Capítulo 8

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Minha viagem foi muito tranquila. Meu advogado me mostrou que tudo caminhava perfeitamente bem. Ele conseguiu reunir todos os administradores para que sentássemos juntos e víssemos o crescimento de todas as fazendas. A cada 15 dias, ele, pessoalmente, visitava uma região, ficando a par de todos os negócios; a única fazenda que não seria preciso visitar era a Marcas D'água. Nesta havia decidido retornar e me estabelecer.

De Belo Horizonte fui a São Paulo ver meu pai e Jorgina, estavam todos bem. Jorgina me acompanhou nas compras e colocava defeito em todas as peças que escolhia. O motivo era pedir para fazer roupas que, a seu ver, não eram apropriadas para uma mulher; nas explicações dela, os modelos eram masculinos e não concordava com tanto modernismo. A seus olhos, não era por que algumas mulheres começaram a usar calças que daria a mim o direito de fazer o mesmo. Tive de mandar fazer na costureira as peças que comprei. Como precisava retornar logo, elas se desdobraram para terminar as roupas em dez dias, tempo que fiquei em São Paulo. Aliás, em todo esse período em que fiquei na cidade, não tive notícias do Sr. Gusmão, mas Tomaz... esse resolveu me fazer uma surpresa.

Havia acabado de abrir a grade de acesso à rua, diante dela me detive despreocupada, conferindo se carregava dinheiro suficiente. Inesperadamente uma voz me assustou.

— Kaila, não sabe como eu precisava te ver. Assim que soube vim correndo. Quero me confessar, você precisa me ouvir!

— Não sou madre, muito menos inclinada às boas ações, por isso afirmo que veio ao lugar errado. Tomaz, eu custo a acreditar que você teve a ousadia de aparecer na casa de meus pais. — Saí a passos firmes, irritada com aquela presença. Ele com palavras suaves me seguiu, abarrotado de explicações.

— Não vê que também fui um brinquedo nas mãos da sua irmã? Ela me deixou assim que você se casou. Acha que eu não amava aquela mulher? Kaila, acredite, tudo o que fiz foi por amor. Não pode imaginar o quanto me arrependo.

Parei e lentamente me voltei a ele que mantinha as mãos juntas, como um pedido de suplica. Quem via sua face diria certamente que era digno de pena, mas as dores que ele provocou me impediam de ter qualquer ato de piedade ou misericórdia.

— Sabe o que mais me corrói, sempre te amei como um irmão que não tive. Cuidei de você com carinho e respeito. Não posso negar que você me ajudou e foi alguém muito importante, mas se eu pudesse hoje escolher, escolheria nunca ter te conhecido. Não sabe o quanto me magoou, Tomaz. E a propósito, lamento por não ter ficado com Claudete, vocês seriam o par perfeito.

— Me dê outra chance, me leve com você para Encosta, não quero ficar neste lugar.

Inevitavelmente, comecei a rir daquela proposta absurda.

— Você não existe, Tomaz. — Olhei do outro lado da rua e para minha completa infelicidade Claudete se aproximava. — Veja só, sua amada veio visitar o meu pai. Que inferno! Só me faltava essa!

Ao lado dele aguardei desanimada, com os braços cruzados, ela se aproximar. De rosto empinado, sorriu. Só então pude ter a certeza: Tomaz amava aquela mulher verdadeiramente. Cheia de arrogância, ela destilou do seu veneno.

— Que fofo, ambos matando a saudade dos tempos passados?

Tomaz abaixou os olhos e envergonhado a cumprimentou, como um cãozinho dócil.

— Como tem passado os dias, Claudete?

— Muito bem, Tomaz! Quer dizer, agora não tão bem. Não sabia que havia voltado, maninha. Então pretende ficar mesmo em São Paulo? Não deu certo sua trama em Encosta?

— Na verdade, não vim para ficar, mas para resolver algumas questões, posso lhe garantir que nenhuma diz respeito a você, ou a esse energúmeno. E quer saber de uma coisa? Eu não tenho que lhe dar satisfações da minha vida. Aproveitem e conversem um pouco, vou deixá-los a sós.

Letargia O DespertarWhere stories live. Discover now