Capítulo 16

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Não sei que horas eram quando comecei a despertar, meus olhos estranharam a claridade. Olhei ao redor, havia uma janela aberta, o vento entrava suavemente e movia a cortina trazendo paz ao ambiente, não conseguia me lembrar de detalhes. Minhas mãos foram enroladas com panos e também meus pés. À minha volta não havia ninguém. Na boca um gosto estranho de amargor. Uma mulher entrou em meu quarto e, me vendo de olhos abertos, correu gritando o nome do meu pai. Sentia-me entontecida, desnorteada, mesmo assim um pensamento me ocorreu:

— Meu pai veio de São Paulo? Há quanto tempo estou aqui?

Fiquei ali tentando encontrar o ferimento da bala, jurava que havia sido perto do coração. Vi minhas mãos enfaixadas, estavam muito doloridas; por causa disso, imaginei que talvez o tiro pudesse ter sido nas mãos. O nervosismo me fez delirar. Meu corpo todo doía, cada um dos meus músculos parecia ter se movimentado incessantemente.

Desesperei-me, tentando imaginar como havia conseguido sobreviver. De um segundo a outro, uma esperança me invadiu o coração fortemente e apenas afirmei: ele também está vivo! Comecei a querer me levantar. Tentava me mexer, chamando por Eduardo. Um sorriso surgiu em meu rosto e com lágrimas nos olhos gritei o seu nome. E assim como brota no meio das pedras ou surge entre espinhos uma pequena folha verde, a esperança me fazia chorar de alegria. Sabia que se eu estava viva, ele também estaria; chorava com ansiedade, sem me atentar a coerência dos fatos, esperando ouvir sua voz, dizendo que tudo terminou bem.

Meu pai entrou no quarto e foi aí que pulei em cima da cama, as lágrimas terminaram seu percurso e enxuguei o meu rosto, assustada, olhando em silêncio fixamente para ele. Meu pai ficou muito preocupado com a minha reação. Eu me via impactada com o que os meus olhos presenciavam. Pensei comigo mesma: só posso estar morta! Meu Senhor, o que está acontecendo? Não posso estar vendo o que estou vendo! Mas estou vendo!

— Quem é o senhor? Pai! O senhor está novo! Mas, como? Não pode estar assim, o que está acontecendo? — Enquanto eu falava, Humberto entrou no quarto.

— Graças a Deus você está viva, pensei que não iria sobreviver. — Humberto tinha novamente seus 26 anos, não poderia crer no que meus olhos me mostravam. Será que estou morta e a morte é assim? Reencontrar todos jovens? Assassinos perdoados se fazendo de bonzinhos?

Olhei para Dr. Otávio, que não entendia a razão de tê-lo chamado de pai, e perguntei:

— Que lugar é esse? — Se ali fosse o inferno, não me parecia tão mal.

Ele, por sua vez, perguntou a Humberto se por acaso eu não havia batido a cabeça, a resposta foi negativa e ambos se olhavam confusos, não tanto quanto eu.

— Kaila, você entrou numa cachoeira de águas muito frias, você se lembra disso? — Os dedos dele atrevidamente sustentaram minhas pálpebras abertas, enquanto de perto, examinava meu globo ocular.

— Sim, me lembro. Isso foi em meados de 1912... acho que foi nesse ano, talvez agosto? Digamos que mais ou menos nesse período. Por quê?

Ele sorriu, um sorriso gostoso, confiante e terno.

— Querida, estamos em 1912. Essas bandagens são parte do seu tratamento, você desmaiou e somente agora despertou.

— Não! Isso é alguma brincadeira? Tá... O senhor quer me dizer que voltei e estamos em 1912...?

— Não, meu bem, você não voltou, mas recobrou os sentidos. Você desmaiou e só agora acordou. Chegamos a ficar preocupados!

— Onde está o Eduardo? — Um desespero tomou conta de mim, lágrimas começaram a correr novamente e todos ali não conseguiam compreender a minha reação.

Letargia O DespertarWhere stories live. Discover now