CAP. IV - DO SOSSEGO AO CAOS.

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O suspense foi forte, mas Gabriela não demorou começar a se explicar.
- Bem, Tiago, eu pensei muito essa noite. Para mim, foi uma questão muito central, muito dolorida, pois são duas pessoas muito queridas que,em 24 horas, já conquistaram um pedaço do meu coração. Meu voto hoje vai para a Hana, mas queria dizer que não gostaria que ela saísse. É pesado e está sendo tão, tão tóxica essa escolha, que não consigo me sentir bem nem com Hana indo e nem com Carol ficando. Me perdoa, Haninha! – disse Gabi, chorando sinceramente.
Tiago pediu que Hana se despedisse rapidamente do pessoal e assim ela o fez. Dadas as circunstâncias, cada um para o seu lado, e Peixinho sentia-se tão grata por Gabriela ter a enxergado mais do que um rostinho bonitinho, abraçou Gabi com tanto sentimento que pensou que poderia explodir.
- Não acredito, Gabi. Obrigada! Obrigada! – disse Peixinho, sorrindo largo, leve como quando Gabriela a conheceu.
- Acontece que eu fiquei pensando o seguinte: se eu ficar aqui mais tempo, quem vai me fazer mais falta? E o que meu coração decidiu foi você. – Gabi disse num momento de 'sincericidio'. Estava tão machucada que as palavras saiam sem filtro algum.
- Gabi, sinto muito pela sua amiga. Mas estou feliz de estar aqui, com todo mundo, especialmente com você. – Disse, segurando Gabi pela cintura, sem conseguir parar de sorrir para aquela menina posta na frente dela.
- Eu tô feliz que você tenha ficado e que a gente pode se conhecer melhor...né? – disse Gabi, se desvencilhando da mão da pequena e indo para o jardim.
A frase fez o coração da Carol ficar pequeno, quase um pequeno infarto. De felicidade, claro. Via tanta verdade naquele olhar... e sentiu de novo aquele cheiro, que ela não conseguiu esquecer a madrugada toda.
Logo, Carolina estava sendo coberta de beijos por Bella, Hari e várias outras pessoas do grupo A. O grupo B, estranhamente, não falava com Carolina. Talvez um pouco de magoa pela baiana ter ficado e Hana ter ido. O único que fez questão de cumprimenta-la foi Alan, que votou em Hana para sair.


POV – Carolina.
Eu ainda não consigo acreditar que Gabi me escolheu para ficar. Essa madrugada ela estava realmente muito pensativa. Cantarolava, bêbada, uma estrofe que dizia:

"Amor, é que faz tempo que 'cê me ligou
E eu fiquei aqui a procurar
Motivos que justificassem a tua falta
Amor, não é pedindo pra você ficar
Mas se quiser eu nem vou reclamar
E o que no fundo, o que meu coração quer dizer é..."

E sempre parava nessa parte. Reparei nela a madrugada toda. No jeito como ela "quebra" a mão direita segurando o cigarro, como sorri sem graça quando é elogiada por alguém. Em como prende o cabelo num coque toda vez que sente calor. Nem sei por que ando reparando tanto nela. Tem algo de mim nela, não sei explicar. Mesmo assim, não acreditava que ela me deixaria aqui e que ainda diria que seu coração optou por mim. Tô um pouco abalada, mas sem psicológico para pensar nisso agora. Só quero festejar na festa de amanhã. – Obrigada, Gabi! – digo várias vezes dentro da minha cabeça e meu coração pula, latejando de felicidade. Fiquei com a música permeando a cabeça até que lembrei de onde conhecia e comecei a cantarolar:

"Que eu te amo demais
E tudo que eu faço
Me lembra você
Enquanto você me dizia
Que iria ser pra sempre nós
O mundo acabava em promessas
E ainda estamos sós"

Meu coração quer dizer para eu escuta-lo, acho. Deixa rolar, eu me permito. Deixa rolar...


