"Lembro-me da primeira vez que matei. Meu pai havia desenhado um mapa dos esgotos da cidade, e por eu ser criança, ele dizia que eu passaria com facilidade pelos túneis. Ele não estava errado, graças ao dispendioso empreendimento que eram os enormes esgotos que o Rei Camundongo havia projetado e torrado todo o ouro da cidade para, teoricamente, melhorar a higiene da população, pude atravessar com facilidade e entrar na casa do meu alvo com certa facilidade, claro, sem antes aprender para onde haviam migrado todos os ratos da cidade.
Quando adentrei a casa, eu estava imunda de sujeira de esgoto e sentindo que nunca mais conseguiria cheirar como um ser humano normal. Logo pude constatar a enorme e luxuosa casa do alvo. Andei por aquela casa sem nem reparar a encardisse de rastro que havia feito ao andar pelos cômodos. Entrei no grande quarto decorado, vi uma mulher deitada na cama com um bebê ao seu colo. Não podia correr o risco de que nem um dos dois alertasse que eu estava ou estive ali. Cortei a garganta de ambos e os observei morrer.
Escondi-me num dos grandes e bem talhados guarda roupas da mansão. Não precisei esperar por muito tempo, ouvi o arranhão da porta e as runas começaram a piscar, depois a porta se abriu e o comerciante adentrou. Ele estampava um sorriso bobo no rosto quando entrou em casa, este que desaparecera por completo assim que viu os rastros que fiz em seus caríssimos tapetes Thrii-Kreen, ele carregava um ramalhete de rosas de chocolate, empurrou lentamente a porta de seu quarto e ficou completamente pálido ao olhar para cama. Ele nem esboçou emoção alguma ao me ver sair do armário e andar lentamente em sua direção.
Eu nunca compreendi por completo a atitude de me ignorar por completo e correr em direção à mulher e a criança e chorar incontrolavelmente. Deslizei a faca pela manga, deixando-a saltar em minha mão, o vi abraçado à mulher e ao bebê. Senti pena ao mata-lo, ele era muito bonito.
Quando voltei ao meu pai, trazia dentro da bolsa mágica algumas coisas valiosas que encontrei dentro do casarão, ele me agradeceu e me perguntou se havia feito o serviço. Tirei de dentro da pequena bolsa a cabeça do alvo e, em vez de me agradecer ou celebrar o momento, ele vomitou.
Acontece que o cliente ficou muito feliz ao saber que seu adversário havia batido as botas, mas odiou o fato de a mulher e a criança terem sido abatidos juntos, pois aparentemente ele os cobiçava. O cliente mandou matar meu pai no bar onde deveria ter sido entregue as lascas referentes ao serviço. Dali em diante eu era completamente órfã.
Ainda pequenina, eu entrei numa taverna bem vagabunda de num dos vilarejos mais bregas dos arredores das fazendas de Alamestre atrás de algo pra roubar, ou quem sabe alguém pra levar pra fora e esfaquear e então roubar, quando me salta aos olhos um quadro negro imenso que era mantido acima do bar, bem a vista de todos os fregueses. No quadro havia dezenas de nomes, escritos com letras de caligrafias diferentes, e preços ao lado. Havia também bolsas murchas com escritas brilhantes ao lado de cada nome e preço.
Perguntei para o taverneiro o porquê daquele quadro e ele riu de mim:
_ Está pensando em entrar no ramo de assassinatos de aluguel, criança?
Balancei positivamente a cabeça apenas para ouvir uivos de gargalhadas dos bêbados meio desdentados que estavam sentados nas banquetas sujas e fedorentas do bar. O taberneiro então começou a me explicar:
_Todos tem inimigos, minha jovem. Este quadro serve para resolver este problema. A pessoa escreve um nome no quadro, escolhe um valor que possa ou que esteja disposta a pagar, conversa comigo que eu ponho a recompensa e uma amostra da vitima num saco, e o cliente aguarda o serviço ser feito. Logo depois de retirar minha parte do lucro, claro, encanto o saco com runas mágicas para que, quando alguma parte do alvo, já morto, adentra o saco, bum! a bolsa se abre e a recompensa é do assassino. Os assassinos devem certificar-se de que o alvo esteja morto, pois o encantamento reconhece este fator, devem saber também que toda parte do corpo da vitima serve, até mesmo uma simples gota de sangue.
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O Capa Vermelha - Livro 1: As Crônicas de Ivalin
FantasyIvalin é um mundo mágico e problemático. Diversas raças coexistem em uma simbiose caótica onde guerras são travadas com magia e ferro. Quando novos rumos são tomados em um dos reinos dos humanos que parece ser prejudicial a todos, uma guerra eclode...