31. Uma Segunda Chance

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- Então, eu tive um sonho bem maluco durante a aula de espanhol. - Simone diz ao terminar de beber seu suco.

- Coitada daquela mulher. - Eu digo me referindo a professora.

- Eu estava numa sauna com o Thiago e com o Guilherme e aí de repente os dois começaram a se beijar e eu estava lá no meio.

Abro a boca para falar, mas fecho desistindo.

- E depois vocês dois começaram a me beijar, mas não era mais uma sauna, era a Muralha da China.

- Ok... - Guilherme fala - Da próxima vez que você sonhar com algo assim, guarda pra você.

- Eu acho que perdi a fome. - Digo

- Ah, gente, foi só um sonho. - Ela fala dando uma colherada em sua sopa.

- Eu tive o mesmo quando vocês chegaram aqui em fevereiro. - Rafael diz - Durou mais ou menos uma semana.

- No meu caso foi aleatório. Ele é pervertido - Simone aponta a colher para o garoto.

- Será que não temos algum outro assunto pra conversar? - Milena pergunta - Qualquer um serve.

Olho para trás e vejo Caio comendo sozinho em uma mesa no fundo do refeitório.

Ele nunca teve dificuldade em fazer amigos, então não entendo por qual motivo ele está se isolando.

- A gente pode falar sobre aquele (que não deve ser nomeado) ter feito um show pro Thiago na frente de todo mundo. - Rafael fala me fazendo olhar de volta para nossa mesa.

- Rafael...

- Espera, ele fez isso? - Guilherme pergunta.

- Sim. - Rafael diz - Isso já tá passando dos limites. Quem ele pensa que é?

- Só deixa quieto, - Eu digo - ele vai acabar desistindo.

Eu sei que não vai. Quando o Caio cisma com uma coisa ele leva até o final. Foi assim com o futebol, com as artes cênicas e com a música.

Ele sempre quer ser o vencedor, mesmo quando não é uma competição.

- Não acredito que vamos ter que fazer um trabalho com ele.

- Eu realmente perdi a fome. - Digo me levantando - Preciso ir galera.

Finjo que não ouço Rafael me pedindo para esperar. E enquanto atravesso o caminho até a porta vejo que Caio já não está mais na mesa.

***

O bilhete rosa que vi quando abri a porta do meu dormitório era bem auto explicativo "Me encontre na biblioteca. - C."

Quando entro na sala e vejo Caio sentado em uma das cadeiras lendo um gibi do Hulk penso se aceitar vir aqui foi a melhor escolha. Estou quase dando meia volta, mas o garoto me nota.

- Thiago.

A bibliotecária aponta para a placa de silêncio como sempre faz toda vez que alguém respira um pouco mais alto.

- Que bom que você veio. - Ele diz dando um sorriso genuíno, o sorriso pelo qual eu me apaixonei.

- Eu precisava devolver esse livro.

Levanto a cópia de "As Crónicas de Nárnia" que ainda nem terminei de ler, só precisava de um motivo para vir aqui sem assumir que quero falar com ele.

- De qualquer forma, senta por favor.

- As coisas não acabaram bem da última vez que segui um bilhete seu.

- É. Mas esse foi realmente eu que escrevi.

Eu sento largando o livro em cima da mesa.

- Preciso de mais do que cinco minutos dessa vez. - Ele diz cruzando os braços em volta da cabeça e inclinando a cadeira, se apoiando na parede.

- Será que você pode parar com a pose de bad boy? Não tem nenhuma plateia aqui agora.

Ele se ajeita, sentando como uma pessoa normal.

- Thiago, eu falei sério quando disse que voltei por você e que quero que fiquemos juntos.

- Eu sei.

- Então o que falta? - Ele pergunta.

- Caio? Eu tenho um namorado.

- Fala sério. Você está aqui a seis meses, você mal o conhece.

- Eu achei que te conhecesse bem e olha só como tudo acabou.

- Você nunca vai conseguir me perdoar, não é? - Ele pergunta e eu consigo sentir a dor em sua voz

Levanto minha camisa, só o suficiente para que ele consiga ver as cicatrizes.

- Meu deus... - Ele diz com os olhos arregalados, e quando aproxima a mão para tocar nos machucados, abaixo a camisa.

- Você deixou isso acontecer.

- Thiago, eu já disse que eu não tinha outra escolha!

- Você tinha, sim! Sempre tem outra escolha! E nem é sobre isso que se trata.

A bibliotecária chama a minha atenção, criando um deixa para eu sair do ambiente. Caio me segue para fora.

- Foi muito tempo tendo que ficar escondido! Vendo você beijar meninas pra não ser chamado de viado pelos seus amigos.

Estamos sozinhos no corredor, mas tenho a impressão de que qualquer um a quilômetros conseguiria ouvir minha voz.

- Você sempre foi a porra de um covarde! - Eu empurro ele, mas o garoto mal sai do lugar.

- Sim, você tem razão. - Ele diz - Eu fui um babaca e você não merecia ter passado pelo que passou.

Ele dá um passo na minha direção.

- Mas, Thiago, eu te garanto que ninguém nunca seria capaz de te amar com a intensidade que eu te amo.

Ele avança mais um passo, eu dou um para trás e encosto na parede.

- Tudo o que eu te peço é uma segunda chance pra te mostrar isso.

Caio coloca a mão no meu rosto.

Meu cérebro envia pensamentos como: "dê um soco na cara dele" "chuta onde dói mais", mas não faço nada até que ele se aproxime, querendo me beijar.

- Não. - Eu digo me soltando dele.

- Você sabe que quer.

Não respondo e começo a andar.

- Thiago! - Me viro e olho para ele - Seu namorado sabe que você estava aqui?

- Não é da sua conta. - Respondo.

- Então é um não.

Ele faz um coração com as mãos. Eu respondo com um dedo do meio. Ele apenas ri.

***

Estou a caminho do meu dormitório quando escuto um barulho vindo do armário de limpeza:

- Sim, desse jeito. - Reconheço a voz da Ana Clara.

Sério, Tulio? No armário de limpezas? Bem, melhor do que se fosse no nosso quarto.

- Que bom que gosta, gatinha.

Ok. Essa não é a voz do Tulio.

Preciso de tempo para refletir o que fazer. Por um lado eu não tenho nada a ver com isso, mas por outro, Tulio é meu amigo.

Merda.

Abro a porta e vejo Ana Clara só de sutiã beijando um garoto que reconheço como um dos colegas de time de Tulio.

A garota toma um susto e dá um grito tampando o torso enquanto o garoto bate a porta com força.

- É... - Digo coçando a nuca - Isso não vai ser nada divertido.

Andando Em CírculosOnde histórias criam vida. Descubra agora