Último capítulo

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O céu estava lindo. Azul intenso e vívido. Olhei pelo horizonte e senti o maravilhoso cheiro de terra e plantas molhadas pelo orvalho da manhã.

— É uma bela manhã para se receber alta, não acha? — O médico me perguntou lançando um sorriso amistoso e eu assenti empolgada, me afastando da janela. Apesar de não ter planos de sair do hospital de imediato. E eu estava ciente de que mesmo recebendo alta eu teria que ter alguns cuidados pelo meu pós operatório. Troquei de roupa com ajuda de uma enfermeira extremamente calada e após passar em dois quartos especiais, fui para onde meu coração pedia desde quando recobrei minha consciência. Não estava em horário de visitas, mas o médico abriu uma pequena exceção para mim.

— Oi! — Falei assim que encontrei seu olhar receoso observando o nada.

— Você está bem? — Ele perguntou preocupado e eu me sentei na cadeira ao lado da sua maca.

— Sim e você?

— Estou ótimo. Pronto para outra. — Brincou sorrindo amplamente e eu tentei evitar uma careta, desconfortável.

— Nem brinque com uma coisa dessas. — Pedi ficando séria e ele me observou atento.

— E seu pai? Já recebeu alta?

— Está para receber a qualquer momento. Está reagindo muito bem ao transplante. — Contei e ele assentiu.

— E a Helena? Teve notícias?

— Eu a visitei hoje. Está ótima, totalmente fora de riscos e sem sequela alguma. Logo também será liberada para poder ir para casa. — Respondi entusiasmada e estudei o rosto dele. Apesar de tudo parecia realmente bem. Disposto, eu diria. — Eu... Eu soube que você recobrou a memória.

— Sim. Descobri o motivo do meu primeiro acidente. Eu e Camile estávamos discutindo por telefone quando ela me confidenciou que estava tendo um caso com meu melhor amigo, e eu fiquei tão chocado que perdi o controle da direção e saí com o carro da pista. O resto você sabe. — Explicou ficando em silêncio logo em seguida. — E depois quando estava voltando após fazer o exame senti uma dor de cabeça tão intensa, minha visão ficou turva e eu... Acho que desmaiei no volante. Sorte que Camile e o bebê dela estão bem. Soube que não sou o pai?

— Soube. Sinto muito por tudo que aconteceu!

— Não sinta, na verdade eu estou bem feliz por isso ter acontecido. — Afirmou e eu o olhei incrédula. Ele então decidiu continuar após esboçar um pequeno sorriso. — Mais feliz que ter me lembrado do passado, estou de não ter esquecido do meu presente. — Falou me olhando intensamente nos olhos e fazendo questão de enfatizar suas palavras. — Feliz por não ter me esquecido de você. Quando acordei e soube o que houve com você fiquei sem chão. É como se eu sentisse que você estava em perigo. Como se tivesse uma ligação com você. Loucura, não é?

— Eu também me sinto ligada à você de alguma forma. — Confessei e ele sorriu.

Ficamos um instante em silêncio. Ele pegou na minha mão e a beijou.

— Eu estava pensando numa coisa. Já que sobrevivemos ao trágico romance Shakespeareano que tal escrevermos a nossa própria história? O que você acha? — Propôs me olhando com expectativa e eu não consegui não sorrir para ele.

— Eu acho uma ótima ideia. — Respondi e ele me puxou, me fazendo subir na maca e deitar ao seu lado.

Nos beijamos com tanta urgência que parecia que dependíamos daquele gesto para viver. Quando pensei que ele fosse se afastar, segurou meu cabelo enquanto sua outra mão desceu pelas minhas costas me puxando mais de encontro ao corpo dele.

— Ei, vai com calma! Ainda estamos em processo de recuperação. — Falei rindo e ele colou nossas testas. A respiração pesada, quase sôfrega.

— Eu tive tanto medo de não te ver mais. — Confessou e eu abri os olhos. Notei que ele se matinha tenso, rígido como mármore e de olhos fechados bem na minha frente. Eu podia sentir o peso da angústia dele. Era recíproca.

— Você falou sério quando disse que estava apaixonado? — Perguntei baixinho como se perguntasse sobre um segredo. Ele então abriu os brilhantes olhos castanhos e sustentou meu olhar.

— Eu não sou capaz de explicar o que sinto por você. Talvez seja precipitado demais. Talvez seja irracional, eu sei. O fato é que eu sou da área de exatas. Trabalho com números e cálculos o tempo inteiro e por isso posso de garantir que não existe medida alguma para amar alguém. A paixão não se define em aritmética, Julieta. Não tem absolutamente nada a ver com somatória de meses juntos. O sentimento simplesmente acontece. E eu estou apaixonado, mesmo antes do tempo estimado pela "normalidade". — Concluiu me fazendo sorrir como uma boba.

— Eu também estou apaixonada por você. — Admiti e ele sorriu.

Ele voltou a me abraçar. Era notável o quanto ele tentava tomar cuidado para não apertar meus pontos. Eu beijei a cabeça dele, a marca das duas cirurgias bem ali evidentes. Eram as cicatrizes mais lindas do mundo. Era a prova de que ele tinha voltado para mim.

— Aceita namorar com esse Romeu todo retalhado? — Brincou e eu o olhei divertida.

— Não sei se quero namorar alguém tão cabeça dura. — Ironizei e ele riu beijando suavemente meus lábios. — É claro que aceito namorar com você.

Nos beijamos e decidimos viver a nossa história dentro do nosso ritmo intenso mesmo. Nós claramente mudamos o destino final da famosa história que nos cercava, mas o percurso... Ah, o nosso percurso seria definitivamente tão bonito quanto o original.

Um Clichê Para JulietaOnde histórias criam vida. Descubra agora