Welcome to the playground

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Era domingo, nove e oito da manhã. Pelo menos de acordo com a tela a minha frente.

O céu através do vidro da enorme janela do meu quarto estava cinzento, mas uniforme. As nuvens formavam uma camada tão homogênea, que cinza parecia ser a cor natural do céu, como se nunca tivesse sido azul. O frio que congelava as pontas dos meus dedos também parecia ser reflexo do céu, que impedia que os raios solares ultrapassassem as nuvens espessas.

Eu poderia continuar deitado e sentir o dia cinza de outono passando bem em frente aos meus olhos, mas uma lembrança do dia anterior me impediu disso.

Sábado era quando eu e Taehyung saíamos de casa dizendo que eu iria acompanhá-lo ao psiquiatra. Nós nos despedíamos da minha mãe e em seguida íamos à farmácia, pegar alguns remédios de placebo que Dong Sun encomendava. Eles tinham o único propósito de enganar Sun Hee, para que ela acreditasse que o enteado se medicava regularmente contra o transtorno dissociativo de identidade.

Uma grande mentira.

Em seguida, enquanto esperávamos o horário médio de uma consulta ao psiquiatra se passar, eu e Taehyung íamos à uma praça tomar sorvete ou ao cinema ver o último lançamento de algum filme de ficção científica nerd. De vez em quando ele dissociava e o V vinha a tona, mudando um pouco meu humor e renovando os ares. As dissociações aconteciam bem mais frequentemente, como Tae havia me dito. Parece que o fato de ele descobrir sua doença tinha agravado seus sintomas.

Depois, nós voltávamos para casa, tomando cuidado para que quem chegasse a ela fosse Tae. Minha mãe precisava acreditar que ele estava bem.

Entretanto, no dia anterior, antes de entrarmos em casa, era V quem estava no controle. Então, nós esperamos na esquina, dentro do carro, para que Tae conseguisse voltar. Ele aparentava estar calmo, mas seus olhos se movimentavam rapidamente, revelando sua inquietude. Ler V era difícil, confuso. Ele sabia esconder suas emoções e eu já havia notado isso, a maestria com que realizava aquilo.

De repente, em meio ao silêncio do ambiente e a discussão em minha mente, o telefone dele havia tocado. O garoto atendeu calmamente, dizendo coisas como “Já estou indo.”, “Não precisa se preocupar.”, “Você sabe que sim.” ou “Claro que vou.”. Eu apenas esperei que ele acabasse aquela conversa que não me dizia nada.

Porém, quando eu o perguntei quem era, ele disse que precisava ir, que eu devia entrar em casa e dizer a minha mãe que ele iria na empresa de Dong Sun. Apesar de eu ficar claramente desconfiado, V falou aquilo com convicção e me beijou em meio às expressões de confusão. Quando dei por mim, o garoto já virava a esquina com uma Mercedes e eu fiz exatamente o que ele tinha mandado.

E ele havia desaparecido. Eu não o via desde o dia anterior e aquilo me preocupava de um jeito irracional. Eu não sabia bem o porquê, apenas tinha pressentimentos ruins. Mas, finalmente o dia tinha clareado e eu poderia ir aos quartos, descobrir em qual deles ele estava. Eu tinha algumas perguntas, mas não sabia se teria respostas.

Levantei-me com aquele propósito, vestindo a primeira roupa que apareceu quando abri as gavetas: Uma blusa cinza com listras azuis horizontais e uma calça preta. Taehyung falava que gostava quando eu vestia listras. Na verdade, ele ficou muito vermelho e envergonhado ao fazer aquele elogio, porque não costumava me elogiar. Mordi os lábios só por lembrar do meu doce Tae.

O corredor estava vazio e todas as portas estavam fechadas. Eu teria que bater em ambas as portas para descobrir onde ele estava, porque tanto V poderia estar no controle quanto Taehyung. Porém, quando me aproximei da porta preta, uma voz me chamou da escada.

— Jungkook, querido, eu já estava indo te chamar. — Girei nos calcanhares, vendo minha mãe sorrir, parada em um dos degraus da escada. A mulher caminhou até mim e circulou os braços ao meu redor, encostando a cabeça no meu peito. Notei que a diferença de tamanho entre nós estava ainda maior, mais de quinze centímetros, como se eu tivesse esticado de uma hora para a outra. Talvez eu ficasse mais alto que V e aquele pensamento me fazia sorrir vitorioso.

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