Capítulo 31

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Na mesma semana, nos casamos. Rodolfo era muito influente e conseguiu resolver todas as burocracias necessárias sem que a notícia se espalhasse. O casamento foi muito simples, apenas uma testemunha próxima: Deusdite. Não queríamos que ninguém da sociedade ficasse comentando o fato, o motivo era a gravidez. Ninguém poderia saber o dia exato de nosso casamento, contrariando os planos de Tomaz, que desejava anunciar aos quatro ventos nossa união.

Saímos em silêncio para o casamento e assim voltamos. Ao entrarmos, observaram quando retirei a luva. A aliança em minha mão era como um bilhete escrito em alto relevo com luzes fulgentes: eles se casaram. Para encerrar de vez qualquer comentário, Rodolfo pediu uma reunião e comunicou a todos o casamento. A reunião terminou rapidamente e após ela, ninguém se atreveu a tocar no assunto. Deusdite saiu sorrindo, contando a outra cozinheira que precisava terminar de torrar o café.

Naquele sábado, tive uma grande surpresa, recebemos a visita inesperada de Humberto e sua esposa, que ficariam conosco por uma semana, uma longa semana. Bela veio compartilhar de sua gravidez; Humberto não entendeu meu casamento repentino e, sempre que cruzamos o caminho, ele me olhava com aqueles olhos confusos, estranhamente o meu medo por ele, aos poucos foi se abrandando, sem que pudesse explicar, agora eu o via com ternura. Durante cinco dias, convivemos pacificamente, e ele se portou como um amigo. A cada pôr do sol, minha alma se convencia de que ele jamais tentaria novamente contra minha vida.

Era quinta-feira, um dia bastante agradável para caminhar, por isso, decidi dar um passeio. Notei quando Humberto correu para me alcançar; ele segurou o meu braço e me disse que precisávamos nos falar. Fui bem sincera nas palavras.

— Não estou num dia bom, me perdoe. Acho que vou caminhar um pouco, pensar em algumas coisas.

— Talvez na sua decisão de se casar...! Me perdoe, mas... que loucura foi essa, Kaila? Não imaginei que aceitaria se casar com esse homem, ele pode ser seu avô! O que te levou a tomar uma decisão tão absurda?

— Tomaz, por favor! — Ele veio correndo, e Humberto imediatamente me soltou, Tomaz, ao se aproximar sorrindo, não percebeu o que acontecia entre nós e foi logo perguntando.

— Pois não, precisa de algo?

— Humberto gostaria de caminhar e está sem companhia. Como prefiro caminhar sozinha, aconselho os dois a fazerem esse maravilhoso passeio juntos. Queiram me desculpar cavalheiros. Com licença, Humberto!

Ambos saíram em outra direção, meus olhos se prenderão no céu azul. Dava meus passos lentamente, admirando a copa das árvores que pareciam me seduzir. Fui até o curral, onde ficavam os bezerros, me sentei numa porteira e ali fiquei até quase escurecer. Em minha cabeça havia um turbilhão de pensamentos, eram como um redemoinho cercado por medos e incertezas. Sentia-me esgotada. Tinha de dar atenção a todos, servir e ser uma boa anfitriã, isso é exaustivo muitas vezes. Com tantos problemas, quem consegue sorrir a todo tempo?

Não era mais a funcionária de Rodolfo, tinha de cuidar da recepção e estávamos com quatro hóspedes na fazenda. A mãe de Bela nunca deixava de viajar com ela, mas também era como um fantasma, sempre no quarto, trancada, as vezes uma sombra. Já Bela ficava a maioria do tempo correndo atrás de Humberto, implorando por seus carinhos. Para ser bem franca, começara em mim a suscitar raiva de Bela por ser tão doce.

Após ter uma ótima tarde em silêncio, voltando pela estrada de chão, defini uma meta: chegar à fazenda chutando uma mesma pedra por todo o caminho, escolhida em especial para ser minha companhia. Isto é para quem está muito ocupado, pensei sorrindo. A cada chute em que ela seguia reta pela estrada, ria de mim mesma. Comecei a brincar como há muito tempo não fazia.

Perdida nessa distração, notei um barulho que cada vez ficava mais alto, as rodas de ferro escapulindo por entre algumas pedras denunciava a aproximação de uma charrete. Ao longe, voltei o meu rosto me certificando, ela seguia na mesma direção que a minha, sem me distrair, continuei sem dar importância. Rapidamente deduzi que talvez fosse algum empregado da fazenda. Não demorou um minuto para que toda a tarde de calmaria se transformasse em pura inquietação.

Letargia O DespertarWhere stories live. Discover now