Gravity

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{Parte narrada por San}

2010

— Você não pode brincar com a gente, você é esquisito. — as outras crianças do orfanato repetiam as mesmas palavras todas as vezes que eu tentava brincar com elas, nunca me deixavam sentar junto à elas durante as refeições, tampouco brincar com as mesmas.

Nos primeiros dias de quando cheguei ao orfanato Treasure, foram os mais terríveis. No dormitório masculino, os meninos inventavam que viam coisas se moverem sozinhas durante a noite, e que acabavam sempre flutuando em volta da minha cama quando eu tinha pesadelos. Isso é uma tremenda mentira, pois sei que foram eles que bagunçaram o quarto inteiro só para pôr a culpa em mim. Eu apenas nunca tive como provar, ninguém nunca acredita em mim, nunquinha mesmo.

— Eu já disse, não queremos você aqui, seu anormal. — uma menina um pouco mais velha do que eu falava entre as outras crianças. Isso me fez desistir de tentar me aproximar de todos aqueles estúpidos, são todos um tremendo caso perdido.

Decidi explorar o orfanato, como eu sempre costumava fazer, gostava de procurar por tesouros escondidos nos cantos da casa – tesouros que iam de balas esquecidas até moedas perdidas –. Passei pela porta da cozinha, como quem não queria nada, e vi alguns homens tentando consertar o gás do fogão. Eu obviamente não entendia nada sobre isso, mas me parecia perigoso, já que ouvi um deles falando que se vazar mais, pode causar um incêndio. O senhor Se-ju – cozinheiro do Treasure – me parecia muito bravo por causa do vazamento de gás, ele nunca foi muito com a minha cara, na verdade, ele nunca foi com a cara de ninguém.

Apenas ignorei os adultos e voltei a percorrer o lugar, subindo as escadas para o segundo andar. Havia somente um lugar do casarão na qual eu ainda não havia explorado, até mesmo já entrei no quarto de funcionários, infelizmente fui pego pelo senhor Se-ju, e levei a maior bronca da minha vida naquele dia.

Lá estava a porta vermelha, a porta da sala da diretoria, nunca tive coragem de entrar lá, a senhora Kim era um tremendo carrasco. O que tinha naquela sala era um tremendo mistério, ninguém além dela podia entrar. Nós – incluindo os funcionários, imagino eu – fomos ensinados a manter distância do corredor da porta vermelha. Mas hoje era uma exceção, pois em uma das minhas grandes e bem-sucedidas explorações, acabei encontrando uma chave embaixo da minha cama, assim como todas as coisas que os outros meninos costumam jogar ao redor da mesma e dizer que fui eu quem pegou todas aquelas coisas. Testei a chave em todas as portas, mas não tive sucesso, apenas me sobrou aquela porta, e eu estava otimista.

Olhei para todos os lados, na certeza de que não haveria ninguém me vendo, então meti a chave na fechadura antiga, e para a minha surpresa, ao girar o pequeno objeto de metal, ela se abriu.

Era uma sala completamente normal, nada indiferente, exceto por um retrato da senhora Kim que parecia me observar por onde quer que eu fosse. Essa mulher me causava calafrios.

Meus olhos percorriam por tudo naquele lugar, livros chatos e tediosos que só gente grande lia, papéis que eu não conseguia decifrar do que se tratavam, pois apenas gente grande envia aquilo uns para os outros, da janela vi um telhado íngreme na qual eu poderia facilmente escorregar e fugir dali, mas eu não era tolo de fazer isso, não agora. E por fim, fotos de adultos que eu não sabia quem eram. Continuei passando as fotos até ver um rosto familiar: o meu pai.

Segurei a foto fortemente contra meu peito, já sentindo as lágrimas chegando, e um sentimento de vazio preencheu meu coração. De repente, ouvi um estrondo alto vindo do primeiro andar, dei alguns passos para trás por causa do susto, me escorando na parede atrás de mim, entretanto, me vi caindo para trás, quando a mesma cedeu. Levantei-me rapidamente, sacudindo o pó da minha roupa, olhei para o rombo e notei que se tratava de uma parede falsa, muito mais fina do que uma parede de concreto normal.

O garoto do trem - Woosan Onde histórias criam vida. Descubra agora