Duas horas antes da tempestade...
Enquanto remexia seu café já frio, Claudio ainda matutava sobre o depoimento dado pelo senhor há algumas horas. Ele ainda não conseguira descansar a cabeça no travesseiro. Mesmo que o único crime que tenha alcançado a mídia fosse o caso do assassino do machado, o investigador sabia que não levaria muito tempo para que descobrissem os outros dois. A população era pequena demais para que segredos fossem mantidos.
O velho relatara sobre duas jovens cujas mãos, supostamente, estariam manchadas com o sangue dos corpos encontrados naquela madrugada. Coisa que Claudio não conseguia conceber, dado o fato de que ele próprio viu o estado dos corpos, e a física impossibilitava que duas jovens, magricelas, como o velho havia afirmado, pudessem ter qualquer relação com os homicídios.
Mesmo que o velho houvesse reconhecido as garotas nas fotos que a equipe recuperara, e que ele mesmo vira com os próprios olhos, sua cabeça ainda teimava em migrar entre os quatro corpos encontrados na república e a escultura de carne no atelier do centro. Nenhum assassino havia sido preso e ele duvidava que as duas garotas fossem capazes de tal ato. Talvez elas tivessem ajuda de alguém que houvesse debandado por outra saída, mas atribuir o crime àquelas duas garotas era algo insano demais para ser considerado. Talvez houvesse outros, mas não elas, não àquelas meninas.
Além do cansaço que começava a atrapalhar seu raciocínio, a irritabilidade cada vez mais fina se acomodava em sua mente. Por mais que para uma investigação, as informações ainda estivessem frescas e caminhasse em até que bom ritmo, ele se sentia preocupado por não ter o controle da situação, afinal, os assassinos ainda estavam soltos. Mesmo assim, ele sabia que todo o turbilhão que revirava sua mente, poderia simplesmente ser uma consequência da falta de descanso.
Ele ainda remexia seu café intocado e seu cérebro conturbado, quando viu uma figura familiar atravessando a calçada em frente à padaria onde estava. Seus olhos mal puderam acreditar e, por um momento, suas pernas travaram em um dilema palpável.
— Po-Polícia! – Gritou. – Polícia!
Claudio correu para a porta, chamando a atenção dos transeuntes. O coldre foi aberto pelo caminho e a pistola já estava firmemente presa em seu punho. Ele viu o sangue seco decorando as mãos do homem que caminhava a sua frente, assim como decorava a camisa de flanela.
— Polícia! – Gritou, já indo atrás do homem. – Mão na cabeça, jaguara!
Ele reconheceu o casaco. Era o mesmo utilizado no dia do crime. O mesmo demonstrado e circulado em seu quadro de investigação. O mesmo homem cuja imagem fora recuperada pela tão eficiente equipe, cujas faces jamais vira pessoalmente, mas ao qual seu ódio crescente se depositava.
O homem caminhava rápido, aumentando a distância que os separava. Com a gritaria, olhos curiosos surgiram no posto de combustíveis que ficava do outro lado da rua. O cansaço mesclado ao sono dificultou o caminhar do policial, aumentando sua irritação. Claudio precisava dividir a força em três: Manter-se acordado, correr atrás daquele homem e segurar a pistola.
— Tchê! Eu disse pra tu botar as mãos na cabeça, Adilson! – Gritou.
O homem não diminuiu o passo. A irritação de Claudio cresceu. A pistola cuspiu fogo em advertência.
Adilson parecia não ter ouvido o disparo, assim como os olhos curiosos no posto. Por um breve momento, Claudio encarou a própria arma, buscando por um silenciador que nunca tivera. Tentou afirmar para si mesmo que ouvira aquele tiro e que todos a sua volta deveriam estar malucos, mas não tinha certeza se realmente o ouvira.
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HorrorOBRA VENCEDORA DO WATTYS 2019 - CATEGORIA TERROR PARANORMAL Depois que uma terrível tempestade isolou a cidade de Caçapava do Sul, a população foi acometida por uma intensa insônia, enquanto a polícia investigava uma série de estranhos assassinatos...