Capítulo 16

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Entraram em casa de João, Isabel descalçou-se à entrada e deixou-se cair no sofá, exausta de tantas emoções. Demoraram quase toda a tarde na esquadra, entre declarações, conversas formais e informais, com uma visita a casa de Isabel para recolha de provas, fotos, impressões digitais e outros dados importantes para a investigação que se iria iniciar depois de apresentada a queixa contra Tiago. João mantivera-se imperturbável, sem recuar nas suas intenções, exigindo que os polícias olhassem todos os cantos da casa, numa versão dura e implacável de si mesmo, que a preocupou ligeiramente. Sabia que ele tinha os seus próprios fantasmas por resolver, sofria com eles, e ela tinha-lhe trazido mais um para o ensombrar.

Esticou-se no sofá, e procurou com o olhar por Filipe, que estranhamente ainda não a tinha vindo cumprimentar.

- Onde está o Filipe? – perguntou-lhe sem se mover.

- Vou ver na varanda. Deixa-te estar. – respondeu-lhe, deixando-a a descontrair. Devia estar de rastos depois daquilo tudo. Tinha muita força mental para lidar com os problemas, dizia a si mesmo surpreendido. Já tinha visto pessoas desabarem por muito menos, mas ali estava ela, apenas abatida e cansada. Nada de histerismos, nem descontroles, e suspeitava que o motivo era ele. Não que se achasse importante ao ponto de a conseguir ajudar a manter o equilíbrio, mas tinha a impressão de que ela o estava a tentar proteger, engolindo a dor e forçando-se a lidar com os problemas de forma minimamente controlada. Não sabia bem se isso era positivo ou não, se não seria injusto para Isabel estar preocupada com ele num momento daqueles.

Olhou a varanda e ficou surpreendido por não encontrar o cão estendido ao sol, como seria de esperar. Uma leve dor de barriga invadiu-o, deixando-o desconfortável. Onde se teria metido o animal? Fingiu naturalidade ao passar por ela em direção ao quarto, para não levantar suspeitas desnecessárias e fez uma pequena prece para que Filipe estivesse esparramado na sua cama a sujar-lhe a colcha toda de pelos. Abriu a porta e não o encontrou também. Um nervoso miudinho fê-lo abrir freneticamente todas as divisões da casa, sempre vazias e silenciosas. Passou as mãos pelo cabelo e respirou fundo, onde estaria o cão? Isabel surgiu atrás de si, olhando-o interrogativamente e reagiu instantaneamente à energia vinda de João, que já respirava aceleradamente.

- Não está em lado nenhum, pois não?... – gemeu, sentindo-se a gelar.

- Não... - agarrou-a pelos braços, apoiando-a em si, enquanto pensava no que fazer e no que poderia ter ali acontecido. – Tem calma, deve haver uma explicação. Vou telefonar à Rosário. – sem a largar encaminhou-se para a sala e sentaram-se no sofá, enquanto ligavam para casa da empregada.

- Estou? – atendeu Nélia descontraidamente.

- Estou? – aquela voz parecia-lhe familiar, mas dedicou pouco tempo a pensar nisso. – A Rosário está? É o João Marques, precisava de falar com ela com urgência por favor.

- Ah, sim, um momento... - sobressaltou-se com aquela coincidência e fingiu um tom de voz mais grave, correndo a chamar a tia que atendeu prontamente.

- Sim, Dr? O que se passa? – perguntou nervosa. Sabia que aquela visita à hora de almoço lhe parecera estranha. Só temia que tivesse feito asneira ao confiar no homem.

- Olá Rosário. Onde está o Filipe? – perguntou de chofre a sentir-se cada vez mais desconfiado de que ali havia esturro.

- O dono apareceu aí em casa e disse que tinha combinado consigo para o levar... - respondeu com a voz fraca ao detetar no patrão nervosismo.

- Dono? – berrou – Mas qual dono? – uma dor aguda começou a nascer-lhe na cabeça, estalando à medida que a respiração se apressava.

- Ai valha-me Deus... Não me diga que aquele homem me mentiu... - choramingou Rosário que se sentou a desfalecer numa cadeira que tinha por perto.

A Mala VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora