Plano de voo

Coração de dragão

— Três corações? — A mulher perguntou após ouvir a confirmação médica. — Meu filho tem três corações?

— Sim. — O curandeiro respondeu sereno, dando-lhe um minuto para assimilar a situação. — As asas e a dentição não foram as únicas características "herdadas" pelo dragão.

Sem fala, a mulher somente assentiu, mostrando compreender a situação.

Já havia previsto algo similar quando notou no peito de Kirishima múltiplos batimentos cardíacos de forma sincronizada, mas ouvir a confirmação por um breve instante a havia deixado petrificada.

Quando ele nascera, a mulher realmente acreditara que as sutis escamas, posicionadas de forma estratégica em algumas partes do corpo infantil juntamente ao par de asas seriam o desfecho da maldição recebida pela família.

Contudo, após o aparecimento da dentição e agora a descoberta dos múltiplos corações, chegou a se perguntar quantas surpresas ainda haveria até que o filho chegasse a idade adulta.

Algumas vezes chegara a acordar assustada, em meio a pesadelos de testemunhar o filho se tornar um dragão por completo, antes de ser cruelmente caçado como um animal primitivo como sua tribo havia praticado no decorrer dos séculos.

Teve que com custo segurar o soluço choroso preso em sua garganta somente em imaginar tal possibilidade.

— Três corações significa que vou poder amar mais do que uma pessoa comum, certo mamãe. — Eijirou falou em tom de afirmação, torcendo para que tal frase a acalmasse, embora realmente não entendesse o que tal descoberta poderia significar.

— Certo. — A mulher concordou com um sorriso, encarando orgulhosa a maturidade do menino ainda tão jovem, com seus dez anos concluídos.

Passou levemente a mão acariciando os cabelos rebeldes, escondendo por hora os primeiros vestígios dos chifres.

Independente da forma que evoluiria, Kirishima seria seu filho. Era a única certeza que humano ou dragão jamais mudaria.

Adolescência havia passado, como um piscar de olhos.

Nada de realmente significativo havia acontecido, talvez por isso Eijiro não tivesse de fato se apegado a tal fase.

Havia tentado, por Deus como havia, se misturar aos demais de sua idade. Realizava favores, distribuía sorrisos, porém as vezes se sentia mais como um mascote do que realmente uma companhia.

Alguém a ser procurado apenas quando se sentiam entediados.

Tudo havia sido mais difícil quando os supostos "amigos" haviam começado a se interessar por romance, aos olhos do ruivo uma missão impossível para si.

Não que realmente tivesse se interessado por alguém. Todos pareciam iguais aos olhos do ruivo. Contudo, notar que ninguém se interessara por si destruía ainda mais sua esperança de possuir uma vida normal como de qualquer pessoa da vila.

— Talvez ele se interesse mais por lagartos ou lagartixas. — Um dos jovens implicou, ganhando várias gargalhadas em resposta, inclusive do próprio Eijiro.

Sorrir parecia a melhor, para não dizer única, maneira de disfarçar sua tão frágil autoestima.

Rir, mesmo sem humor incluso, era mais confortável que o silêncio absoluto.

***

Enfim havia chego a tão sonhada maioridade.