16. Memórias

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Odiava a monotonia daquela minha vida, tudo se resumia em eu ficar sentada, vendo tudo passar. Vez ou outra eu mandava em alguém, até mesmo machucava, só para poder me divertir um pouquinho.

— Estou procurando por você há mais de vinte minutos, Lucille. — Negan então apareceu, tirando a minha paz e fazendo com que eu desejasse toda monotonia de volta.

— Poderia continuar procurando. — fiz um movimento com a mão e sorri sem mostrar os dentes.

— Não brinque comigo, porra! — vociferou vindo em minha direção.

Me levantei da poltrona e o encarei bem de perto.

— Não grita comigo! — retorqui — Não sou nenhum dos seus capangas idiotas. — apontei o dedo em sua cara — Fala logo o que quer comigo. — estalei o pescoço após abaixar um pouco a guarda.

— A porra do médico está te esperando, lá embaixo. — disse e eu arqueei uma sobrancelha.

— Médico? E o que ele quer? — cruzei os braços.

— Te examinar, ver como o bebê está. — respondeu — Ou acha que quero que meu filho nasça sem estar saudável?

— Não vá falando merda, Negan, afinal, o bebê não é só seu. — continuei o encarando com uma feição debochada — Mas, já que insiste, eu vou, sozinha. — enfatizei a última palavra e passei por ele, o ouvindo bufar atrás de mim.

Às vezes eu pensava em acabar com aquilo logo, tirando aquela criança de dentro de mim, mas depois da visita do Carl e da probabilidade desse bebe não ser de Negan, a esperança que parecia estar morta ressurgiu pelas beiradas, fazendo com que eu continuasse assim apesar dos pesares.

— Você deve ser a Lucille... — falou o homem de meia idade, calvo e com óculos garrafais.

O olhei de cima à baixo antes de continuar me aproximando.

— Em carne e osso. — respondi — E você deve ser o tal médico que Negan disse. Me admira ele encontrar um doutor tão rápido em meio a um apocalipse.

— Negan é um homem persistente, sempre consegue as coisas que quer e quando procura, acha. — ele sorriu enquanto eu o olhava com os cílios semi-cerrados — Por favor, deite no sofá. — pediu indicando o mesmo com a mão.

Não relutei, apenas obedeci.

— O que vai fazer? — perguntei o vendo erguer minha blusa e passar um gel gelado.

— Bem, vou fazer uma ultrassom. — disse ao se sentar ao meu lado em um apoiador de pés que estava ali — Pode me dizer de quantos meses está?

— Pensei que seu trabalho fosse descobrir. Como vê, o mundo meio que não favorece a minha dedicação em ser mãe ou pensar nessa criança. Estou lutando pra viver. — rebati e ele assentiu, arrumando o óculos.

— Bem... Tem razão. — começou a passar um aparelho sobre minha barriga.

— Como têm tudo isso? Digo, esses equipamentos... Você os guarda? — questionei.

— Tem muitos outros na comunidade de onde vim, pois achei viável conserva-los para que em uma situação como esta, eu esteja preparado.

Na tela só conseguia ver borrões cinzas.

— Entendi. — aquela coisa toda era estranha, eu mal sabia o que estava acontecendo, só queria que aquele exame idiota acabasse e eu pudesse me distanciar daquele medico estranho. — E, então?

— Bem, está tudo normal, por incrível que pareça. — disse — E já consegui ver o sexo do bebê, quer saber?

— Sério? Mas já? — estranhei — Isso não parecia estar tão grande aqui dentro. — olhei minha barriga — Mas sim, quero saber.

O doutor assentiu.

— É uma menina.

Fiquei um tempo em silêncio, assimilando o fato de que realmente havia um bebê esperando para sair.

— Uma menina. — respirei fundo — Uma pequena menininha. — toquei o local — É estranho...

— O que é estranho? — ele questionou e eu sorri de canto.

— Vou ser mãe. Uma mãe no meio de todo caos, vivendo sob o mesmo teto que um assassino... Quer dizer, não que eu não seja uma também. — dei de ombros.

— Você parece ser uma boa pessoa, senhorita Lucille. — falou.

Lembranças de quando minha única preocupação era lembrar Carl de trocar o curativo me veio à mente, assim como quando pegava no pé de Daryl ou cuidava de pessoas doentes e feridas na enfermaria de Alexandria.

— É, eu era. — assenti me lembrando de quem costumava a ser. — Mas nada continua o mesmo.

— Tem certeza disso? O mundo é cruel, mas alguém como você não precisa ser.

— Negan trouxe de volta o pior de mim. Acredite, isso é como uma droga, difícil de se libertar, por mais que haja motivos coerentes e suficientes.

— Creio eu que há pessoas que ainda te amem, e que torcem por ti apesar de qualquer coisa que tenha se tornado. — ele se levantou — Foi um imenso prazer conhecê-la.

Aquilo que ele disse me fez pensar em Daryl, não em Rick, nem no Carl, apenas no Daryl.

DARYL

Não havia muito mais o que fazer em Alexandria, tudo estava pacato e calmo demais, nem os zumbis estavam sendo problema, e aquilo não me agradava nem um pouco.

— O que faz aqui sozinho? — Rick apareceu na varanda.

— Não tem muito o que fazer, então prefiro ficar sozinho.

— Pensando em quê?

Ergui meu rosto e o encarei.

— Em absolutamente, nada. — respondi — Por que quer saber?

Ele sentou na cadeira ao lado.

— Por nada. Só queria saber se está pensando em uma forma de salvar Alessa do Santuário. Pois eu estou.

— Alessa não quer ser salva. — retorqui.

— É o que diz, mas não é o que Carl falou. Ele a viu, conversou com ela...

— Eu também a vi!

— Você a viu em um momento diferente, não pode se precipitar assim.

— Rick, você viu ela também. — disse — Não sei qual é a razão que te faz não querer acreditar...

— Eu a amo! Essa é a razão, Daryl!

— A gente também desiste do que ama, não pelo fim do sentimento mas sim para não prolongar a dor. Você já deveria saber, perdeu pessoas demais. — me levantei.

— Então você a ama? — Rick fez o mesmo, me confrontando.

— Eu amo sim, tanto ou até mais do que você. Só que não posso mudar aquilo que ela é, e aquilo não é nada que Alessa costumava a ser.

— Era de se imaginar... Sempre querendo estar na frente. Mas é comigo que Alessa ficou, então aviso logo que desista de sentir, pois não ganhará nada com isso. — ao terminar de dizer,  ele passou por mim, deixando-me sozinho.

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