 POV – Gabriela.
Fiz, pela primeira vez, o que meu coração pediu. Eu votei em Hana para sair, simplesmente porque senti vontade de viver mais com a Carol, com o sorriso dela. Com a carinha, a voz , o jeitinho baiano de falar. Não posso dizer que estou apaixonada, por mais que existam milhões de motivos que justificassem minha paixão. Vou me ater a dizer que estou encantada com o modo dela viver e ver a vida. Ela leve me deixa leve. Sem contar o fato de que Hana parecia tão debochada, tão sem coração, que me deu menos medo de optar o coração e não a razão. Sei que não faço o tipo de Carolina, ainda mais sendo uma mulher. Não to criando expectativa de retorno, não. Eu só tô feliz por ter tomado uma atitude do fundo do MEU coração, sem interferências externas.
Me sinto mal mas me sinto bem, sabe?



QUARTA – FEIRA , PRIMEIRA FESTA DOS BROTHERS


- Carulina do céu, eu não te falei, menina? – Disse Bella, com aquele olho azul arregalado, capaz de cegar um carro há mais de 10KM de distância. A maquiagem deixava ela ainda mais bonita, não que ela precisa-se
- Oxê, disse o quê? – Carol parecia não entender. Estava linda demais, não tem como não dizer.
- Gabriela, minha filha. Gabriela! Não falei que ela tinha interesse?
- Você tá variada da ideia, Bella. Ela simplesmente fez uma escolha e pra minha felicidade, a escolha foi me deixar por aqui mais um pouquinho.
- Carolina, você é sonsa ou se faz? Precisa passar quantos meses aqui dentro pra perceber? Fala sério! – Bella disse, perdendo a paciência. Essa sim foi a primeira ponte Gafish, por mais que não gostem de admitir.

POV – Carolina.
Oxê, ópaí: Bella sismou que Gabi tá afinzão de mim. Tenho certeza que nem faço o tipo de Gabi. Ela me mostrou uma foto da ex namorada, linda, que ela deixou lá fora. Nada a ver comigo. Confesso que imaginar Gabriela afim de mim, me deu vontade de provocar só pra ver no que vai dar. Hoje a noite é longa e , vamos ver se o álcool faz efeito.


Gabriela passou mais da metade da festa alheia a tudo e todos. De vez em quando jogava uns olhares para Hari e Carol. Quando deu um certo horário, o álcool falou mais alto e o funk estava estralando nas caixas de som.

02:40 AM - DE QUINTA FEIRA.
- vem cá, véi. Senta aqui, Gabi. – Hariany pegou Gabriela pelo braço e colocou ela sentada num sofá preto, vinilico – Gabi, véi, eu quero que ocê preste atenção, viu? Não faço isso pra qualquer um não, sô.
Hariany começa a dançar sensualmente na frente de Gabriela. Gabi coloca a mão no rosto e começa a se ajeitar no sofá, sem jeito mas com a cara de safada característica.
- Que isso, Brazeeeeeeeeeel. Assim eu num aguento.
Hariany desce até o chão e começa a simular sentadas em Gabi, que coloca as mãos pra trás numa tentativa frustrada de afastar a loira, que investia pesado na dança. De repente, Carolina Peixinho chega junto de Hariany e coloca a loira atrás dela. Num movimento um pouco desajeitado, encaixa a bunda no quadril de Hari, enquanto a loira sarrava a pequena sem dó.
- Brasil, eu imploro, não me tirem dessa casa- Gabriela fala, rindo alto.
Carol dá um chega pra lá em Hari e, de frente pra Gabi, começa a descer até o chão, sem pena dos joelhos. Olhando nos olhos da maior, a pequenininha vira de costas e rebola ate o chão, encostando a bunda nas pernas magras de Gabriela.
- ÊÊÊÊÊÊÊ BAÊAAAAAA, CARAI! EMBRAZA , EMBRAZA, EMBRAZA! – Gabriela falava animada, sem nem acreditar naquele corpo tão malhado , colando a pele na dela.
Carolina estava se sentindo a mulher mais desejada do mundo. Nunca tinha percebido nenhuma mulher desejando-a, mas estava gostando de ver a cara da Gabriela. É fato que o álcool desinibe qualquer um, mas Gabriela sentia que deus estava testando seu autocontrole. Levantou subitamente do sofá e se colocou atrás de Carol, copiando os movimentos da bunda da menor, sarrava com vontade enquanto Carolina parecia se divertir com tudo aquilo.
Quando Hariany voltou, fizeram sanduiche de Gabriela e ela, coitada, estava em êxtase.

POV – Carolina.
Que calor! Ver a Gabriela com essa carinha pra mim mexe com meu psicológico. Não quero fazer nada demais, pois a ressaca moral vai ser tremenda amanhã. O álcool subiu rápido demais hoje. Ela aqui, atrás de mim, me dá vontade de rebolar com mais força, até ela não aguentar mais. Ela tá muito gata com esse macacão branco, o cabelo bem armado, um black de respeito.
Tava tudo muito bom até Hariany achar boa ideia fazer sanduiche de Gabi. Oxê, não me respeitou em nada, atravessou minha onda. Barril, viu?
Agora que eu to parando pra pensar no que eu to fazendo: dando bola para uma menina, em rede nacional, com mainha assistindo. Como que eu posso estar fazendo um negócio tão sem noção? EU SOU HETERO!

POV – Gabriela.
Por Deus que tá no céu, faltam menos de 2 minutos pra eu perder o controle. Carolina consegue provocar de uma forma muito sutil, tudo de mais sensual que existe dentro de mim. Se Carol dançar na frente de um defunto, ele levanta na hora. Abana, papai!
- Peixinha de Deus, faz isso comigo não que faz mais de ano que eu não faço exame do coração. Tá dando palpitação aqui!
- "Quer mais? Aguenta, vai"! – Peixinho canta junto com o funk que está tocando.
- Guento mais não, Peixinho. – Digo, colocando a mão na cintura dela, rindo e sentindo desespero ao mesmo tempo. Ela sabe que essa brincadeira já deixou de ser brincadeira faz tempo.
Começa outra música e Peixinho fica mais animada ainda. Deu um fora em Hari, mas acho que nem percebeu. Na festa, parecia que tínhamos esquecido todas as pessoas ali presentes, de todas as câmeras e tudo mais. Dançávamos descontraídas, como se nos conhecêssemos há séculos. Carol tem um efeito imediato no meu corpo. É só sentir ela roçar em mim, que fico acesa na hora. O álcool vai nos trazer muita coisa boa essa noite e deixar nossa ressaca moral amanhã, juntinho a nossa cama.
- NINGUEM MANDA NESSA RABA, PAPAI! – Carol ensaia um quadradinho colado no meu quadril e eu sinto a perna ficar bamba aos poucos. Molhada eu já estava há tempos, o que eu to sentindo agora ainda não tem nome.
- Ei, Carol... ó, eu to ficando muito animada com essa brincadeirinha sua. Para de me provocar!
- E não é pra ficar? Você acha que só você tá molhada, Gabi?
Estou sem palavras. Num momento de lucidez em meio essa loucura, saio de perto da Peixinho e vou fumar um cigarro. Tô precisando!
- Gabi... – diz Rodrigo, chegando perto de mim. – Que cena é essa você e Carolina? Tem necessidade de tudo isso?
A frase dele me choca um pouco.
- Isso tudo o quê, Rô?
- Gabi, sinceramente, te acho uma mulher forte, destemida, linda, com várias lutas pessoais enormes. Você vai mesmo deixar uma garota como ela, só um rosto bonito, mexer com você em rede nacional, brincando com o fato de você ser lésbica e pagando de gostosona, mostrando que pode fazer você perder a cabeça?
Eu não sei nem o que responder. Não tenho a mesma visão de Rodrigo. Para mim, Carol parece muito genuína em tudo que fala e faz, não parece uma atriz ou alguém que queira se promover as minhas custas.
- Rô, eu não sinto isso que você está dizendo. Você está de fora da situação, então vou considerar suas palavras e vou reconsiderar minhas atitudes. Obrigada por cuidar de mim, por pensar em mim.
Rodrigo tem razão, eu penso. A hetero está querendo se promover as minhas custas, a troco de quê? De me fazer apaixonar para ela mostrar ao Brasil todo que eu posso ser uma otária?
Não. Não vou deixar isso acontecer comigo.
Peixinho chega de repente e me abraça  por trás, perguntando:
- O quê foi , amô? Ta aqui, tão quietinha sozinha!

E agora, o que eu faço se me olhando assim, se sentindo o cheiro dela tão perto de mim, fica difícil afastar nossas peles...?

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