Tremor

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A primeira vez que notei algo de estranho na minha família, eu tinha cinco anos, acredito que Dylan demorou um pouco mais para notar. Ainda muito pequeno acreditei que as brigas dentro da minha casa eram normais, que todos os papais e mamães no mundo tinham uma rotina igual a da nossa família.

Minha mãe, Lavínia Hunter, possuía longos cabelos brilhosos, olhos grandes e expressivos e era uma mulher muito doce, o que muitos dizem hoje ser uma pessoa romântica.

Ela vivia lendo seus romances, sempre com um livro por perto e um olhar sonhador no rosto. Ela normalmente estava sorrindo para seus filhos, mesmo depois que meu pai batia nela.

Enquanto crescia, perdi a conta de quantas vezes a vi sentada em frente a sua penteadeira cobrindo com a ajuda de maquiagem o pior do seus hematomas.

Quando era muito ruim, ela ficava alguns dias de cama, com meu pai nos mantendo afastados e tínhamos muita comida congelada.

Uma vez, no dia em que entendi que tudo estava errado, Dylan e eu estávamos na casa de um colega de creche, comemorando um aniversário, havia muitas crianças espalhadas e todas gritavam e corriam, eufóricas pelo excesso de açúcar.

Os pais do aniversariante se tratavam de um modo estranho aos meus olhos. Mesmo não entendendo muito bem sobre as designações, eu sabia que eles eram um casal Alfa e Ômega, igual aos meus pais.

Mas, o cheiro deles eram engraçado, combinavam de uma maneira que nunca tinha sentido antes, e seus gestos eram quase uma dança, o Alpha adorava o seu ômega e fazia questão de todos soubessem, parecia que eles se comunicavam por pensamentos de tão sincronizados que eles estavam.

O tempo todo em que os observei, eles se tocavam, acarinhavam e sorriam para o outro com olhos cheios de sentimentos.

Mesmo achando nojento, afinal eu tinha cinco anos, era inegável o carinho que ambos sentiam. O Alfa beijava o pescoço de sua esposa Ômega, às vezes cheirava seus pulsos, e a acariciava de modo reverente.

Antes desse aniversário, nunca tinha parado para notar a interação de outros casais, meu ponto de referência era unicamente os meus pais. Então, ao chegar em casa, Dylan estava praticamente rolando no chão em agitação por ter comido muitos doces, enquanto eu fui refletir sobre o meu papai.

Meu pai, também um Alfa, trabalhava para a agência de polícia e estava sempre ocupado.

Mas, quando estava em casa, ele nunca tratava minha mãe do modo que aquele outro Alfa fazia com sua esposa.

A dinâmica deles era completamente diferente, nunca houve beijos no pescoço, cheiro nos pulsos, ou carinhos cuidadosos.

Quando meu pai chegava do trabalho, minha mãe tinha que estar com o jantar pronto, a casa em ordem e todos devidamente de banho tomado, não havia jogos ou brincadeiras, ninguém podia ficar em cima dele, e ele sempre tinha o controle do que assistimos na televisão.

Eu nunca o vi tendo nenhum gesto doce para ela. Mas, havia críticas, demandas e regras que não podiam ser nevadas.

Qualquer pedido dele tinha que ser rapidamente atendido por ela.

Qualquer coisa fora do lugar, uma resposta espertinha, ou apenas porque ele não tinha tido um bom dia no trabalho, era seguido por agressão verbal e física.

Ele sempre teve que vir em primeiro lugar.

Então, as agressões, o choro é o constante cheiro de medo dos feromonios da minha mãe, passaram a ser inaceitáveis para mim.

DevastaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora