8. O Campeão Voltou

10.4K 1.1K 400
                                    

O bolo de chocolate feito pela minha tia Lucia deveria ser considerado a oitava maravilha do mundo.

Quando março começou tudo o que falavam era sobre o carnaval, mas como não é a minha festa favorita, eu só queria comer comida de casa e resgatar um pouco da privacidade que não dá para ter quando você tem um colega de quarto.

Minha mãe e minha tia tinham milhares de perguntas sobre como era o internato, as aulas, os professores e os nossos novos amigos.

Mas só quando estávamos apenas eu e Guilherme, tia Lucia perguntou:

- Então meu amorzinho, como está esse coração?

Ela estava lavando louça porém, mesmo sem olhar para nós, sabia que estava falando comigo.

- Eu estou bem. - Era verdade. Fazia semanas que eu tinha tido o último pesadelo e eu estava começando a superar certas pessoas e eventos.

- Fico feliz em ouvir isso - Ela secou as mãos e deu um beijo em minha testa - E o seu coração, Gui? Alguma menina o roubando?

- É... Até tem uma menina.

Desde o dia que Milena passou mal - ela apenas teve uma queda de pressão - eles começaram a conversar e se aproximar cada vez mais.

- Ele tá todo apaixonadinho. - Brinquei.

- Cala a boca! - Ele deu um soco não-tão-leve em meu braço mas esboçou um sorriso.

Ele parece feliz. E isso me deixa feliz.

As mulheres da casa tentaram nos convencer para faltarmos alguns dias de aula e ficar aqui até o nosso aniversário, mas as provas, que ocorrerão logo após o fim do recesso, nos impediram.

Por isso, passei a maior parte do tempo estudando em meu quarto ouvindo música. Guilherme até me convidou para ir a um bloco de rua mas, como ele já esperava, recusei.

Fiquei com medo de ir na rua e esbarrar com alguém da minha antiga escola. Na verdade, as únicas pessoas que vi em todos os dias que passei longe do internato foram Guilherme, nossa mãe, nossa tia e a vizinha que viu eu e meu irmão entrando em casa no primeiro dia e ficou dez minutos falando o como estávamos virando "rapazinhos".

Minha mãe teve que trabalhar no dia em que fomos embora, mas quando acordamos vimos que tinha deixado presentes de aniversário adiantado.

Guilherme abriu o dele primeiro. Tinha ganhado um notebook novo, ele gostou.

Imaginei que iria receber a mesma coisa, nossa mãe geralmente nos dava o mesmo presente sempre, mas quando desembrulhei o pacote vi que era uma câmera profissional.

Eu, que sempre quis uma, amei o presente.

A primeira foto que tirei foi do meu irmão com a língua de fora segurando o laptop dele.

Nossa tia também nos presenteia, ela dá a nós dois um porta-retrato com uma foto de nós 4, eu e Guilherme devíamos ter uns 5 anos na época.

Noto na fotografia o quanto elas duas, gêmeas como nós, são tão diferentes. A foto foi tirada em nossa casa, era manhã cedo mas mamãe estava vestida como se estivesse num filme, ela usa salto alto até se for na padaria, já tia Lucia é o extremo oposto, ela usaria chinelos até em casamentos, se pudesse.

Como nossa mãe trabalhava muito, e nosso progenitor desapareceu quando soube que seria pai, tia Lucia acabou indo morar com a irmã para cuidar da gente.

Ela nunca casou ou teve filhos, mas deu todo o amor para nós sobrinhos. Já nossa mãe, até namorou algumas vezes quando já estávamos mais velhos, mas nada durou mais que um ano.

Andando Em CírculosOnde histórias criam vida. Descubra agora