Capítulo 3 - O Chamado da Magia

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O vento uivava trazendo consigo o ar gélido do norte. Kauê havia me vestido com tantas camadas de roupas que eu mais parecia uma cebola gorda de lã. As lamparinas mágicas balançavam acompanhando a pressa do vento, fazendo um prisma multicolorido em todo o mercado.

Nudous encolhia-se em meu ombro apertando a cada soprada de vento, sentia seus pelos roçando em meu cachecol que a tia Nenê tinha me dado. A fuinha descansava em volta do meu pescoço, pois temia o frio da camada fina de neve que ainda teimava em descansar na calçada do bazar.

Havíamos acordado cedo para comprar uma cornucópia, a caravana Thri havia acabado de chegar a nossa cidade e meu irmão insistia em sermos os primeiros a começar a caçar os artefatos, isso queria dizer que deveríamos chegar de madrugada na feira. Estava escuro ainda, exceto pelas lamparinas semi congeladas.

_ Dez lascas de prata? Você deve estar maluco, sabia que com dez lascas de prata eu poderia passar o mês inteiro vivendo como um rei? – Perguntou Kauê para o vendedor, gesticulando de maneira maluca com as mãos ao alto.

_ Thiiivvv tka nii shooo kishhhh rhsh rhsh rhsh – Zombou o gafanhoto de volta, ele apoiava-se em sua mesa com ambos os braços inferiores e contava lascas com as mãos superiores. Eu sempre fui fascinada pelos Thrii-Kreen, mesmo não conseguindo imaginar-me tendo tanta destreza com quatro braços.

_ Como assim a vida do rei do norte não deve ser tão luxuosa. Foi uma maneira de dizer. Escute, compro por seis pratas e vinte cobres, e olha que você é o primeiro comerciante que visito, com certeza encontraria uma por um preço não tão exorbitante.

O thri encarou-me por alguns segundos, e voltou a se virar para meu irmão. Nudous saltou em alerta, suas pequenas orelhinhas pareciam ter captado algo que apenas ele podia ver, no além. A fuinha saltou aos pés do meu irmão e começou a roçar-se e arranhar suas pernas, circulando-as.

_ Tkahh nisht thsuuu marhhh? – Disse o thri, olhando para meu irmão com seus olhos gigantes alaranjados.

_ Claro que não quero trocar minha irmã pela cornucópia, com quem você acha que está conversando? Façamos o seguinte então, lhe dou seis lascas de prata agora, e metade do valor do primeiro artefato que encontrarmos. Ai, Karen olha esse bicho aí me mordendo. – Nudous roía a bota do Kauê e sorria de volta para mim.

_ A sua metade do valor do primeiro artefato que encontrarmos você quis dizer. – Disse pro Kauê, que olhou para mim com um olho de cada cor.

_ Rhsh rhsh rhsh. Takhi mahakam ihhhrrt niehetz. Rhsh rhsh rhsh – Gargalhou o vendedor me encarando.

_ Sim, sim, muita personalidade numa tampinha só. E então? Temos um acordo? – Nudous Escalava minha perna para descansar novamente em meu pescoço.

O gafanhoto virou-se e abriu um baú no fundo de sua tenda, de lá retirou uma peça maior que a cabeça dele, dourada. O comerciante caminhou até o balcão e pôs a peça com um baque surdo, graças ao seu peso.

_ Ora, ora ora... – Kauê estava fascinado, disso eu sabia, conhecia seu fascínio por peças de arte que logo seria transformada pela magia. A capa dele balançava com o vento iluminando nosso redor com seu brilho mágico que pareceu crescer com o aparecimento da cornucópia dourada. Até mesmo Nudous parecia hipnotizado com o ritmo calmo que as luzes pareciam ter combinado em seguir, o brilho azul da capa misturava-se ao dourado da cornucópia, iluminando toda a ruela do mercado recém-montado.

O rapaz se virou e me olhou bem no fundo dos meus olhos, eu pessoalmente gostava mais de seu olho esquerdo, o azul. O direito era verde e lembrava muito o papai, já o azul da esquerda lembrava-me a mamãe. Kauê curvou-se um pouquinho até ficar da altura de minha orelha, afastou Nudous um pouco com a mão e cochichou:

O Capa Vermelha - Livro 1: As Crônicas de IvalinOnde histórias criam vida. Descubra agora