praticamente fugir do mesmo dias antes.

— Eu... Precisava falar com você. — Falei sem sair do elevador e ele me olhou curioso.

— Não precisa mais?

— É que... É um assunto delicado. — Respondi e a porta ameaçou fechar, entretanto ele impediu.

— Vamos entrar no apartamento. — Sugeriu e eu suspirei.

— Seus pais...

— Eles não estão em casa. — Falou sugestivamente me fazendo sorrir.

Eu sou uma mulher adulta. Posso lidar com isso. Não posso? – Meu cérebro lançou a questão no ar e eu pensei por um breve momento.

A porta ameaçou fechar novamente e dessa vez após impedir, Romeu entrou e puxou gentilmente a minha mão, me encorajando a seguir seus passos até o apartamento. Porém, antes de terminar de passar pela porta, não sei como ele conseguiu tão rapidamente me tomar em seus braços fortes.

— Sei que você não perguntou, mas eu senti saudades de você. — Sussurrou no meu ouvido. — Muitas saudades.

— Romeu... Eu... Vim apenas conversar com você. — Expliquei nervosa com sua proximidade e ele andou lentamente comigo ainda presa ao seu corpo, até eu sentir o sofá atrás de mim. Ele me deixou sentar e sentou ao meu lado.

Seu olhar fixo nos meus lábios me fizeram engolir em seco.

— Pode dizer então. Do que se trata?

Céus, por que mesmo eu estava ali? O assunto de repente me pareceu irrelevante ao comparar com a situação como um todo. Romeu me distraía facilmente com seu desejo nada discreto de me beijar. E eu... Eu estava prestes a interpretar a garota sem neurônio funcional algum que me cabia ser naquele momento.

Um Clichê Para JulietaOnde histórias criam vida. Descubra agora