Uma diaba reconhece a outra pelo cheiro.

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Nove horas e ela ainda não aparecia. Depois de andar nervosamente de um lado para outro, Sayaka decidiu se transformar e ia sair para procurá-la quando ouviu alguém tentando meter a chave na porta com dificuldade. Correu para abri-la e Kyoko lhe caiu nos braços, toda ensanguentada, queimada como por ácido nos braços e rosto, um olho fechado e o braço esquerdo totalmente flácido. Fraturado. A Joia da Alma oval no seu peito estava bem escura.

– Kyoko, que aconteceu?

– Uma Aparição... Uma Satori, das grandes! Mas venci! – Engrolou, levantando os dedos em V e dando um sorriso de dentes faltando.

Sayaka fechou a porta com um chute, ergueu Kyoko nos braços e a deitou cuidadosamente no chão. Ajoelhada, estendeu as mãos sobre ela. Kyoko suspirou e deu um gemido sentido.

– Ainda está com dor? – Perguntou Sayaka, aflita, com lágrimas nos olhos.

– Não, pelo contrário... Seu poder é uma delícia! Dá vontade de chegar estropiada todo dia só para você me curar, Sayaka-chan... – Sorriu a jovem de vermelho, de novo com todos os dentes no lugar.

– Safada! Piveta! Quantas vezes tenho de dizer para não enfrentar essas coisas sozinha? Me chama que eu largo o que estiver fazendo! E chama todo mundo, se puder! – Reclamou Sayaka

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– Safada! Piveta! Quantas vezes tenho de dizer para não enfrentar essas coisas sozinha? Me chama que eu largo o que estiver fazendo! E chama todo mundo, se puder! – Reclamou Sayaka.

– Desculpa, não foi de propósito. – Sentou-se Kyoko. – Eu estava fazendo uma ronda na zona quando vi uma Aparição comum que eu tinha a moral de apagar sozinha. Dei o bote e ela amarelou. Corri atrás dela num prédio abandonado e dei com a grandona. Fiquei bolada, mas não dava tempo de chamar ninguém... O importante é que ganhei! – Meteu a mão dentro da roupa e sacou dois cubos. – Toma! Você gastou muita magia em mim!

Sayaka olhou para sua Joia em meia-lua, presa no umbigo. Estava embaçada, mas não como a de Kyoko.

– Limpa tua Joia primeiro, cretina, senão não fico tranquila. Se sobrar, eu uso o resto.

Usaram, tinha o suficiente para as duas. Aliviada, Sayaka pôs no som um concerto de Kyosuke para acalmar os nervos e foi esquentar o guioza que tinha preparado enquanto Kyoko, recuperada, limpava o chão ensanguentado. Kyubey apareceu para recolher os cubos usados, mas saiu sem dizer nada.

A porção daria para quatro pessoas e Sayaka ainda estava bem satisfeita com o almoço generoso, mas Kyoko tinha apetite para devorar quase tudo. Sayaka gostou de ver. A desgraçada passava o dia empanturrando-se com porcarias, mas quando estava em casa, sabia apreciar seu esforço para lhe dar uma refeição de gente.

– Como foi seu dia, Sayaka-chan? – Perguntou ela, sem parar de mastigar.

– Tranquilo até há pouco... Terminei o violino, saí para almoçar, encontrei a Hitomi e fomos a um restaurante juntas.

– Como está ela?

– Bem... Ou quase, como ela diz. O Kyosuke, sabe...

– Sei. Sorte sua que ele preferiu a Hitomi, minha pirulita querida.

– Verdade. – Sayaka sorriu.

– E sorte minha que a Madoka prefere a Homura, senão ia roubar você de mim. – Kyoko arreganhou os dentes.

– Por que isso agora? – Reclamou Sayaka, recuando assustada.

– Pensei no que aconteceu depois da batalha de ontem... Homura não fez nada de errado, mas quando ela e Madoka se beijaram você olhou para ela como se quisesse esganá-la. O que é isso, se não é ciúme?

– Não, Kyoko-chan, não é isso, é que... – Tapou a cara, embaraçada. Não pensou que as outras tivessem notado. – Não quero o lugar dela, mas acho que é uma companhia sombria demais para a Madoka. Ela é tão legal, tão boazinha, tão ingênua...

Kyoko riu de cuspir guioza pela mesa toda.

– Ela é uma graça, uma anja, tá, nisso estamos de acordo... – Disse ela, quando conseguiu parar de rir. – Mas ingênua? Sayaka-chan, ela foi a primeira de nós a contar a todos que é sapa e se orgulha disso quando a gente ainda queria fingir que éramos só amigas. Não sei o que se passa entre as duas na intimidade, mas está na cara que a Madoka adora. E tenho uma leve impressão de que na cama, a Homura é quente como o diabo. Como o inferno inteiro!

– Você também é uma diaba. – Sayaka fez um sinal de chifrinhos com a mão.

– Obrigada! Mas acredite em mim, uma diaba reconhece a outra pelo cheiro e para essa, eu bato continência como um sargento para seu general. – Fez o gesto. – Ou um Mefistófeles qualquer para o próprio Lúcifer.

– Tento gostar dela, mas ela me dá arrepios. – Torceu o nariz.

– Também me dá arrepios. Mas no bom sentido. – Sorriu Kyoko.

– Kyoko Sakura! – Protestou Sayaka, zangada. A outra riu e lhe deu um tapinha na mão.

– Não seja boba, Sayaka-chan, eu não trocaria minha moleca azul por nada. Mas eu teria de ser cega para não ver que a Homura é a mais lindona do pedaço e ainda por cima uma guerreira de pôr medo em mil demônios. Francamente, gosto de poder contar com ela ao nosso lado nos momentos de perigo e de poder trocar uma ideia quando está de bom humor. Nós duas passamos por muitas coisas que você não tem como entender... Felizmente para você.

– Como o quê?

– Termos formação cristã, ficarmos órfãs muito cedo, nos virarmos sozinhas quando meninas... E acho que algo ainda mais importante. Acho não, tenho certeza de que ela também sobreviveu a algum trauma atroz. Talvez pior que o meu, porque ela é forte pra caralho, mas se recusa a falar disso. Tomara que algum dia ela consiga se abrir. Se não conosco, pelo menos com a Madoka. Simpatizo com ela, confesso, mas é só isso, pode ficar sossegada.

Sayaka aquietou-se e comoveu-se ao lembrar de tudo que Kyoko havia passado

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Sayaka aquietou-se e comoveu-se ao lembrar de tudo que Kyoko havia passado. Ser acusada de bruxaria pelo próprio pai pastor, depois vê-lo matar a mãe e a irmãzinha, incendiar a igreja e a casa onde ela havia crescido e suicidar-se... Ela, filha de uma família de classe média pacata e compreensiva, ela que pensara ter conhecido o desespero quando Kyosuke começou a namorar com Hitomi ou quando Kyoko fugiu de casa, não conseguia nem imaginar.

– Você ainda quer ir à balada? – Perguntou Sayaka, enquanto Kyoko recolhia a louça e prometia lavá-la de manhã.

– O que você acha? – Retrucou a gata de vermelho com aquele sorriso malicioso que lhe dava arrepios. No melhor sentido.

– Acho que você precisa tomar banho primeiro. Está fedendo. – Tapou o nariz e fez careta.

– Vem comigo. – Pediu a outra, estendendo a mão.

– Vou. – Levantou-se.

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