Forte da Resistência

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Arorn olhou para trás e reparou na tensão que assolava a expressão de Darrion. Abanava a cabeça - talvez para espantar a memória de tempos passados. Arorn não sabia o que era a guerra e nisso Darrion tinha razão. Nunca pisara aquele solo para combater os Esquecidos. A única guerra que conhecia eram as escaramuças com os bandidos de Eknor. Sabia que entre uma guerra e uma escaramuça apodrecia um mar de corpos.

Um portão de madeira com a altura e largura de três homens tinha sido aberto para que entrassem. Mesmo em tempos de paz, há medida que o grupo ia passando pelo portão, os guerreiros que protegiam as torres, cobertos por aquela espécie de pano de tenda, tinham as cordas dos arcos puxadas e flechas apontadas na direção dos homens do Norte.

Arorn observou os Esquecidos e muitos deles acabaram por desviar o olhar para a plena paisagem do Noroeste. Se eu tivesse lutado na Grande Guerra, teríamos ganho a guerra. Sabia que não havia maneira de ter a certeza disso, mas foi a forma que encontrou para lidar com dor de não estar a sofrer tanto como Darrion. Também ele queria ser assolado por memórias de guerra. Significava que havia lá estado.

Foram obrigados a deixar as suas montadas no estábulo onde as outras, mais elegantes, haviam sido presas. Tal como os homens do Norte e os do Vale do Esquecimento não se toleravam, os cavalos do Norte e os Esquecidos relinchavam agressivamente e davam coices no ar ao ver e cheirar os outros. O rapaz que cuidava dos estábulos foi obrigado a afastar os animais para que não se atacassem. Os cavalos exaustos do Norte foram colocados ao sol, com uma água castanha em frente, que em vez de matar a sede, o mais provável era encher os seus órgãos de terra. Mas os cavalos estavam exaustos o suficiente para beber aquela água sem qualquer problema.

Sem fazer qualquer pergunta, alguns dos Esquecidos que haviam estado a seguir, voltaram-se para eles e ordenaram aos soldados que entregassem as suas armas.

Arorn não se moveu, ficando a observar o olhar selvagem dos Esquecidos. Não queria entregar a espada. Mas sabia que o teria de fazer para o bem da missão. Elevou lentamente a mão, observada por todos, e envolveu o cabo da espada. Nesse momento, uma voz trovejou no seu corpo. Mata-os! Mata-os a todos! Os dedos apertaram com força o cabo do "Sabre do Furacão". O próprio braço lutava contra ele mesmo – uma parte, para desembainhar a espada e acabar com todos os homens que os rodeavam, e a outra, para se manter parado.

Com muito esforço, lá conseguiu retirar a espada embainhada das costas e entregá-la ao Esquecido. Quando as mãos de Arorn ainda estavam na espada, parecia conseguir ouvir os seus gritos, como se tivesse vontade própria. Deve ser apenas de estar rodeado de Esquecidos. As memórias das escaramuças em Eknor atacam-me... Os outros entregaram também as suas armas.

Subiram umas escadas de madeira em espiral, até chegarem ao topo do Forte da Resistência. Quando lá em cima, foram obrigados a atravessar uma das muitas pontes de corda e madeira que cruzavam o topo. Ao olhar para baixo, enquanto atravessava a ponte, Arorn entendeu que um passo em falso poderia significar a morte. Foram dirigidos para um soalho de madeira em que estava um grupo de homens a olhar na sua direção, preparados para atacar quem se mostrasse perigoso. Ordenados por um homem que estava atrás deles, desviaram-se bruscamente.

A olhar para a planície, quebrada por um ou outro planalto, que se estendia a Oeste, de costas, sentado num banco de madeira e pele, estava um homem mais baixo do que todos os que o rodeavam. A sua voz soava amigável, como se cada palavra fizesse parte de uma canção que ouvia desde o seu nascimento.

– Arorn, filho de Hawthorne, avança, por favor!

Arorn avançou, a olhar para o outro, de braços cruzados. O aparente líder do Forte da Resistência voltou-se lentamente e fitou o príncipe. Conseguiu perceber que os olhos do homem eram muito grandes e dourados, sendo que as suas têmporas eram proeminentes, ao contrário do seu maxilar, que mal se distinguia – o topo da cabeça, coberto por longos cabelos castanhos finos, era claramente mais largo do que a zona do queixo. Era um homem da Floresta das Sombras.

Da diminuta boca do homem da Floresta, saíram doces, quase hipnotizantes, palavras.

– Ah, Arorn. Que bom finalmente conhecer o grande príncipe Arorn. Ouvi falar muito de ti. - Arorn não deixou de estranhar ser tratado assim, tão simplesmente, como se conhecessem desde sempre. Embora se considerasse um guerreiro, sempre fora tratado com um joelho no chão, por ser príncipe. Shaw e Darrion haviam sido o primeiro choque e, agora, aquele homem.

Arorn tentou não demonstrar o seu desconforto.

– Coisas boas, espero. Senhor?

-Podes-me tratar por Bonn. Sei que o meu nome completo não consegue ser pronunciado pela vossa gente. Até os Esquecidos têm dificuldade. - Sentia o peso dos olhos de Bonn. Analisavam cada reação. Ele parecia estar a maravilhar-se com o efeito das suas palavras.

- E não sou senhor. Senhores são os homens do Norte e do Sul. Aqui somos todos homens – continuou Bonn. As cabeças dos que os rodeavam anuíram em concordância.

-Mas alguns homens são mais poderosos do que outros, não é verdade? Calhorn é rei. Estes homens são soldados - afirmou Arorn, enquanto apontava para os Esquecidos que o rodeavam.

-Calhorn não é rei. Embora eu saiba que a vossa gente lhe chama isso e eu perceba que seja mais simples para vocês. Mas Calhorn "A Seta" é o Escolhido, tanto pelo Lago Balanos como por Erunnyl. Está acima de qualquer rei. - A sua expressão provocadora sondou Arorn. Sentiu a face a enrubescer. Não gostava de ser corrigido.

-O acordo mantém-se de pé? - indagou Arorn, para mudar de assunto. - Deixam-nos ficar cá esta noite?

Com um salto, Bonn levantou-se e dirigiu-se a Arorn, a quem apertou a mão, algo que deu para ver que não fazia parte da sua tradição pela forma como posicionava a mão.

- Teremos todo o gosto em deixar-vos ficar esta noite no Forte da Resistência. A dormir nas nossas tendas, a comer da nossa comida e a beber da nossa bebida.

Arorn percebeu que cada frase de Bonn tinha o intuito de testar a paciência dos homens do Norte. O homem da Floresta apontou em direção à ponte de madeira que eles haviam atravessado e o grupo, depois de Arorn dar a ordem, percorreu-a, voltando a descer as escadas em espiral.


_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Próximo Capítulo: A Estadia  _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 


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